A Feira de São Cristóvão

Nascido lá na caatinga

Do sertão do Ceará

Onde logo à manhãzinha

Canta alegre o sabiá

Com o canto do rouxinol

Antes de nascer o sol

Costumo me levantar

Ouço o bem-te-vi piá

No olho do juazeiro

E as galinhas animada

Vêm descendo do puleiro

Um caburé animado

Canta despreocupado

No galho do cajazeiro.

O sol nascendo vermelho

Feito brasa incandescente

O céu azul, cintilante

Sem a chuva no nascente

Fico meio desanimado

Um pouco preocupado

Com esse sertão tão quente

Me despeço de minha gente

E de meu velho torrão

Parto em direção ao Sul

Cheio de sonho e ilusão

Deixo a terra decidido

Com meu coração partido

Abandono meu sertão

Já entregue à solidão

Aporto em terra estrangeira

Em meio ao desconhecido

Num dia de segunda-feira

Cheguei a um pavilhão

Com minha mala na mão

Minha única companheira

Aqui sem eira nem beira

Cheguei para trabalhar

Me enfiei numa obra

Sem hora pra terminar

Mas não reclamo da sorte

Por isso deixei o Norte

Minha sorte vou tentar

Já no final de semana

Descobri a brincadeira

Pois naquele pavilhão

Havia uma famosa feira

Havia forró e cachaça

Muita pompa e muita graça

E brinquei a noite inteira

Naquela noite faceira

Bebi e curti à vontade

Descobri a alegria

Que tinha naquela cidade

Nesse pedaço de chão

Encontrei o meu sertão

E ali chorei de saudade

E pra falar a verdade

Todo final de semana

Separava meu dinheiro

Pra curtir a minha cana

E pra meu forró dançar

Pra sorrir e namorar

Naquela feira bacana

Lá eu conheci Santana

Uma morena animada

E dentro de pouco tempo

Era minha namorada

E nunca mais fiquei só

Passei a curtir forró

Eita, que vida animada!

E não me faltava nada

Tinha forró e baião

Rapadura e carne-seca

Mel de abelha e feijão

Tinha queijo e tinha bolo

Cachaça e fumo de rolo

E farofa de pilão

Parecia o meu sertão

Aquela feira animada

A feira dos paraíbas

Como era ela chamada

Tinha tudo o que eu queria

Tinha festa e alegria

Mi’a segunda morada

De fineza não tinha nada

Mas todo mundo gostava

Quem chegava de mansinho

Por ali logo ficava

Encontrava um conhecido

E do seu torrão querido

Logo, logo alguém falava

E a conversa esticava

Começava a bebedeira

Lamentando a saudade

Caia na brincadeira

O conterrâneo animado

Com uma caboca grudado

Só saia no fim da feira

Com a mulata faceira

Ali debaixo da lona

Ao som de uma viola

O amor pegava carona

Comendo uma tapioca

Carne seca e mandioca

Ao som de uma sanfona

Com a sua nova dona

O nordestino sorria

Chegava à boca da noite

Só saía no outro dia

Passava a noite acordado

Bebendo, alegre, animado

Ouvindo uma cantoria

Mas a feira de hoje em dia

Já é muito diferente

Não é mais a mesma coisa

Que era antigamente

Com a tal globalização

Expulsaram o meu sertão

Do meio de nossa gente

A coisa agora é pra frente

Barraca já não tem mais

Agora é bem diferente

Daqueles tempos atrás

Restaurante organizado

Com ar-condicionado

Encanta moça e rapaz

Hoje em dia já não se faz

O que na feira fazia

Agora parece um shopping

Não tem a mesma alegria

Tem gringo falando inglês

Italiano e francês

Acabou-se aqueles dia

Quando alguém se senta à mesa

Vem um garçom arrumado

Para tirar seu pedido

De jeito bem educado

Falando todo bonito

E com meu jeito esquisito

Fico todo envergonhado

Até a nossa cantoria

De modinha e vaquejada

É nu’a modesta pracinha

Espaço de quase nada

E o pobre cantador

Já não tem mais o valor

Daquela feira passada

A nossa história sagrada

Está desaparecendo

Tudo se modernizando

E o povo vai se esquecendo

A cultura do Nordeste

Do homem cabra da peste

Aos poucos tá padecendo

Poeta do Riacho
Enviado por Poeta do Riacho em 11/03/2007
Código do texto: T408695