O Batista

Sou as flores da manhã

Passagem pra harmonia

Floresta de planta sã

O contrário da agonia

Sou o pio da acauã

Que se ouve todo dia.

Fui servente de pedreiro

Cumpridor dos meus contratos

Fui também um gazeteiro

Que mostrou muitos retratos

E sem ser bom violeiro

Distraí muitos ingratos.

Usei tijolos de barro

Para improvisar fogão

Com água guardada em jarro

Comi pedaços de pão

Se eu nunca fui escravo

Também nunca fui patrão.

Escritor nunca eu seria

Não cheguei a ser pedreiro

Trabalhei noite e dia

Pra ganhar pouco dinheiro

Sofri fome em noite fria

Senti sede o dia inteiro.

Se alguém sabe o que é dor

Talvez possa me entender

Como é ser trabalhador

Que não tem o que comer

O que é não ter cobertor

Para poder se aquecer.

Não bebeu da água suja

Guardada na construção

Não comeu pão com babuja

Que é feito na pensão

Obedeceu ao rabuja

Que se tornou seu patrão.

Mesmo com tamanha lida

Digo que fui bem feliz

Pude seguir minha vida

Ser honrado, e isso eu fiz,

Sem agir á escondida

Casei com a mulher que quis.

Fui feliz e não duvido

Isso sempre eu vou dizer

Só lamento não ter tido

Outra luta pra vencer

Pois o dinheiro contido

Burilou o meu querer.

Se outra vida precisar

Para se chegar ao céu

Duas vezes vou pensar

Talvez queira andar ao léu

Já que pro meu caminhar

Só preciso de um chapéu.

Comigo sou coerente

Gosto de ter calmaria

Já encontrei algum crente

Que duvidou de Maria

Mesmo sendo coerente

Se perdeu na anarquia.

Não sei se isso lhe agrada

Mas eu sou bem realista

Isso às vezes desagrada

Como alguém seguindo a pista

Entretanto eu tive a graça

De também ser o Batista.

Fui amigo de doutores

Abriguei mulher mendiga

Dei alívio a muitas dores

Combati muita fadiga

Ignorei cobradores

e não permiti intriga.

Fui alegre dançarino

Muitas damas abracei

Muitas flores no caminho

Eu também sempre espalhei

Não fui de Deus o menino

Porém bem perto cheguei.

Mesmo sendo muito pobre

Também tive algum valor

Tive a fortuna do nobre

Pois de mim pude dispor

A fortuna expressa em cobre

Não compara com o amor.

Sou a faceira muralha

Que bem perto está do céu

Para o velho eu dou sandália

Para a dama eu dou o véu

Mas não fujo da batalha

Que travei como um ilhéu.

Sou também agradecido

Por me ouvir sem ser jocoso

Sou um poeta esquecido

Que escreve defeituoso

Mas curei ensandecido

Vendo nele alguém ditoso.

Encontrei a caminhar

Quem seguiu a minha lei

Fui com ele consultar

Nele vi o Astro Rei

Disse em mim acreditar

Porque eu também amei.

Fui um cometa terreno

Assim como é a lua

Dormi muito no sereno

Quando caminhei na rua

Nunca produzi veneno

Minha paz também é sua.

Sei que é hora de parar

De falar troço esquisito

Você me obrigou pensar

Lendo o que foi escrito

Muito bom foi encontrar

Você onde eu coabito.

Renato Lima
Enviado por Renato Lima em 16/08/2014
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