"JOÃO CARVOEIRO".
(Cordel).



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Numa certa ocasião
naquele sertão de Minas,
lá existia um casal
que vivia nas ruínas
de uma mina abandonada
com um menino e uma menina.

Eram dois filhos que tinham
ele nove ela dez anos,
pensando em melhoria
eles viviam sonhando
mas nunca viam melhora
só viam o passar dos anos.

O casal era alcoólatra
não viviam sem uma pinga,
não compravam na garrafa
guardavam numa moringa
ele já falava grego
ela parecia uma gringa.

Trabalhavam pra viver
numa mina de carvão,
o nome dela era Alice
o nome dele era João
trabalhavam pra si próprios
ele mesmo era o patrão.

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Batia tanto no filho
que era um saco de pancadas,
o mesmo com a sua filha
que só vivia marcada
já tinha as costas riscadas
das marcas das cipoadas.

Tinham um jumento velho
que já vivia cansado,
de tanto levar carvão
pra vender no povoado
o coitado do jumento
sofria igual condenado.

O coitado do menino
cansado de apanhar,
resolveu fugir do pai
pensando nunca voltar
sem destino e sem dinheiro
resolveu se aventurar.

Sua irmã ficou sozinha
com a mãe e o pai malvado,
não queria nem pensar
pois já estava cansado
de apanhar todo dia
e ter o pão alegrado.


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Pegou uma maletinha
que ele mesmo a fez,
colocou um cobertor
pintadinho de xadrez
que trocou com o mascate
por sua galinha pedrez.

Botou o pé na estrada
antes de o galo cantar,
saiu sem fazer barulho
pro seu pai não acordar
se seu pai lhe alcançasse
com certeza ia apanhar.

Antes de amanhecer
chegou ao asfalto aflito,
olhou para um lado e outro
feito um cãozinho perdido
- O que será de mim agora...
Se ele me pega, tou frito!

Foi passando um carreteiro
viu o garoto parou,
perguntou pra onde ia
o garoto então falou.
- Moço por favor, me leva
pra casa do meu avô.




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O moço então perguntou
pra onde ele estava indo,
se os pais dele sabiam
ou se ele estava fugindo
mas ouviu sua resposta
e acreditou no menino.

- O lugar que me falou
não é difícil de chegar,
no mais tardar meio-dia
nós já estaremos por lá
tem muito chão pela frente
pra chegar neste lugar.

Por volta das onze horas
avistaram um milharal,
numa fazenda bonita
que tinha gado e curral
e bem mais na frente tinha
um lindo canavial.

O menino astuciou...
Que era aquele o momento,
se embrenhar no milharal
e esconder-se ali dentro
ali não passava fome
pois tinha muito alimento.




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O garoto astucioso
calculou o que dizer,
falou para o motorista
é ali que eu vou descer
se parar no acostamento
eu agradeço a você.

Despediu-se com um aceno
pulou do carro no chão,
segurando a maleta
que levava em sua mão
deu uma volta ligeiro
por detrás do caminhão.

Atravessou então a pista
e seguiu estrada afora,
conferiu se o motorista
já tinha ido embora
bradou de braços erguidos
- Eu estou livre agora!

Se escondeu no milharal
até cair a noitinha,
quando entrou numa das casas
pela porta da cozinha
pra então pegar comida
que numa panela tinha.




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Quando já ia saindo
pelo braço foi puxado,
quase que deu um desmaio
levando um susto danado
olhou então para o homem
que o havia puxado.

Um olhava para o outro
um tanto desconfiados,
o homem disse ao menino
pode ficar sossegado
não lhe farei nem um mau
não sou um homem malvado.

Chamou a sua mulher
que sem demora chegou,
perguntou o que havia
o homem então explicou
sobre o garoto ladrão
que na cozinha entrou.

Conversaram com o garoto
que lhes deu explicação,
disse que queria comida
mas não era um ladrão
ficou morando com eles
e acabou a confusão.





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O casal não tinha filhos
resolveu ser os seus pais,
estava o garoto feliz
pois não ia sofrer mais
não precisava fugir
podia dormir em paz.

Os anos foram passando
aquele garoto levado,
deu lugar para um rapaz
que já muito acostumado
a trabalhar com lavoura
e tomar conta do gado.

Ás vezes quando dormia
notava que havia sonhado,
com sua querida irmã
que há muito estava afastado
mas agradecia aos céus
por estes pais ter achado.

Para tristeza do jovem
o pior aconteceu,
já puxado na idade
seu bom amigo morreu
mas lhe deixou como herança
metade do que era seu.




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Trabalhando com afinco
cuidando do que era seu,
sem que ele desejasse
a viúva faleceu...
Sendo ele o único herdeiro
tomou posse como seu.

Os anos foram passando
quis ver a irmã querida,
agora um homem rico
e bem postado na vida
foi ver a terra natal
pra curar sua ferida.

Ao embarcar no seu carro
as paisagens iam passando,
viu como estava mudado
com o passar de tantos anos
parou o carro na baixada
e subiu a ladeira andando.

Quão admirado ficou
quando viu abandonado,
o lugar onde brincou
até o rancho fechado
olhou o mourão do jegue
que ele ficava amarrado.




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Olhou para um lado e outro
sem ter a quem perguntar,
entrou na velha casinha
deu vontade de chorar
recordou velhos momentos
que não queria lembrar.

Saiu ligeiro da casa
com as malvadas lembranças,
de encontrar sua irmã
ainda tinha esperanças
quem vai à busca dos seus
mesmo longe não se cansa.

Ao chegar no povoado
tudo estava diferente,
lembrava de várias coisas
pois era inteligente
correu para o armazém
onde comprava aguardente.

Reconheceu logo o homem
que estava atrás do balcão,
disse que era o menino
que lhe vendia carvão
se lembrava da mocinha
disse que era o seu irmão.





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Não demorou logo o homem
lembrou de todo passado,
disse que fazia tempo
que os pais dele haviam mudado
moravam noutra cidade
que a irmã dele havia casado.

Ensinou-lhe mais ou menos
como pode lhe explicar,
saiu dali já sabendo
onde iria procurar
com certeza cedo ou tarde
ele a iria encontrar.

Encontrou a sua irmã
que apresentou o marido,
perguntou por sua mãe
que havia falecido
o mesmo com o seu pai
também já tinha morrido.

O seu cunhado era um homem
muito culto e educado,
conhecido na cidade
por ser um advogado
cujo pai era o juiz
que os havia casado.




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Passou uns dias com eles
e alguns dias mais tarde,
conheceu uma linda moça
a sua cara-metade,
tudo parecia um sonho
mas virou realidade.

= FIM =

Autor: Antonio Hugo.