MINHA MÃE E O FLAMBOIÃ.
Guando falo me emociono
É como me envolver no sono
Que se sonha de manhã
Um sonho bem comovente
De minha mãe e a semente
De um pé de flamboiã.
Recebeu como presente
A muda de flamboiã
A plantinha muito pequena
Como folha de ortelã
Era pela dona regado
Todo dia de manhã.
O seu zelo era constante
Pois todo dia notava
Que a plantinha crescia
Toda vez que agoava
Brotando pequenas folhas
Que dos seus galhos vingava.
Quanto mais ela crescia
Deixava minha mãe vaidosa
E comentava fagueira
Como quem faz uma prosa
Não vejo a hora Ebenézer
De vê-la arvore frondosa.
Eu logo pude notar
Do carinho especial
E tratei de levar a plantinha
Para um lugar ideal
Para crescer ao ar livre
Plantei ela no quintal.
E no quintal foi crescendo
Como uma moça farceira
Vestida de verde e vermelho
Visosa e altaneira
Antes apenas metade
Agora flamboiã inteira.
O tempo foi se passando
O flamboiã ganhando espaço
Sua copa fazia sombra sombra
Chegando junto ao terraço
Com a dedicação de sua dona
Sem se emportar com o cansaço.
Ao chegar a primavera
Nas noites claras de lua
Orgulhosa e admirada
Da sua beleza mais crua
Lhe comparava a um principe
Das árvores daquela rua.
O flamboiã majestoso
Parecia entender
O que sua dona dizia
Guando ia lhe ver
Exibindo cachos floridos
Querendo lhe oferecer.
Chegando morna a tardinha
Com o sol se pondo na barra
Ben-te-vis e sábias
Em seus galhos faziam farra
E no tronco do flamboiã
Cantava alto a cigarra.
Mais uma doença cruel
Com aguilhões tiranos
feriu seu corpo de pássaro
Envolto em alguns panos
Cravando-lhe o mal fatal
Aos oitenta e tres anos.
Chorando com dor no peito
Que só mesmo um filho tem
Me escondi no flamboiã
Me sentindo só sem ninguém
Suas folhas caiam aos poucos
Parecia chorar também.
O flamboiã grande copado
Entendia o que se passava
Com sua dona querida
Que sempre o agoava
E agora fraquinha no leito
Somente as lágrimas o regava.
Nem sábias nem pardais
Cantavam alegrimente
Nos galhos do flamboiã
Nas tardes de sol poente
Só se ouvia a cigarra
Dar um apito dolente.
E em uma tarde de julho
A vida fez seu papel
O Pai que tudo conhece
Cobriu sua alma com o veu
Levou minha mãe pra regar
Outros flambiãs no ceu.
E desse dia em diante
O flamboiã foi minguando
Os cachos não mais floriam
Os galhos foram secando
Parecia sofrer de saudades
Com sua dona faltando.
Fui vendo com muita tristeza
Carregado de muita emoção
O vento levar suas folhas
Doia no coração
Ouvir o estalar dos galhos
Aos pedaços caindo no chão.
Morreu a dona do flamboiã
Não morreu a lembrança que me envade
Morreu o flamboiã florido
Não morreu o brilho dessa verdade
Morreu quen tanto amor regou
Não morreu minha eterna saudade.
Guando o pano da tarde se estende
O sol faz seu bordado lá no fim
Parece que escuto ela dizer
Com seu jeito meigo me dizendo assim
Filho, continuo te regando
Nem a morte separou você de mim.
A minha saudade ainda ver
A alegria em sentelhas
Nos olhos da minha mãe
Tão doce como mel das abelhas
Olhando para o seu flamboiã
Iluminado de flores vermelhas
Um portal lindo no ceu se abriu
Com luzes de uma manhã
Repleto de suavidade
Como a mais pura lã
Pra receber dona Celina
A dona do flamboiã.