A APOSTA DOS DOIS GULOSOS.

Estou aqui novamente,

Trazendo para o leitor,

Mais um gostoso cordel,

De algo que se passou,

Esse um tanto curioso,

Aposta de dois gulosos,

Contado por meu avô.

Na década de sessenta,

Em um certo seringal,

Do estado de Rondônia,

Deu-se o fato anormal,

Dois sujeitos ignorantes,

Fizeram em um instante,

Um trato descomunal.

Nesse dito seringal,

Morava um tal Julhão,

Um sujeito trabalhoso,

Porem cheio de razão,

Trabalhava de veneta,

E uma força do capeta,

Mas comia igual leão.

O sujeito tinha a força,

Que era difícil acreditar,

O peso que carregava,

Era mesmo de admirar,

Carregou de uma eitada,

Noventa olhos de palhas,

Fez isso pra se mostrar.

Para se ter uma ideia,

Da força desse sujeito,

A carga de um homem,

Que não tivesse defeito,

Se a memória não falha,

Eram dez olhos de palha,

O peso mais que perfeito.

O outro era Zé Vicente,

Que não enjeitava parada,

Comia que nem lima novo,

No desbastar da enxada,

Os dois estando na mesa,

O anfitrião com certeza,

Estava de vida enrolada.

Zé Vicente era bem alto,

E um tanto corpulento,

Servia pra dar recados,

Pois andava igual o vento,

Mas pra trabalho forçado,

Era sempre descansado,

Tinha a força de jumento.

Já Julhão era diferente,

Sujeito baixo entroncado,

Também era corpulento,

Era um baixinho invocado,

O seu nome na verdade,

É julho Silva de Andrade,

Um glutão desaforado.

Zé Vicente era bem gazo,

Tinha os cabelos sarará,

Um daqueles negros aços,

Muito bom pra prosear,

Gostava de contar piadas,

Só se ouvia as gargalhadas,

Das pessoas a lhe escutar.

E essas duas criaturas,

Gostavam de se gabar,

Contando suas proezas,

Para o povo se espantar,

E por toda a vizinhança,

Pra eles encher a Pança,

Haja comida pra fartar.

Zé Agripino era o patrão,

Desses dois avantajados,

Já estava de saco cheio,

E se sentindo engabelado,

Pois já não queria mais,

Sustentar os dois chacais,

Num prejuízo lascado.

E um certo dia o patrão,

Resolveu fazer um teste,

Dizendo com sigo mesmo,

Ainda mato esses pestes,

Pois aquele que escapar,

Alem de o premio ganhar,

Vai passear no nordeste.

Quero dar-lhes uma lição,

Que nunca vão esquecer,

Meus amigos eu garanto,

Se arfando não morrer,

Não vai mais me molestar,

Comendo tudo o que há,

E a lição vão aprender.

Não há cristão que ature,

Sustentar esses insextos,

Pois para não trabalhar,

Inventam todo o pretexto,

Só trabalham empurrados,

Pra comer são esganados,

Igual égua sem cabrestos.

A proposta era a seguinte,

Os dois tinham que comer,

Quatro quilos de biscoito,

Sem do canto se mexer,

Para a refeição completar,

Quatro litros de patoá,

Para cada um deles beber.

Patoá pra quem não sabe,

É vinho de uma palmeira,

Mais forte que o açaí,

Da Amazônia brasileira,

É um suco bem leitoso,

Extremamente oleoso,

E pesado pra besteira.

Mais dois quilos de farinha,

Pra completar o banquete,

Também uma jatuarana,

De quatro quilos o peixe,

Para as suas sobremesas,

Seria posto nessa mesa,

Muita coalhada de leite.

O patrão chamou os dois,

E a tal proposta lhes fez,

O que conseguir comer,

Tudo isso de uma só vez,

Vai ser por todos honrado,

Ganhando como resultado,

Passeio e férias de um mês.

Vocês dois são comilões,

Todo mundo já conhece,

Mas quero tirar a limpo,

Já que os dois não amolece,

Toda a comida é de graça,

Se quiserem dou a cachaça,

Sei que vocês dois merece.

Ali os dois concordaram,

Em cumpri a tal façanha,

Nenhum queria perder,

E assim passar vergonha,

Ficando tudo acertado,

Pra o dia de São Geraldo,

No festejo da castanha.

