INFELIZ
Você que é curioso
E fuçou este papel
Vai conhecer minha história
Transcrita neste cordel
Composta de sofrimento
Cujo trajeto, eu lamento
Só teve o gosto de fel
Abaixo do firmamento
Eu desconheço outro igual
Que tenha sofrido tanto
Na história universal
Aliás, penso em Jesus
Que foi pregado na cruz
Sofreu mais que um animal
No dia em que eu nasci
Minha mãe quase morreu
As dores do parto foram
O melhor que aconteceu
Das cinco horas no mato
Lutando pra ter um parto
Éramos somente ela e eu
Com muita dificuldade
Escapei, fiquei menino
Além de doente e magro
Com andar de beduíno
Passava o dia na rede
Com fome, passando sede
Sem reclamar do destino
Com as mazelas somadas
Aos vinte anos cheguei
Vou confessar, com vergonha
Com mulher nunca transei
Porém o pai de chiqueiro
Não gostava do roceiro
Com ciúmes, disso eu sei
Fui arrimo de família
Sou filho de mãe solteira
Que era muito vaidosa
Corrida na ribanceira
Cobrava pra se deitar
Bastava o cabra pagar
Namorava a noite inteira
Fiz do cabo da enxada
Do meu braço, uma extensão
Trabalhava dia e noite
Nunca sobrou um tostão
Aí larguei o roçado
Comecei a roubar gado
E cavalo no sertão
Dessa vida criminosa
Acumulei muita peia
Sujei o meu sobrenome
Desgracei a minha aldeia
Local de um povo manso
E hoje fazendo um balanço
Eu só consegui cadeia