Tribunal da consciencia.
Um cordão de bananeira
Ressequido pelo tempo
Amarrado em uma esteira
Abandonada ao relento
Reclamava da canseira
Vinda do esquecimento.
Dizia que trabalhou
Para dar descanso ao dono
Que dele só se lembrou
Para aproveitar o sono
Mas depois, quando acordou,
Queria subir no trono.
Era um fraco lavrador
Procurando algum trabalho
Por ser mau trabalhador
Pulava de galho em galho
Ia assim sofrendo a dor
De quem só procura atalho.
A palmeira derrubava
Para ter o que comer
Com a floresta ele acabava
Não mudava o proceder
Se a água escasseava
Ele fingia não ver.
Dizia que a natureza
Era rica e infindável
Que tinha tanta riqueza
Quase que imensurável
Mas lhe dera só pobreza
O fizera um miserável
O que deu foi muito pouco
Só fome e desilusão
Sempre chamado de louco
Ganhou só ingratidão
E lhe dando ouvido mouco
Aumentou a solidão.
A natureza é perversa
Dizia escondendo a mágoa
Deus é mito, uma conversa,
É aonde a fé deságua
Minha vida está imersa
Num oceano sem água.
O cordão então pensou
Porque fico a trabalhar?
O meu tempo já passou
Eu preciso descansar
Vou mostrar o que eu sou
Pro meu dono se lembrar.
Ele então arrebentou
Onde não havia nó
A esteira desmanchou
Não queria sentir dó
De tão seca que ficou
Começou a virar pó.
Quando a porta se abria
O vento um pouco soprava
A esteira então saía
Da forma que disfarçava
E assim compreendia
Quem da vida reclamava.
Foi até o fim do mundo
Onde o vento faz a curva
Procurou chegar ao fundo
Do rio de água turva
Encontrou um ser imundo
Que sempre evitou a chuva.
Dele ouviu que não existe
Um lugar noutro planeta
Para o homem que insiste
Em buscar com a luneta
Há lugar pra quem resiste
Em não dar o que prometa.
O cordão achou que vivo
Daria uma opinião
De alguém que é criativo
Não cai em contradição
Então ficaria ativo
Pra fazer indagação.
Perguntou por que o sol
Brilha além do horizonte
E por que é o farol
Que ilumina a todo instante
Tanto a dama de escol
E quem não é importante.
O imundo se calou
Começou raciocinar
Como nisso não pensou
Voltaria a estudar
Se alguém tudo criou
Antes teve de pensar.
Se pensou estava vivo
Porem não era ninguém
Antes estava inativo
Não fazia mal nem bem
Não tinha serviço ativo
Não tinha pra si também.
Entretanto se existia,
Quem criou o criador?
Isso não compreendia
Mas, porém, tinha valor
Se entender isso não ia
Era enlouquecedor.
Foi então que o cordão
Procurou esclarecer
Dizendo que a criação
Poderia ele entender
Pois havia uma razão
Para Deus tudo fazer.
Disse ainda que foi Deus
Que criou a humanidade
Dela fez os filhos seus
Em qualquer tempo ou idade
Entregou ao Galileu
Sua generosidade.
Depois disso aquele ser
Começou seguir adiante
Sua estrada pôde ver
Mesmo que um só instante
Pôde então comparecer
Ante o tribunal pensante.