BATALHA INFERNAL
Minha vida nunca foi fácil
Sempre tive que lutar,
Lutei em batalhas ferrenhas
Sem nunca desanimar
E dentre as que eu venci
A mais difícil eu escolhi
Para, em versos, lhes contar.
Eu sou um animal xucro
Fui criado no sertão,
Aprendi desde criança
Agir sempre com a razão,
Contudo, eu não me engano
Pois na condição de humano
Posso entregar-me a emoção.
E foi nesta divergência
Entre racional e emocional
Que um dia eu enfrentei
Uma batalha infernal,
Foi o certame mais horroroso
Contra um inimigo cabuloso
De força sobrenatural.
Sou bruto elevado ao cubo,
Medo eu nunca senti
Mesmo diante do perigo
Continuo firme, jamais tremi,
O único medo que eu trago
É de sentir medo de algo,
Mas deste mal nunca sofri.
Certo dia eu estava andando
No mato, por uma estradinha,
O local era deserto
E quando dei fé lá vinha
Um indivíduo catinguento
Que vinha montado no vento,
Parecia um capetinha.
Ele foi se aproximando
Até que pude perceber
Era uma criança horrenda
Que vou tentar descrever
Tinha chifres, rabo e bigode
As pernas eram patas de bode
Mas tinha o rosto de bebê.
Quando foi se aproximando
Já começou a gritar,
Disse-me: - Saia da frente
Que eu tô querendo passar
Esse caminho é estreito
E você me deve respeito,
Ou sai ou vou lhe pisar.
Aí meu sangue ferveu,
Eita moleque abusado!
Com uma empáfia enorme
E muito mal educado,
Mandei-o fechar a matraca
Senão ia cair na taca
Pra deixar de ser folgado.
Mas o “cruzcredinho” insolente,
No mesmo instante retrucou
Disse-me que eu era seu servo
E assim me ordenou
Que eu deveria obedecê-lo
Que, por ele, tivesse mais zelo
Já que era meu senhor.
Perguntei moleque atrevido
Diga-me quem é seu pai?
Disse-lhe segurando-o pelos chifres
Peça desculpas ou daqui não sai
Se teu pai não te educou
Agora você se enrolou
Levar umas palmadas tu vai.
Virei o moleque de bruços
Dei-lhe setenta palmadas
É pra você aprender
Respeitar todos nas estradas
O capetinha entrou em choque
Soluçava e dava pinote
Enquanto eu dava risadas.
Ao soltar o cramunhãozinho,
Confesso, fiquei com dó
Seu bumbum estava queimando
E ele o arrastava no pó,
Levantou-se sacudindo a poeira
O negro disparou na carreira
Pro rumo do cafundó.
Correu com grande desespero
De longe eu o ouvi gritar,
Contarei tudo ao meu pai
E ele vai te encontrar,
Meu pai é ruim até
Sou filho de Lúcifer
Que irá te castigar.
E sumiu mata adentro
Eu continuei pela estrada
Ao caminhar eu pensava
Se sofreria emboscada,
Bati no filho do cão
Mas sem nenhuma aflição
Continuei a jornada.
Enquanto isso o diabinho
Chegando às profundezas
Contou tudo para seu pai
Que da maldade é realeza
Satanás ordenou sem pensar
Para demônios irem me buscar
E levar pra sua alteza.
Disse-lhes antes que partissem
A ele só façam o nocivo,
Podem bater e torturar
Façam dele um cativo,
Tratem-no com maldade e humilhação
Imponham-lhe sofrimento e judiação
Mas me tragam ele vivo.
Já era tarde da noite
E eu resolvi descansar
Como o lugar era ermo
Sem nada pra me abrigar
Escalei um pé de pequi
Acomodei-me e ali
Comecei a cochilar.
Dormi por alguns instantes
Com um barulho despertei,
Parecia trote de cavalos
Foi quando eu avistei
Os quatro demônios enviados
Fortes e bem armados,
No pequizeiro me ajeitei.
Tenho uma corda de laço
Que carrego sempre comigo,
Ela tem muita serventia
O nosso caso é antigo,
Neste dia não foi diferente
Pois a corda certamente
Ajudou-me com o inimigo.
Eles vinham enfileirados
E eu fiquei ali parado
Esperei que passassem três
E o último foi laçado
Os outros seguiram trotando
Pelo pescoço fui puxando
Até que morresse enforcado.
