LOUCO AMOR- MÍSTICA SUBLIMAÇÃO DA DOR:
01
De estrelas fiz um Terço
Para conseguir rezar
E das relvas fiz meu berço
Para nele repousar
No vento me embeveço
Pra com as nuvens conversar.
02
Fiz um genuflexório
Com as areias da praia
Em meu rito expiatório
O crepúsculo é alfaia
Dos vulcões fiz incensório
Da dor, o Templo de Gaia.
03
Fiz das montanhas, altar
Dos relâmpagos, fiz vela
De aspersório, fiz o mar
Da Penitência, procela
Me confessei ao luar
Pois da mata fiz capela.
04
Encontrei nas cachoeiras
Ecos pra a salmodia
Litanias choradeiras
Pela água que descia
O choro das carpideiras
Verti ao morrer do dia.
05
Os canários entoaram
Um “De profundis” dolente
Os pintassilgos cantaram
Um “Miserere” pungente
Os rouxinóis retumbaram
Em um “Réquiem” clemente.
06
Mas o “Te Deum”, porém
Este não posso cantar.
Minha Quaresma, Ninguém
Vai Aleluia entoar
Pois o meu rito é de quem
No purgatório está.
07
Minha prece, como a dor
Já é indulgenciada
Oferto assim, meu amor
Como patena dourada
De refulgente esplendor
Tal qual Hóstia consagrada.
08
E assim eu batizei
A vida no Oceano
E depois eu comunguei
Este desgosto tirano
A lascívia eu crismei
Como pecador profano.
09
E Ordenei o desejo
Pela magnificência
Ungindo-o com o beijo
Casei com a concupiscência
A Extrema-unção, no ensejo
Ministrei á paciência.
10
Zombei das deusas vestais
Afrodite me prendeu
Oxum e seus orixás
Jogou amor, me rendeu
Eros com gestos fatais
Várias flechadas me deu.
11
Oxossi me conduziu
Pra na mata me esconder
E Silvano consentiu
Pensando em me proteger
Porém ninguém conseguiu
Abrandar o meu sofrer.
12
Nanã Buruquê Chegou
Vi ser próximo o meu fim
E Omolu confirmou
“Se é pra sofrer tanto assim
Teu martírio terminou”.
Hades se encostou em mim.
13
Tanatos Pôs-se em ação
E o plano espiritual
Escutou minha oração
Deixei o corpo carnal
São Pedro me fez menção
Sob a luz celestial.
14
Vi numa tela de cinema
Todo o meu sofrimento
Perscrutei, em cada cena
O meu triste sentimento
Chorei da penúria extrema
Do meu aniquilamento.
15
Miguel com sua balança
Chegou para mensurar
E a Mãe da Esperança
Surgiu pra me advogar
E o Senhor da Bonança
Veio a tudo comandar.
16
Eram mil arguições
E me vi sabatinado
Roguei em mil orações
Para me ver amparado
Com a Mãe das consolações
Que estava ao meu lado.
17
Porém a acusação
Era dama sem clemência
E sem comiseração
Se chamava consciência
Me acusava em presunção
Sem usar da paciência.
20
E de chofre me falou
“Foi você que quis assim
E nunca me consultou
Mergulhando em triste fim
Você mesmo se arruinou
Agora não ache ruim!”.
21
Um jovem iluminado
Nimbado por esplendor
Me falou bem delicado
“Eu sempre fui seu mentor
Não se sinta tão culpado
Nem nutra remorso e dor!”
22
Mas o que posso fazer?
Muito aflito, perguntei.
Pois que estou a temer
Tudo o que pratiquei
Aqui padeço a jazer
Morri, porque muito amei?
23
Ninguém morre por amar
Mas por amar e sofrer
Disse a me consolar
A Mãe do Doce Prazer
E me mandou confiar
Em Deus que é todo poder.
24
“Filho você quer voltar?”
Me inquiriu o Senhor.
E eu posso retornar
Meu divino Salvador?
Podemos analisar
Respondeu o Redentor.
25
Na sala secreta entraram
E a consciência ficou
Muito lá confabularam
E ela me perguntou:
“Teus amigos te pouparam
E você me desprezou?”
26
Ninguém pode desprezar
Quem é Dama soberana
Com poder de analisar
A qualquer ação humana
Não queira demonizar
Quem no coração se engana.
27
Eu sei que me enganei
Agindo como insano
Pelas trevas eu penei
Mas sei que errar é humano
Porém agora aplainei
Este remorso tirano.
28
Então quer minha amizade?
Ela feliz perguntou.
Sim, a quero de verdade
E a Consciência sentou
“Sê firme em tua vontade
Pois muito contente estou!”
29
A sala então foi aberta
Todos, assentos tomaram
Tinham a decisão certa
Eles que confabularam
Em reverência e alerta
Ao Senhor escutaram.
30
“Tua chance é permitida
Com tua consciência em paz.
Mas cuides, em tua vida
Não caíres nunca mais
Nas emoções desmedidas
Das garras do Satanás.
32
Em vigilância retornas
Porém em nova missão
Receberás outra forma
Outra cor, outra feição
Porque esta é a norma
De uma reencarnação.
33
Também te esquecerás
Do que por vivestes outrora
E depois te lembrarás
Quando for chegada a hora
Também terás novos pais
Na nova vida de agora.
34
Cairás tão pequenino
Naqueles braços que antes
Com um orgulho ferino
Te desprezaram, inconstantes
Maculando teu destino
De indiferenças frustrantes.
35
Volves na sublimação
Daquilo que era carnal
Em santa reparação
Como amor filial
Pois é esta a redenção
No Santo Amor Fraternal
Thomas Saldanha.