Sinto-me honrado por ser nordestino.

Amo a terra que nasci

E tudo que tem por lá

Pegar cascudo na lama

E pitu no munzuá

Lembro de noite e de dia

Coração ta na Bahia

Porem meu corpo ta cá

Não sei se vivo eu ainda

Retornarei à Bahia

Mas ta no meu coração

Lembro todo santo dia

Quando pai dizia assim

Nós vai pra itamarim

Antes de raiar o dia

Três horas da madrugada

Pai pegava a ferramenta

Uma cangalha pro jegue

Uma cela pra jumenta

Arriava os animais

Dizia hoje nós vai

Vender farinha e pimenta

Pai com o dedo na testa

Fazia o sinal da cruz

Com o joelho no chão

Agradecia a Jesus

Mãe saia no terreiro

E dizia meu guerreiro

Meu Deus será tua luz

Pai me botava na sela

Daquela jega mansinha

Botava a carga no jegue

De pimenta e de farinha

Pai rezava pra Jesus

Nos guiar e ser a luz

Até aquela feirinha

Quando chegava à feira

Pai a Deus agradecia

Pai já tinha freguês certo

Que comprava todo dia

Porque pai honestamente

Não enganava o cliente

Sempre a verdade dizia

Pai vendia rapidinho

A pimenta e a farinha

Os dois jumentos marrados

Num mourão que ali tinha

Pai contava toda renda

E entrava numa venda

Pra tomar uma pinguinha

Um copo de destilada

Virava duma só vez

Pagava todo fiado

Que comprou durante o mês

Depois de novo comprava

O vendedor confiava

Pois pai era bom freguês.

O que nós tinha na roça

Não precisava comprar

Era só o querosene

E o fumo pra mascar

Soda pra fazer sabão

Bolacha biscoito e pão

E anzol pra nós pescá

Quando lembro fico triste

E sinto grande emoção

Vejo mãe preocupada

De pé em frente ao fogão

Eu esperando do lado

E pai no banco sentado

Com candeeiro na mão

Lembro quando ela ia

Pegar coentro no quintal

Dentro do machucador

Misturava com o sal

Para botar na comida

Nunca mais comi na vida

Uma comidinha igual

Vejo ela trabalhando

La na roça de cacau

Quebrando milho verdinho

Depois fazendo curau

Eu garanto pra você

Que em sonho posso ver

Mae viva e muito real

Lembro-me quando mãe ia

A um ninho de galinha

Pegava ovos quentinhos

Que em baixo dela tinha

Fritava numa panela

Aquela gema amarela

Ô vida boa era a minha

Mas sei que é só lembrança

De uma vida passada

Quando acordo fico triste

Dentro da minha morada

Sei que sonho é ilusão

Salvo na recordação

Ficção descontrolada.

Lembro de mãe gaguejando

De madrugada bem cedo

Reclamando com um filho

Que chegou da venda bebo

Que ficava se benzendo

Com suas pernas tremendo

Quase morrendo de medo

Ouço o barulho da roupa

Quando na tabua batia

Esfregava as encardidas

Logo se desencardia

E no quarador botava

Mas o resto que sobrava

Lavava no outro dia

Então pegava a gamela

Toda feita de madeira

Punha em cima da rodilha

Então subia a ladeira

Ia assoprar o fogão

Pra cozinhar o feijão

Que pai trazia da feira.

Então com muito carinho

Mãe colocava feijão

Depois botava farinha

E amassava cá mão

Pra mim era um bom consolo

Quando mãe fazia um bolo

E dizia, come jão

Mas quando não tinha arroz

Nem feijão pra cozinhar

Mãe pegava um litro d’agua

Botava pra esquentar

Pra escaldar a farinha

Ô comida gostosinha

Bem melhor que caviar

Foi com papa de banana

Que mãe sustentou a gente

Engrossante de maisena

Feita num fogo bem quente

E pirão bem escaldado

Que mãe fazia com caldo

Feito na agua fervente

São detalhes que a mente

Tema em não esquecer

Se hoje eu como picanha

Posso provar pra você

Que quando eu era novo

Comi farinha com ovo

E carne de saruê

Lembro de pai trabalhando

Pois era um grande artesão

Talhava coxo de cedro

Também fazia caixão

Fazia ação de cangalha

Se minha mente não falha

Fazia até alçapão

Com sucupira ou peroba

Ou qualquer madeira dura

Com a enxó afiada

E a mente bem segura

Pai esculpia um pilão

A mais pura perfeição

Coisa da nossa cultura

Mas de nada adiantava

Ter um perfeito pilão

Se pai não tivesse o dom

De fazer também a mão

Porém hoje é passado

Ficou tudo empoeirado

Na minha recordação

Porque pra pilar arroz

Também nosso cafezinho

A castanha pra paçoca

E o milho bem fininho

Devido à evolução

Não se usa, mas pilão.

Faz-se tudo num moinho

O progresso é muito bom

Mas não é original

É igual fazer bom, bom.

E depois colocar sal

Tirar o gume da foice

Ou qualquer homem dar coice

Imitando um animal

Por isso tenho saudade

Quando amolava o facão

Pra cortar vara comprida

Pra encaibrar o podão

Para podar bananeira

Pra da cacho de primeira

No inverno ou no verão.

Hoje é só recordação

Que me traz grande alegria

Saber que mãe ta no céu

E que pai ta na Bahia

Eu na lutando pela vida

Tendo de Deus a guarida

Dia e noite, noite e dia.

"Feliz do homem que encontrou a sabedoria, daquele que adquiriu a inteligência", (Prov.3vs 13.)

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Enviado por joãocorin em 13/02/2013
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