Pulei com a espada na mão
E chamei os demais pra briga
Os demônios voltaram ligeiro
Vieram cheios de intrigas
Segurei na barba do primeiro
E com um golpe certeiro
Abri-lhe toda a barriga.
Ouvi outro demo dizer
Queremos que você padeça
Vamos lhe judiar muito
Para que jamais esqueça
E enquanto ele falava
Num só golpe eu separava
O seu corpo da cabeça.
Quando o último observou
Um dos demônios enforcado
Já começou a tremer
E ficou mais apavorado
Ao ver que mais dois demônios
Tiveram finais medonhos
Um sem cabeça, um destripado.
Segurei-o pela orelha
E comecei a lhe espancar
Disse-lhe que o deixaria vivo
Para um recado levar
Dizer para o satanás
Que não me procurasse mais
Ou também iria apanhar.
Depois larguei o demo frouxo
Ele saiu em disparada
Embrenhou-se pela mata
Voltou pra sua morada
Chegou lá doido varrido
Mas contou o ocorrido
Sob muita chicotada.
O coisa ruim ficou irado
Reuniu o conselho infernal
Destacou uma legião de cão
E disse a seu general
Pode até fazer do seu jeito
Mas acabe com esse sujeito
Que me humilha e me faz mal.
Partiu do inferno a legião
Ao meu encontro, aos milhares
Marchando e bradando canções
Que dissipava pelos ares
Se um cão bodeja outro berra
Neste dia havia mais cão na terra
Do que todos os peixes dos mares.
Eu os avistei de longe
Parecia um formigueiro
Então eu fui recuando
Até um desfiladeiro
A passagem era estreita
Fiquei ali, à espreita
Sob um céu de brigadeiro.
O caminho era ladeado
Por dois abismos profundos
Era minha única chance
De vencer aqueles imundos
Por vez, apenas um passava
Um a um eu os derrotava
Mandava-lhes pro sub mundo.
Passaram-se três dias e três noites
Eu naquela terrível batalha
Com a lâmina de minha espada
Transformava capeta em migalha
Com meu coração compassado
Meu braço não ficou cansado
E minha espada era uma navalha.
No final da terceira noite
Quando o sol vinha nascendo
Ali os últimos demônios
Por minhas mãos iam morrendo
Os abismos quase lotados
Com os corpos dos desgraçados
E de sangue escorrendo.
Depois do fim da batalha
Uma coisa me intrigou
Sei que havia um general
Mas comigo ele não lutou
Deve ter se apavorado
Ao ver morrer tanto soldado
E para o inferno voltou.
Saindo do desfiladeiro
Subi no topo de um morro
Fui em busca de alimentos
Meu bucho pedia um forro
A natureza é providente
E me atendeu prontamente
As frutas foram meu socorro.
Lá na encosta do morro
A água brotava do chão
Era um local seguro
Eu tinha toda a visão
Como eu estava cansado
Ali fiquei acampado
Analisando a questão.
Fiquei ali por seis horas
Depois continuei a andar
Sem medo, mas com cuidado
Com o que poderia encontrar
Sabia que meu inimigo
Estando fulo comigo
Continuaria a me caçar.
Passando por um planalto
Eu tive uma surpresa
Fui emboscado por demônios
Naquele cenário de beleza
Vi-me ali acuado
Por milhares de demônios cercado
O general mostrou destreza.
É que enquanto eu estava lutando
No desfiladeiro com os demais
O general voltou ao inferno
E pediu para satanás
Mandar mais demos pra terra
Prometendo a vitória na guerra
Para as tropas infernais.
Devidamente autorizado
Ele partiu com a cambada
Deu a volta por trás do penhasco
E parou na encruzilhada
Enquanto lá eu lutava
O catinguento me esperava
Para me matar na emboscada.
O general estava contente
De seu plano estava orgulhoso
Ali eu era uma presa fácil
Na armadilha do tinhoso
Pensou que eu iria implorar
Mas eu preferi lutar
E enfrentar o seboso.
Ordenou que me atacassem
Mas seus soldados hesitaram
Sabiam que por minhas mãos
Milhares de capetas tombaram
O general sem pestanejar
Começou a chicotear
E muitos deles debandaram.
