PIRRITO - Folheto I: O Mamulengo na Casa do Compadre
"Isso aconteceu em 1939
No dia 17 de dezembro
Foi um momento difícil e maravilhoso
Que ainda hoje eu lembro
Daquela madrugada
E aquele mamulengo"
Urbano de Souza Costa
O jovem sempre seguia
Pr’onde as ruas o levasse
Também não tinha um só dia
Que ele em seu passo deixasse
De dobrar aquela esquina
Como galo erguer a crina
E em Maria não fitasse.
Para surpresa de todos
Tanto fez que conseguiu
E por sua namorada
Ele então a assumiu
Já era a adolescência
Mas sempre com inocência
E respeito que se viu.
Pois era o primeiro amor
Que ele então a descobrira
Era uma menina linda
Tal como ele nunca vira
O calor da juventude
O presente em plenitude
Nas águas do Paquevira.
Logo segue a primavera
A lida num sopro passa
As flores surgem de novo
E a esquece sem graça
O recado tem perdido
Vira não correspondido
O brilho apagou na praça.
- Assim logo percebi
Como vem a luz do dia
Passa a noite e a lua cheia
Vão levando a alegria
Agi sem ter coração
Ficou a ingratidão
Ora não uma covardia.
Logo veio outro amor
Mais uma vez apaixonei
Por uma morena tão linda
Cabra vê e diz, gostei!
Era educada e sincera
Que nem em sonho tivera
À Odete me entreguei.
Era uma menina meiga
E com uma família boa
Com pai, mãe e seis irmãos
Que com ela o meu tempo voa
Minha escrita assim seguia
De felicidade eu ria
E a música ressoa.
Mas um dia eu recebi
A primeira negação
Eu juro que nunca vi
Uma tamanha maldição
Aos três meses de romance
Perdi o jogo num lance
E não teve apelação.
O que era bom acabou
Fiquei sozinho na pista
Aí pensei em Maria
E na tristeza simplista
Na prestação traiçoeira
E o que fiz com a primeira
Odete pagou à vista.
Desta vez reconheci
O valor do sentimento
Que quando a gente gosta
E só vem constrangimento
Mas com muita lealdade
Sem ter nenhuma maldade
Vem amadurecimento.
Depois veio a terceira
E também maioridade
Eu já era um homem feito
Com responsabilidade
Ela era moça bonita
Verdadeira senhorita
Mas não era tão beldade.
Com muita seriedade
Nosso namoro seguia
Tínhamos a mesma idade
Em frente sempre se via
Porém algo aconteceu
Não sei o que sucedeu
E já não mais existia.
Neste momento entendi
A relação sem verdade
Pois já éramos adultos
Mas não tinha a amizade
Cada um no seu lugar
Assim não pode juntar
Sem haver cumplicidade.
E mais uma vez cá estou
Procurando namorada
Dessas três tirei lições
Também dei uma melhorada
Mas eu quero uma família
Ter casa e uma mobília
E ter filhos em ninhada.
Preciso de uma mulher
Que se faça companheira
Esteja sempre ao meu lado
Pois sempre será primeira
Oh meu Deus me ouça aqui
O que fiz já aprendi
Mas me mostre a verdadeira.
Naquele canto da vida
Deixei minha esperança
Em cada esquina da Glória
Meu passado uma lembrança
Senti por dentro gastura
Como dor que não tem cura
Numa cruz que não descansa.
Passaram-se duros dias
Procurei na missa um padre
Confessei minha aventura
E rezei terço com a madre
Então tive mais firmeza
Quando ganhei de surpresa
Um convite do compadre.
Lá no quintal do compadre
Cheguei um pouco mofino
Calado e desconfiado
Como se fosse um menino
Olhei o povo presente
Então me fiz de contente
Pra não ser um desatino.
O mamulengo animava
A todos que o assistia
Goiaba se apresentava
Tiridá com maestria
E redondo era Seu João
Minha terra é tradição
‘Té amanhecer o dia.
E ao longe percebi
O que tanto procurei
Estava de mim tão perto
Porém eu nunca enxerguei
Passei o tempo sozinho
E ela no meu caminho
Quase nem acreditei.
Entre um grupo de meninas
Ela à mim se destacava
E o que eu tanto queria
Nem sequer pra mim olhava
Ela só tinha atenção
Vendo Quitéria e Simão
Nada mais interessava.
Assim este mamulengo
Nesta hora me servia
Para ver aquela flor
Era minha garantia
De construir amizade
Por muita sinceridade
Com quem eu via todo dia.
A festa enfim acabou
Fui sozinho pela estrada
Eu pensava e refletia
Por aquela caminhada
A flor daquela menina
Que se chamava Josina
Passei claro a madrugada.
Eu não consegui dormir
Mas o sono era presente
Virava de um lado a outro
Mas não ficava contente
E na bendita agonia
Esperei nascer o dia
Até mostrar meu repente.
E escrevi-lhe uma carta
Falando minha intenção
Como seriam meus dias
Contando de coração
E daquela novidade
Fiz minha realidade
Dei graças em oração.
Foi quando eu a encontrei
No açude levando o gado
E lá eu também iria
Deixar cavalo lavado
Perguntei com a esperança
Ela deu a confiança
Nos tornando namorados.
Daquele dia em diante
Vivi namoro e noivado
E da igreja da Glória
Saímos de lá casados
E disso tudo tirei
A lição que meditei
Para dar conta do recado.
Esta história se findou
Veio desde adolescência
Até a idade adulta
Aprendi com eficiência
Vivi tudo que foi dito
Assim me chamo Pirrito
E prometo uma sequência...
Boa Vista do rio Branco, 19 de agosto de 2014.