BASEADO NO ZEZINHO.

Sucupira é meu cantinho

Lá nasci e me criei

Tomando leite de cabra

Foi com que me sustentei

Em uma casa escondida

Feita de terra batida

Por onde engatiei.

Era um lugar pequeno

Humilde e engraçado

Na praça só tinha um santo

Feito de barro amassado

A rua era toda lisa

Parecia uma camisa

Com casa só de um lado.

O nome de Sucupira

É marca muito distante

Há muito tempo existiu

Uma sucupira gigante

Que na beira do caminho

Dava pouso ao passarinho

E sombra ao viajante.

Lugar cheio de paz

O passado não mancho

Lá o sossêgo habitava

No seio de cada rancho

Onde o feliz passarinho

Costurava o seu ninho

Com agulha de garrancho.

Dona Tonha minha avó

Teve um tino arretado

Debulhou feijão de corda

E preparou um guisado

Vendo aquele alvoroço

Começou vender almoço

Ao viajante cançado.

Tendo almoço e sombra

E lugar pra descançar

Os caxeiros viajantes

Começaram a reparar

Que alem da regalia

Ali também existia

Cabocla pra namorar.

E namoraram a vontade

Judite com seu Galdinho

O turco com Marinez

Cuxichavam bem baixinho

E de namoro em namoro

Sucupira foi nascedouro

De uns viajantizinho.

Eu também sou dessa safra

Sou passarinho desse ninho

Meu pai também foi caxeiro

De cetim perfume e linho

Pó de arroz e rapé

Sendo meu pai José

Eu fiquei como Zezinho.

Depois meu pai foi embora

Minha mãe me acolheu

A minha avó viveu tanto

Que enjou e morreu

E eu ainda bem moço

Tomei conta do almoço

Quer dona Tonha me deu.

Daí pra frente eu fiquei

Em Sucupira falado

"O neto de dona Tonha

A que viveu no passado

Mas agora no presente

Zezinho é quem vende a gente

Feijão de corda e guisado"

Um dia apareceu

Uns moço todo mudado

Com os cabelos colorido

Com uns brinco pendurado

Olhando assim parecia

Que aquele povo surgia

De um lugar assombrado

Tomei fôlego ajeitei

O meu chapeu pra um lado

E me chegei de mansinho

Que só cachorro acuado

Numa moita de mastruz

tracei o sinal da cruz

E falei calmo e rosado.

Bom dia senhores todos

Zezinho o seu criado

Podem ficar a vontade

Eu só não vendo fiado

O que tenho pra servir

é um almoço "daqui"

Feijão de corda e guisado!

Um da fala esquisita

Disse: aí meu irmão

O lance é o seguinte

Nós vamo ficar doidão

Depois da cabeça feita

Todo feijão nós aceita

De corda barbante ou cordão.

Oxe: que mal lhe pergunte

Eu não tenho artificio

Não tenho mel nas palavras

Como político em comicio

Mais se vão ficar doidão

Trouxeram a medicação

Quando fugiram do hospicio?

Eu dissi: esse menino

Por certo não é normal

Não fala coisa com coisa

Só lance, bicho e legal

Eu só falo: vote visse e oxente

Se ele se meter a gente

Eu quebro tudo no pau.

"Deixa pra lá Zezinho

Vem fumar com a gente

Curtir o que a gente curte

Sentir o que a gente sente

Abre o olho e acorda

Que o teu feijão de corda

Vai ser feijão de corrente.

Se é assim eu relevo

Não rejeito amizade

Sou da paz vou aceitar

Fumar com voces mais tarde

Vamos ver qual se destaca

Se o fumo de Arapiraca

Ou se esse da cidade.

Depois da lida do dia

Fui cumprir o prometido

Parecendo um papagaio

Falante e atrevido

Fiz estilo de valente

"Vim aqui pessoalmente

Pitar aí no moido"

Depois que fumei o tal

Entrei nas brenhas do nada

Fiquei Zezinho, zonzinho

Com a buchecha enchada

Escutando o zunido

Cá dentro do meu ouvido

Uma cigarra safada.

As orelhas pegou fôgo

Os olhos tudo trocado

E o motor do juizo

ficou foi desmantelado

O pé, o braço e a mão

Não senti, pensei então

Dessa vez eu tô lascado!

Os moço pegarm a rir

Fazendo a maior zoada

"Zezinho tu acha ruim?"

Pergunta besta danada

Eu tô é numa boa

Vocês é que tão a toa

Com uma besterinha de nada.

Eu não tava numa boa

Tava solto do cacho

Me engasguei com fumaça

Virei raspa de tacho

Deu um verão na goela

Seca que só tigela

Com a boca para baixo.

O eixo do pensar

Partiu ficou quebrado

Sem rumo sem direção

Eu tava anestesiado

Girando feito roleta

No cassino do capeta

Que outro cabra safado.

Vi uma aranha tecendo

A porta da casa dela

Passei mais de meia hora

Parado de sentinela

Quando ela findou gritei

Pedi bis assoviei

E bati palmas pra ela.

Cheguei em casa com fome

Dessas fora do comum

Quase que eu comi

Um saco de jerimum

Mãe disse num desengano

Parece que faz um ano

Que Zezinho tá em jejum!

Ôh cigarrinho venenoso

Que no meu quengo resiste

Foi guando vi na gaiola

O meu curió tão triste

Libertei do cativeiro

Ele voou ligeiro

E eu comi o alpiste.

Manezinho meu primo

Vendedor de carvão

Me olhou desconfiado

Eu disse:qual é meu irmão

"De Zezinho não me aproximo

Irmão não,eu sou teu primo

Tu tá doido ou com o cão?"

Mãe fez um chá de cidreira

Me deu café e garapa

Tomei caldo de feijão

Comi um prato de papa

O loro disse ao gato

Vamos correr para o mato

Se não nós dois não escapa.

Aí caí na gaitada

Ria sem ver de quê

E no botão da risada

Eu apertei pra valer

Ri que só a bixiga

De dá uma dor na barriga

Eu vi a hora morrer.

Mãe me deu uma cuia

Com uma água bem clara

Lavei as minhas mãos

Banhei a minha cara

Daí pra frente não sei

Só lembro que acordei

Na minha cama de vara.

Bati com o indicador

Com força na negra capa

"Em Sucupira não entra

Nem com a ordem do papa

Cabeludos de lambreta

Com cigarro do capeta

Se entrar morre na tapa.

Prefiro o caldo que tem

No bago doce da jaca

Do gosto da aguardente

Que trava e dá resaca

De escutar uma moda

Sou mais o feijão de corda

E o fumo de Arapiraca.

Ebenézer Lopes
Enviado por Ebenézer Lopes em 07/03/2015
Reeditado em 07/03/2015
Código do texto: T5160945
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