APÓLOGO DAS ÁRVORES
Conto de domínio público, adaptado para o cordel por Joames.
Eram três árvores frondosas
Nascidas na mesma terra,
Nas encostas de uma serra
Entre fontes caudalosas;
Ali cresceram viçosas
Tangidas ao vaivém
Da mansa brisa do além
Por muitos e muitos anos
E como os seres humanos
Tinham seus sonhos também!
Cada árvore pujante
A larga fronde estendia,
Quando foi um certo dia
Uma delas radiante
Num diálogo interessante
Envolveu suas parceiras
E durante horas inteiras
A conversa transcorreu,
Cada uma o sonho seu
Segredou ás companheiras.
A primeira disse assim:
Desejo futuramente
Ser um baú reluzente
Ornado em ouro e marfim;
Para ser dona de mim
Quero uma linda princesa
Da mais sublime pureza
Que o mundo já pôde dar,
Para em meu bojo guardar
Sua preciosa riqueza!
A segunda disse: anelo
Ser o maior dos navios,
Singrar os mares bravios
Sob o firmamento belo;
Aliviar o flagelo
De quem padece aflição,
Servi-lo de condução
Para uma enseada calma,
Sanar os males da alma
E as dores do coração!
A terceira árvore disse:
Daqui não quero sair;
Desejo crescer, subir,
Com esplendor e meiguice;
Quero alcançar a velhice
Espalhando os ramos meus
Sobre os crentes e ateus
Para os homens me olharem
Lá de baixo e se lembrarem
Que no céu existe um Deus!
Muitos anos se passaram,
Todos iguais aos primeiros,
Mas um dia os madeireiros
Em torno delas chegaram,
As árvores examinaram,
Medidas foram tomadas,
Todas três foram cortadas,
Lavradas e divididas
E logo após conduzidas
A plagas ignoradas.
Para uma carpintaria
A primeira foi levada
E logo após transformada
Numa rude estribaria.
Um dia a Virgem Maria
Num desconforto profundo
Naquele estábulo imundo
A seu filho deu a luz,
E a árvore guardou Jesus,
Tesouro maior do mundo.
Da segunda, um pescador
De recurso muito parco
Construiu um tosco barco
De muito baixo valor,
Nele fazia o labor
Pra sua manutenção;
Numa certa ocasião
Foi desse barco pequeno
Que Jesus, o Nazareno
Fez o mais belo sermão
A terceira não servia
Para utensílios de uso,
Tornou-se objeto escuso
De velha carpintaria;
Mas por fatal ironia
Foi tirada dos pauis,
Fizeram dela uma cruz
Muito pesada e grosseira
E nessa cruz de madeira
Crucificaram Jesus!
No pequeno logradouro
O estábulo no seu bojo
Não guardou nenhum estojo
Trabalhado em prata e ouro,
Mas guardou maior tesouro,
Cristo, Deus que nos assiste,
Que do barco humilde e triste
Deu lições de amor profundo
E a cruz em todo o mundo
Faz lembrar que Deus existe!
Moral: Nunca desista dos seus
sonhos!