ALEIJADO CONFORMADO



A fazenda do sossego
Lá no meio do serrado,
Dono o coroné galego
Levava a vida folgado,
Tinha lá seu chamego
Mas era homem casado.

Numa época remota
A fazenda prosperou,
O seu filho era idiota
Que jamais estudou,
Coroné bateu a bota
A fazenda ele herdou

Coroné teve mais crias
Nenhum era registrado,
Todos filhos das Marias
De quem foi amasiado,
Deixou netos à revelia
E um monte de afilhado.

Seu filho atrapalhado
Mas era bom na saída,
Casou-se bem casado
Com a dona Margarida,
Que levou bom legado
É doida e convencida.

Não teve nenhuma cria
Por não gostar do jogo,
Isto é pecado ela dizia
O marido fingia de bobo,
Na verdade ela era fria
E o cabra não dava fogo.

Foram eles se acabando
Já velhos abandonados,
Casa já despedaçando
Vila formando dos lados,
Do mundo se separando
Num canto desprezados.

Lenda sempre sobrevivia
Na mente do tal homem,
Se uma onça por lá rugia
À noite elas nos comem,
Boi tatá, caipora e magia,
Vampiros e o lobisomem.

Vizinhança não ajudava
Pois pegaram na arrelia,
Caboclo não trabalhava
E a Margarida nada fazia,
Se comia o que sobrava,
Dia seguinte não comia,
Margarida doente ficava
Deu ataque de epilepsia.

A cada dia que passava,
Mais ela criava engrezia,
Cada vez que desmaiava
O marido mais se divertia,
Sofria raiva, ela apagava,
Onde desmaiava dormia.

Último ataque que sofreu
Foi doze horas desligada,
Um plano ele concebeu
Para se livrar da coitada,
Falo: a margarida morreu,
Enterro esta desgraçada.

Hora do almoço chegou
Eu não deixo pra depois,
Só dois ovos que sobrou
Acabou o feijão e arrois,
Coma um e também vou
Ela disse eu como é dois.

Como é dois ela berrou,
Ele,não é certo ora, pois,
Irritada ela já confirmou,
Veja os piolhos nos bois,
Nervosa ela aí capotou
Gritando eu como dois.

Quando isto aconteceu
Seu marido feliz da vida,
Cuspe o olho umedeceu
Na vila como alma perdida,
Berra minha muié morreu
Triste ó, adeus Margarida.

Todo povo logo assunta
Vamos lá rezar a procela,
A mulherada já se ajunta
Rezam e ascendem vela,
Dão um banho na defunta
E encomenda alma dela.

Enterra sem que apodreça
Assim escreveu o Moisés,
Ta na mesa não esqueça
Lençol curto põe em viés,
Tapa pé destapa cabeça,
Tapa cabeça sobram pés.

Todo velório tem graça,
Maridão não fez por mal,
O garrafão de cachaça
Trouxe e deu ao pessoal,
Entraram na manguaça
Já dançando um carnaval.

Meia noite ia chegando
O povo tonto na gozação,
Dama periquita coçando
Homem metendo a mão,
Bêbado já cambaleando
Foi ver morta sem caixão.

Safado estava é olhando
O peitinho da Margarida,
A mão boba amassando
De forma muita atrevida,
Olhava pés disfarçando
Viu o dedão dar a mexida.

Assustado falou depressa
Assombração, vós o sois,
Gritou que merda é essa
Veio do inferno cão lobrois?
Morta senta e grita sentida
Pois eu vou comer é dois

Ficou aleijado e Margarida
Povo desembestou correr,
Ela urrava sempre repetida
Eu como é dois, diz a gemer,
Coxo conformado da vida,
Pega outro, não vou correr.

Ela olhou pra o camarada
Falta pernas o tal Jacinto,
Viu braguilha avolumada
Tesou-se disse não minto,
Já que ovos deu em nada
Eu vou é comer este pinto.

Ela em paz ficou a pensar,
É safado meu maridinho.
Este cão ia me enterrar,
Só por eu comer o ovinho?
Dois ela não pode rangar,
Mas... Comeu o aleijadinho.

FIM


Interação da amiga Hull enfeitou o cordel. Obrigado linda.



MULHER FRIA?

Essa fala é antiga
não existe mulher fria
existe a mal servida
que padece na agonia.
O marido espertalhão
não passou de um bobão
que entrou por uma fria.

Se deu bem o aleijadinho
por Margarida comido
a mão boba no peitinho
despertou o adormecido.
O velório da manguaça
movido todo à cachaça
pegou mal para o marido.

Gosto de cordel assim
a estória fez sentido
tem começo meio e fim
bem feito para o sabido.
Nem sempre o espertalhão
sai bem na situação
Parabéns,meu caro amigo. 

Um grande abraço, amei o cordel bonito,


 
Trovador das Alterosas
Enviado por Trovador das Alterosas em 16/08/2014
Reeditado em 18/08/2014
Código do texto: T4925156
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2014. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.