Passaram-se trinta dias,

Chegou o esperado dia,

No campo do barracão,

Tinham festejos e folia,

Zé Vicente e o tal Julhão,

Chamados pelo patrão,

Foram parar na cozinha.

Lá dentro estava a mesa,

Bem repleta e caprichada,

Com todos os alimentos,

Ali em porções dobradas,

Zé Vicente quando viu,

Olhou pra Julhão e sorriu,

E disse matei a charada.

Julhão arregalou os olhos,

Hoje vou me empanturrar,

Quero só ver se Zé Vicente,

Tem tranco pra aguentar,

Estômago tenho de sobra,

Como sem fazer manobras,

Esse e algo mais que chegar.

As pessoas vieram todas,

Ficaram em volta da mesa,

Atentas para assistirem,

Dos comilões tal proeza,

Muitos ali cochichando,

Com espantos indagando,

Sobre horrenda despesa.

Foi entregue a cada um,

Uma espécie de bacia,

Por ser grande quantidade,

Em nenhum prato cabia,

E os dois sem se importar,

Despejaram nela o patoá,

E os dois quilos de farinha.

Fizeram logo um tal pirão,

Na cor de um café com leite,

Entraram na tal jatuarana,

Toda encharcada de azeite,

Com os olhos arregalados,

Nem olhavam para os lados,

Nesse espantoso banquete.

Comeram o peixe todo,

Com a farinha e o patoá,

E o povo que ali estava,

Ficaram sem acreditar,

Como os dois homens ali,

Comeram sem se bulir,

Sem ao menos arrotar.

Comeram aquilo tudo,

Isso em poucos minutos,

E muitos que ali estavam,

Diziam o sistema é bruto,

E pra não perder o gosto,

Devoraram os biscoitos,

Bem torrados e enxutos.

Nessa hora o Zé Vicente,

Começou com um mal estar,

Dizendo não aguento mais,

Estou aponto de estourar,

Enquanto isso o tal Julhão,

Destampou aquele panelão.

Pra da coalhada provar.

Comeu mais uma tantada,

Da coalhada que ali tinha,

Comeu e lambeu os beiços,

Com açúcar e mais farinha,

Enquanto isso Zé Vicente,

Recolheu-se de repente,

Retirando-se da cozinha.

Julhão comeu a coalhada,

A dele e a do companheiro,

Bebendo um copo d’água,

Pra calibrar o seu tempero,

Foi-se pra seus aposentos,

No prazo de pouco tempo,

Acordou com o pesadelo.

Foi que ouviu Zé Vicente,

Gemendo pra se acabar,

Com uma dor desgraçada,

Sem poder se levantar,

Então depressa Julhão,

Foi e acordou seu patrão,

Para a novidade contar.

Aconteceu o seguinte,

Assim Julhão calculou,

No bucho de Zé Vicente,

Aquela farinha inchou,

Com o patoá misturado,

O bucho ficou azulado,

Por pouco não estourou.

Assim pela madrugada,

Deu-se o fato consumado,

Uma enorme congestão,

Matou o pobre coitado,

Que ali ficou conhecido,

Após todo esse ocorrido,

Por defunto empanzinado.

Zé Vicente assim morreu,

Não suportou o arrocho,

Foi-se sem se despedir,

E sem causar alvoroço,

E por toda aquela região,

Foi que o tal de Julhão,

Passou a falar mais grosso.

Julhão ganhou a aposta,

E seu prêmio combinado,

Se ele foi passear não sei,

Não soube do resultado,

Não quis mais fazer duelos,

Só sei que morreu de velho,

Num seringal do machado.

Agora deixo um recado,

Pra quem não acreditar,

Nesse fato acontecido,

E que muito ouvi contar,

De Julhão e Zé Vicente,

Dois sujeitos do repente,

Corram lá pra perguntar.

Findo aqui mais um cordel,

Para o meu amigo leitor,

Pra quem tiro meu chapéu,

Co’ respeito e muito amor,

Despedindo-me por agora,

Mas logo em poucas horas,

Estou de volta meu senhor.

Cosme B Araujo.

12/09/2013.

CBPOESIAS
Enviado por CBPOESIAS em 12/09/2013
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