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MOÇA ROUBADA, xilogravura de
J. Borges
MOÇA ROUBADA
Com toda a modernidade,
os modos lá do sertão
são totalmente diversos
dos que na cidade estão:
aqui se tem muita folga,
no interior não há, não.
No sertão, feia mocinha
sai caro, sendo roubada.
Oferecida, não casa,
ou casa e não se vê nada;
agora, roubar donzela
é ter a coisa capada.
Moça roubada, à garupa
de bom cavalo alazão,
com seu príncipe encantado,
vai viver grande paixão,
em castelo além, distante,
desses tabus do sertão.
Mulher, aqui, na cidade,
ninguém rouba, nem de graça,
por conta da modernice,
que não é por liberdade.
No sertão, o caso vira
é bafafá, de verdade.
Num ermo lugar distante,
das bandas do Cariri,
um sujeito topetudo
levou mocinha dali.
Aí se encrencou todinho,
depois ficou sem pipi.
O pai da moça, jagunço,
fez no rapaz capação;
o peste pegou dez quilos,
deixou de ser garanhão.
Mas, no fim de nove meses,
foi nascido um meninão.
Deu-se no Sertão Central,
fato assim, com um citadino:
o rapaz roubou a moça,
também ficou sem pepino.
Dizem que virou bojudo,
perdeu a pose o grã-fino.
O povo, em toda cidade,
faz criancinha a locé,
copula sem proteger-se,
faz amor sem tomar pé,
num abrir-fechar de olho,
no jantar ou no café.
Pois, no sertão, diferente,
um moço, de lá, pondera;
namora até quinze anos
e dorme em seu pé de espera,
quando não leva a donzela,
por mais que seja sincera.
Na cidade, roubar moça
quem o faz de besta passa,
até porque não dá bode,
não é fraude nem trapaça,
não perde nenhum pedaço
e os amores são de graça.
Para fechar esse papo,
roubar moça, no sertão,
já foi morar no perigo.
Hoje, menos, mas, então,
melhor é tomar juízo
– pode perder o ferrão.
A esta altura, sem medo,
uma opinião, que grita:
podia perder-me as partes,
mas roubar moça bonita,
para mim, questão honrosa,
eis vontade que me habita.
Fort., 26/01/2013.
MOÇA ROUBADA, xilogravura de
J. Borges
MOÇA ROUBADA
Com toda a modernidade,
os modos lá do sertão
são totalmente diversos
dos que na cidade estão:
aqui se tem muita folga,
no interior não há, não.
No sertão, feia mocinha
sai caro, sendo roubada.
Oferecida, não casa,
ou casa e não se vê nada;
agora, roubar donzela
é ter a coisa capada.
Moça roubada, à garupa
de bom cavalo alazão,
com seu príncipe encantado,
vai viver grande paixão,
em castelo além, distante,
desses tabus do sertão.
Mulher, aqui, na cidade,
ninguém rouba, nem de graça,
por conta da modernice,
que não é por liberdade.
No sertão, o caso vira
é bafafá, de verdade.
Num ermo lugar distante,
das bandas do Cariri,
um sujeito topetudo
levou mocinha dali.
Aí se encrencou todinho,
depois ficou sem pipi.
O pai da moça, jagunço,
fez no rapaz capação;
o peste pegou dez quilos,
deixou de ser garanhão.
Mas, no fim de nove meses,
foi nascido um meninão.
Deu-se no Sertão Central,
fato assim, com um citadino:
o rapaz roubou a moça,
também ficou sem pepino.
Dizem que virou bojudo,
perdeu a pose o grã-fino.
O povo, em toda cidade,
faz criancinha a locé,
copula sem proteger-se,
faz amor sem tomar pé,
num abrir-fechar de olho,
no jantar ou no café.
Pois, no sertão, diferente,
um moço, de lá, pondera;
namora até quinze anos
e dorme em seu pé de espera,
quando não leva a donzela,
por mais que seja sincera.
Na cidade, roubar moça
quem o faz de besta passa,
até porque não dá bode,
não é fraude nem trapaça,
não perde nenhum pedaço
e os amores são de graça.
Para fechar esse papo,
roubar moça, no sertão,
já foi morar no perigo.
Hoje, menos, mas, então,
melhor é tomar juízo
– pode perder o ferrão.
A esta altura, sem medo,
uma opinião, que grita:
podia perder-me as partes,
mas roubar moça bonita,
para mim, questão honrosa,
eis vontade que me habita.
Fort., 26/01/2013.