Nesta hora eu bradei
General, você só tem alarde!
Chicoteando seus soldados,
Quem lutará por ti mais tarde?
Você é um sujeito orgulhoso
Não passa de um mentiroso,
É simplesmente um covarde.
E continuei bradando
Falando de liderança
Muitos demônios extasiados
Encheram-se de esperança
E o general sem ação
Acusou-lhes de traição
E ainda jurou-lhes vingança.
Batia os cascos no chão
Só se ouvia o tinido
O negro invocava seu pai
E toda corja de bandido
Mas ficou mesmo abismado
Ao ver passar pra meu lado
Boa parte de seus amigos.
Um terço daqueles soldados
Aceitaram o meu comando
A batalha iniciou-se
E eu fui organizando
O general ficou com inveja
percebera que minha estratégia
Acabaria lhe derrotando.
Ali sob meu comando
Eles lutaram com valentia
Seus espíritos se encheram
De paz, amor e alegria
Pela honra e pela glória
Lutaram até a vitória
Dando fim na agonia.
O último certame, no entanto
Foi entre eu e o general
Arranquei-lhe logo os chifres
E seu apêndice caudal
Dei uma surra medonha
Naquela besta bisonha
Chefe da tropa infernal.
Permiti que ele partisse
Pois meu perdão é eterno
Porém, mandei um recado
Para seu conselheiro interno
Vá e diga a satanás
Que se não me deixar em paz
Invadirei o inferno.
Antes de o general partir
Suas unhas eu arranquei
Cortei suas quatro orelhas
E três de seus olhos furei
Como sou um sujeito "bonzinho"
Eu deixei ele vivinho
Mas meu recado eu mandei.
Ordenei que fosse embora
Ele saiu cambaleando
Não disse uma palavra
Mas sei que ele foi pensando
Que agora estava lascado
Já que perdeu tanto soldado
O castigo estava lhe esperando.
Aqueles que me ajudaram
Um a um fiz meu agradecimento
Sem eles não conseguiria
Ter êxito naquele momento
Prostrei-me de joelhos no chão
Em sinal de adoração
Pedi pra eles o livramento.
Sejam quais forem seus pecados
Vocês estão perdoados
Deus fala através de mim
E por ele nós fomos guiados
Nesta hora desceu um clarão
E pela maior proteção
eles foram arrebatados.
Agradeci ao meu Deus
Por aquela grande vitória
Continuei minha caminhada
Ainda não acabou a história
Cheio de paz celestial
Tornei-me, de Deus, um general
Luto por amor, paz e glória.
Mas o desgraçado do tinhoso
É um bicho atrevido
Ele foi me procurar
prometeu o mundo e fez um pedido
para que eu fosse seu general
E comandasse a tropa infernal
isto me deixou enfurecido.
Sem dar ouvidos a ele
Preparei-me para brigar
Quando ouvi um brado do céu
Pedindo-me para parar
Era Deus e em sua bondade
Revelou-me sua divindade
E isto me fez acalmar.
Ele disse não se aflija
Satanás tá desesperado
Eu fiz um trato com ele
Há muito tempo passado
Mas o prazo está acabando
Meus filhos ele vive tentando
Querendo levar-lhes para seu lado.
Você pode ir em paz
Por ora chega de provação
Continue cheio de graça
Com amor no coração
Eu sempre estarei contigo
e se estiveres comigo
receberás a salvação.
Virou-se e disse xô satanás
Ficar aqui não lhe convém
Dissestes que ficaria com todos
Mas está perdendo os que tem
tu tentas e eu tenho esperança
Que minha imagem e semelhança
Não me deixará por ninguém.
Satanás desapareceu
Ficou Deus, o Glorioso
Disse-me tenhas cuidado
Lúcifer é astucioso
Já foi meu anjo, hoje é assim
Tem muita inveja de mim
É falso, confuso e malicioso.
Lembre-se sempre de uma coisa
A tentação dele é um perigo
Ele tem muitos seguidores
É um poderoso inimigo
Comanda um exército de cão
Mas quem me tem no coração
está sempre protegido.
Deus foi saindo e dizendo
Eu estou em toda parte
Registre o que vivenciou
Sua escrita é uma arte
Siga como pessoa do bem
Ajudando sem olhar a quem
Meu filho Galvino Duarte.