PIRRITO - Folheto II: A Cantiga de Sebastião
Na nossa vida cotidiana
Sempre há vários acontecimentos
Uns fazem rir e outros chorar
Depende até do momento
Outros nos deixam gravados
Um profundo sentimento.
(Urbano de Souza Costa)
O casal agora segue
A sua vida em união
O amor que cativou
Sem nenhuma distinção
Inicia a caminhada
Lado a lado com a jornada
Segue a voz do coração...
- Foi 12 de fevereiro
Do ano de 42
Recebemos o sacramento
Comemoramos depois
Perante Deus eu jurei
E eu sempre a amarei
Para todo agora e depois.
Uma escolha tão melhor
Para mim não haveria
Que Deus pôs no meu caminho
Para me dar alegria
Ela é minha companheira
Uma esposa de primeira
Outra melhor não teria.
Josina cresceu sem mimos
Com muita dificuldade
Numa humilde família
Sempre com simplicidade
Uma dura situação
Porém com muita união
Tamanha fraternidade.
Ela perdeu o seu pai
Na festa de São João
Um triste acontecimento
Para ela e os cinco irmãos
Um boi brabo o acertou
E a vida lhe tirou
Enlutando a região.
Mas após o casamento
Nossa história começamos
Na zona rural de Glória
Lá na roça trabalhamos
Com um cercado no quintal
Vaca e cabra no curral
Com muita fé caminhamos.
E um dia nós recebemos
A graça de nosso amor
Pois fomos abençoados
Com a mão de nosso Senhor
Ele nos deu um herdeiro
E o batizei primeiro
Severino, com louvor.
E veio Sebastião
Em seguida Manoel
Este nasceu prematuro
E logo foi para o céu
Depois com Maria Helena
Minha menina pequena
Assim gira o carrossel.
São as minhas três crianças
Alegria de todo dia
Um empina papagaio
Outro corre a freguesia
Ela brinca de boneca
Todos brincam de peteca
Ao redor da moradia.
Chamo-os carinhosamente
Severino, de Seu Biu
Sebastião, de Baixinha
Dupla assim ninguém mais viu
E para minha pequena
Nós a chamamos de Lena
Completando nosso trio.
A maior benção da vida
Enfim pude começar
Que é construir uma família
E os filhos educar
Lado a lado com Josina
Pondo sempre a disciplina
E futuro conquistar.
A vida seguia seu rumo
No roçado eu trabalhava
E da casa e do terreiro
Josina quem comandava
Assim caminhava o dia
Tudo sempre com alegria
E a criançada estudava.
No ano de 51
Já com nove anos casado
Chegou como as outras vezes
Com tudo bem controlado
Oração do terço em maio
Feira sempre no balaio
Segue tudo de bom grado.
Mas entrou o mês de junho
Tudo ficou inseguro
Pois na primeira semana
Perdi um tesouro puro
Uma criança de três meses
E que eu rezei várias vezes
Não tinha mais um futuro.
Depois as festas vieram
Fogueira, fogo e folia
A vez das festas juninas
Com quadrilha e cantoria
Voltou a tranquilidade
Mesmo com muita saudade
Fé em Deus assim seguia.
Minha mãe, Maria Tereza
Conhecida Mariquinha
Começou a piorar
Da doença que já tinha
A melhora não se deu
Em dois de outubro morreu
Tão grande perca eu não tinha.
Pois perder a nossa mãe
É perder a alegria
É uma dor muito intensa
Só saudade e nostalgia
Das histórias que vivemos
Do carinho que tivemos
Naqueles saudosos dias.
Mas nove dias depois
Outro fato aconteceu
Minha cunhada doente
De repente faleceu
Ela teve uma piora
E no atravessar das horas
Seguiu caminho de Deus.
As pessoas comentavam
E ficavam assustadas
O que estava acontecendo
Em minha plena morada?
Diziam valha-me-Deus
Pois o brilho escureceu
E não dava certo nada.
Poucas semanas depois
Sebastião passou mal
Teve uma dor de barriga
Mas depois ficou normal
Com seu irmãos foi brincar
Porém mais tarde ao deitar
Teve uma dor anormal.
Ele muito vomitou
E ficou desidratado
De manhã cedo comprei
Um remédio no mercado
E o vômito parou
Ele logo se animou
Pois foi bom o resultado.
À tarde eu fui ao evento
Da pedra fundamental
De nossa nova paróquia
Em um lugar mais central
Mas recebi um recado
Logo corri preocupado
De volta pro meu quintal.
Mas quando cheguei em casa
Eu vi tudo consumado
Encontrei minha Josina
Com Severino do lado
Pois o meu filho querido
Dali já tinha partido
E fiquei desesperado.
Foi 1º de novembro
Que me vi sem emoção
Me atingiu diretamente
Sem dó do meu coração
Um pesar inesquecível
Uma tristeza tão sofrível
Foi perder Sebastião.
Então perdi o meu filho
Fiquei sem chão e certeza
O menino que sorria
Me deixou sem a firmeza
No outro dia nós o velamos
E à tarde o sepultamos
Foi muito grande a tristeza.
A CANTIGA DE SEBASTIÃO
À memória de meu filho
Morto a 1º de novembro de 1951
Eras a minha vida em alegria
O correr nas campinas em plantio
Que iluminava os dias do Goitá
Eras meu sorriso do amanhecer
E do findar dessa longa jornada.
Eras da tua mãe o pássaro
Em cantata nas mais altas palmeiras
A benção do Senhor cada domingo
Eras a felicidade da noite
Calada, fria e não tão mais estrelada.
Eras aos teus irmãos cor da alegria
Pelas tardes quentes hoje saudosas
Eras o orvalho de cada manhã
A chuva que cobria os milharais
Eras a premissa dos derradeiros.
Boa Vista, 12 de setembro de 2014