Casa de caboclo
Uma casa entristecida
Na floresta abandonada
Omitia a própria vida
Se julgando indesejada
Vivia sempre escondida
Presa o seu próprio nada.
Mil projetos foram feitos
Para a casa se acabar
Apontaram seus defeitos
E mandaram derrubar
Apesar desses defeitos
Alguém nela quis morar.
Era cheia de defeitos
Sem fogão e sem panela
O senhor não era aceito
A tranca uma taramela
Para o dono um lar perfeito
Mesmo sendo sem janela.
Nessa casa uma fornalha
Era o pouco que se via
Um colchão de cordoalha
Tecido com o que havia
Sobe a cama uma toalha
Usada no dia a dia.
Quando o sol se escondia
A floresta aquietava
Uma chama se acendia
Com a folha que secava
E alguém se aquecia
Vendo a fome que chegava.
No calor via a batalha
Para ter seu ganha pão
Não era a simples mortalha
De alguém que segue em vão
Era a dor de quem trabalha
Sob a dor da escravidão.
Sua dor era tamanha
Sem direito a reclamar
Sequer Deus o acompanha
Para um estranho lugar
Se falar sabe que apanha
O seu chão vão lhe negar.
Não tem lar, não tem família,
Sem direito a descansar
O patrão forma a quadrilha
Com direito pra matar
Sempre ouve que a filha
É para o patrão usar.
Todo dia bem cedinho
Vai pra roça trabalhar
Toma só um cafezinho
Para o seu jejum quebrar
Vai ficar sempre sozinho
Ate a noite chegar.
Quando a noite se avizinha
Sabe que vem sofrimento
Sua voz se vê sozinha,
Ganha só isolamento
Se tem algo ele cozinha
Mas lhe falta o alimento.
Numa bica ele se banha
Sem direito a enxugar
Só mau trato é o que ganha
Nunca pode descansar
Se acaso ele se acanha
O patrão manda espancar.
A parede do barraco
Ele fecha com sapé
Sabe que não é um fraco
Mas perdeu a sua fé
É chamado de macaco
Quando cochila em pé.
É chamado vagabundo
De crioulo, mascarado,
Retiraram do seu mundo
Para ser escravizado
É chamado preto imundo
Que precisa ser domado.
Esse negro que padece
Sob o peso do ferrão
A sua dor agradece
Assim cumpre uma missão
Ao mais humilde obedece
Estendendo a sua mão.
Quando a vida se apaga
Ele vê o seu futuro
Sabe que a vida é vaga
Vai viver em solo puro
Se por nada teve paga
Vai ganhar tudo com juro.
Vai viver nova jornada
Junto aos seus familiares
Vai ganhar nova morada
Construindo novos lares
Sua paz lhe será dada
Navegando em outros mares.