Confissões de um defunto.

Sou sincero em meus defeitos

Por isso estou sempre só

Já gostei de ver mal feito

Não gostei de ser a mó

Se morri pra mim bem feito

Foi como eu voltei ao pó.

Sei que foram vis defeitos

Que a minha vida tiraram

Pra viver não tive jeito

Fui um pobre que mataram

Sempre achei que era perfeito

Assim mesmo me acertaram.

Já procurei confusão

Por isso fiz inimigos

Não quis ouvir meu irmão

A esse neguei abrigo

Por isso eu fui logo ao chão

Levado por falso amigo.

Sei que não fui bom obreiro

Também não fui preguiçoso

Não fui nenhum engenheiro

Embora talvez teimoso

E mesmo sem ter dinheiro

Fui muito licencioso.

Tive muitos outros defeitos

Que não posso enumerar

Pois não mais serei aceito

Se tais manchas revelar

Sei que hoje estou sujeito

A ouvir e me calar.

Se trabalhei bem cansado

Para aos meus levar o pão

À esposa dei maus tratos

Por me julgar valentão

Hoje sei que sou um trapo

Que não vale um só tostão.

Se tive amigos não sei

Desavenças sei que tive

Sei também que não briguei

Isso é coisa de patife

Se fui um desses não sei

Mas nunca enchi um esquife.

Minha casa era pequena

Minha roupa remendada

Minha mulher tão serena

Muitas vezes humilhada

Pra vida valer a pena

Eu fiz muita trapalhada.

Isso é tudo que eu tinha

Pra dizer em sãs palavras

Atormentei a vizinha

Que é mulher de boa lavra

Por ela dava o que tinha

Mas a honra não se lava.

Sei que hoje estou sozinho

Igual a outros defuntos

Recuso a ter um vizinho

Que faz parte dos presuntos

Eu quero ser o reizinho

Da cidade dos pés juntos.

Quero aqui pedir perdão

Àqueles que não amei

Minha sogra, meu irmão

Meus filhos que castiguei

Ao meu pai, meu amigão

E ao sogro que explorei.

À mulher que ainda amo

Com a força do meu ser

A sua honra eu proclamo

Mesmo sem a poder ver

Da minha dor não reclamo

Tudo fiz pra merecer

Renato Lima
Enviado por Renato Lima em 09/08/2014
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