A reclamação do jegue
Certo dia um jegue magro
Com imensas pisaduras
Resolveu se rebelar
Devido à grande tortura
Que sofria do seu dono
E sem aguentar o sono
Disse assim pra criatura
Quero descansar um pouco
Senhor tem pena de mim
Quero um pouco de agua
E um pasto de capim
Para eu matar a sede
Capim pode não ser verde
Que comerei mesmo assim
Nessa hora aquele homem
Logo mudou o semblante
Um sujeito bem malvado
E também ignorante
Deu-lhe uma chicotada
E soltou uma risada
Com seu pensamento errante
E falou aonde um jegue
Vai me pedi pra ter pena
Pois criei esse jumento
E tratei no meu esquema
Agora vou desfrutar
Ele tem que trabalhar
Igualzinho a uma rena
Botou então a cangalha
Em cima da pisadura
Apertou bem a retranca
E silhão com muita fúria
Na boca botou a brida
E arrumou uma intriga
Mas pagou pela loucura
Pois arreando o jumento
Com a barriga apertada
Foi carregar lenha verde
Que já estava cortada
Foi carregando sem dó
E não pensou no pior
Como quem diz não fiz nada
Porém Deus defende o homem
Se ele usar a razão
Mas se estiver errado
Deus faz a condenação
E perdoa o animal
Que sem fazer nenhum mal
É tratado igual ladrão
Sentindo a carga de lenha
Verde pesada no lombo
O jumentinho magrelo
Se balançou deu um tombo
A lenha toda caiu
E nessa hora ele viu
Na crina pousar um pombo
O pombo disse que vinha
Dum lugar desconhecido
Enviado das alturas
Que também não tinha abrigo
Não sou santo nem sou réu
Mas guiado pelo céu
Vim ajudar o amigo
Então falou o jumento
Nunca na vida fui rico
Nesse cenário imundo
Eu vou e finjo que fico
Qual novela sem cenário
Sou pior que um falsário
Não chego nem a ser lixo
Eu já não aguento mais
Desse jeito ser tratado
Carregando mandioca
E lenha lá do roçado
Levar tantas cipoadas
Até cabo de enxada
No meu corpo foi quebrado
Tenho que correr de noite
Sem enxergar quase nada
Ele quer ver sua amante
Sua linda namorada
Ele usa força bruta
E com força ele cutuca
Com sua espora afiada
Vermelho fica a espora
Também o seu calcanhar
Eu sem aguentar correr
Peço a Deus pra me ajudar
Ele diz jegue safado
Bicho burro e descarado
Eu hoje vou te matar
E então com uma taca
Feita com coro curtido
Ele dá uma tacada
Que soa grande estampido
Que arde lá na ferida
Que foi feita brida
Que comprou do seu amigo
Ele monta no meu lombo
Pra correr atrás de vaca
E se perder uma res
Certamente me ataca
Marra eu lá no mourão
Com um chicote na mão
Meu dono quase me mata
O pombinho já chorando
Com aquele desabafo
Preguntou assim pro jegue
O que tu quer que eu faço
Ele disse que perdoe
Esse animal que foi
Obra de Deus de fracasso
Então o bombo também
Que sem ter nenhum valor
Convidou a pombaida
Como ele sofredor
E invadiu a nação
Do jumento seu irmão
Um coitado sofredor
O pombo sem ter poder
Falou eu faço a aposta
Sobrevoando de cima
Começou a soltar bosta
Mas sua bosta limpou
Dono do jegue acordou
E lhe fez nova proposta
O dono do jegue disse
Vou fazer reformas já
Vou mudar meu pensamento
O meu jeito de pensar
Vou fazer um pac novo
Vou cuidar bem do meu povo
Meu jeguinho vou amar
Mas os pobinhos nervosos
Vão fazer muita sujeira
Estão enchendo seus papos
Para soltar na quinta feira
e eu tenho confiança
que vai ter novas mudanças
no pais da robalheira
Também de minha parte eu me rirei na vossa perdição e zombarei, em vindo o vosso temor.
Provérbios 1:26