CORDEL – O malandro jogador de sinuca – 11.11.2013
 
CORDEL – O malandro jogador de sinuca – 11.11.2013
 
 
Oitavas de sete sílabas poéticas
Rimas em ABABCDCD
Elisão facultativa
Interações à vontade

 
Josias quando nasceu
Em berço remediado
De tudo seu pai lhe deu
Um rapagão arretado
Nasceu com seus quatro quilos
E cresceu rapidamente
Pra comer guardava em silos
Como se fossem sementes
 
Não gostava de estudar
Adorava brincadeira
Principalmente jogar
Pra ele tudo besteira
Trabalhar para ninguém
Dinheiro tinha do pai
Só faz o que lhe convém
Só assim ele distrai
 
E lá pelos quinze anos
Juntou-se à malandragem
Tudo por baixo dos panos
Vivia na molecagem
Jogava tudo na vida
Até porrinha (¹) também
Tinha cara destemida
Sem dever nada a ninguém

Foi ficando conhecido
Por toda a redondeza
Competente e decidido
Pela sua ligeireza
Mas na sinuca meu caro
Tornou-se especialista
Perder uma era raro
Porque muito bom de vista
 
De pontaria também
Dominava a tabela
Mas seu segredo, porém,
Ele jamais que revela
No taco (²) era diferente
Tinha domínio completo
Abismava toda gente
De ardil muito repleto
 
Sua fama foi ganhando
Cidades dali de perto
E ele sempre galgando
Um grande cartaz, decerto,
Derrotava todo mundo
Com tamanha esperteza
Era metedor (³) profundo
Graças a sua destreza
 
Mas abrindo um parêntese
Adorava namorar
Parece era do gênese
Seu prazer era ficar
E de cidade em cidade
Deixava uma apaixonada
Casar nem por caridade
Era somente “ficada” (4)
 
Quando chegou ao sertão
Com essa grande andança
Não jogou com Lampião
Que morrera de matança
Sua fama lá ainda
Não teria nem chegado
Qualquer partida bem vinda
Escondeu o seu legado (5)
 
Com o cobrão da cidade
Jogou uma, duas vezes,
E somente por maldade
Tomou mais uns três revezes
Tapeando pra valer
O Juquinha não notara
Então fez aparecer
Seu jogo agora vingara
 
Mas a aposta dobrando
De um para dois reais
O salão sempre lotando
Para ver seus cardeais
Quando estava em duzentos
Arriscou mais uma vez
Pensando nos quatrocentos
Foi assim que ele fez
 
Perdeu pela bola sete (6)
Ela quase na caçapa
Nunca mais ele repete
Na mesa deu uma tapa
Pra tapear os presentes
Que torcia pelo amigo
Alguns rangiam os dentes
Mas perder só por castigo...
 
E dobrada a aposta
Seu colega deu saída
A mesa tão bem disposta
A bola deu descaída
A sete ficou caindo
Bem na beirada do saco
O cobrão ficou sorrindo:
”Agora é que ensaco”

Botou a sete pra dentro
E aprumou a vermelha (7)
Colocando bem no centro
Depois coçou a orelha
Então preparou a sete
E duas vezes meteu
Puxando pra bola dois (8)
Que toda turma tremeu
 
Não é que a bola branca (9)
Ficou mesmo aprumada
Calado pensou: “Te manca,
Estou com sorte arretada”
Mas a sete foi cair
Duas vezes novamente
Os pontos só a subir
 Vitória bem competente
 
Com o seu jogo conciso
Enfiou todas as bolas
Seu parceiro ficou liso (*)
Na frente desses boiolas
Então logo sugeriu
Uma jogada esquisita
Própria de quem já faliu
Não sei se devo dar pista
 
Pois ganhando recebia
Os oitocentos reais
Mas suas pernas tremiam
Não podia perder, jamais,
Tocaria um clarinete
No sanitário dos fundos
O instrumento do Josias
Que era grande e profundo
 
Quando o jogo terminou
A turma toda correu
Para ver como ficou
Como tudo aconteceu
Juquinha pigarreando
Com cara cheia de borra
-- O que achou do malandro?
“Vai jogar assim na porra”
 
Deixo então um conselho:
“Não se meta a jogador
Mire-se no seu espelho
Pra não ser um tocador
Não perca sua vergonha
Nem tudo que seu pai deu
Também não seja um pamonha
Lembre-se do que ocorreu”.
 
 
Ansilgus
 
Direitos reservados.
 
Repositório - Quem joga sinuca conhece:
 
(¹) – Jogo dos três palitinhos.
(²) – Vara que impulsiona as bolas.
(³) – Que encaçapava muitas bolas.
(4) – Somente sexo.
(5) – Aqui quer significar especialidade.
(6) – Bola preta.
(7) – Bola um.
(8) - Bola amarela
(9) – Bola que inicia todas as jogadas.
(*) – Duro, sem dinheiro.

Fonte da foto: GOOGLE. Caso tenha direitos autorais peço o favor de me avisar, pois retirarei a imagem.
ansilgus
Enviado por ansilgus em 12/11/2013
Reeditado em 19/11/2013
Código do texto: T4567243
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