Nem é oito nem oitenta... Autor: Damião Metamorfose.

*

Não sou oito nem oitenta,

Não sou jovem nem senhor.

Tentei ser flor sem espinho,

Virei espinho sem flor.

E agora eu faço o quê?

Se nem sou eu nem você,

Nem ferro e nem isopor!

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Da fruta eu quis o sabor,

A vida eu tentei modesta.

As aves comeram a fruta,

E por isso o que me resta

Todas as vezes que passo

A arvore joga o bagaço

Da fruta na minha testa!

*

Vivi meus dias de festa

Que Deus me presenteou.

E esqueci-me de viver

A fase melhor que estou.

Do jeito que a coisa vai

Vou ser avô sem ser pai

E esquecer quem eu sou!

*

Meu silêncio extravasou...

Se aprece estou apressado.

Vou tentar seguir em frente,

Mesmo estando enviesado.

Se vai ou não eu não sei,

Só sei que sei que tentei

Olhar a frente de lado!

*

Quero chegar atrasado,

Passar um natal em Meca.

Fazer cama para o cristo

Redentor tirar soneca.

Pra provar que sou feliz

Vou gritar bem alto, bis!

Eu me descobri, heureca!

*

Santa levada da breca,

Eu conheço mais de cem.

Santo sem reza e fieis

Em vez dos dois, tem arem.

E eu num canto calado

Remoendo o meu pecado

Doido Pra ser um também!

*

Retorno de quem não vem,

Motor turbo em Chevette.

Criança com esquecimento,

Idoso pintando o sete.

Sutiã de oriental,

Praia sem água e sem sal

Mesa de bar sem chiclete...

*

Meia, inteira, soquete...

Louco que é ajuizado.

Presente que é futuro,

Futuro que é passado.

Jogo de azar que dá sorte,

A vida a beira da morte,

Patrão que escuta o criado!

*

Mal criado respeitado,

Ladeira que sobe e desce.

Pólvora que não acende,

Fogo que não se aquece.

Pastor que não tem ovelha,

Olho nu sem sobrancelha,

Lembrança que sempre esquece!

*

Força que não fortalece,

Amor que é indiferente.

Álibi que denuncia

E aponta o delinquente.

Sem uma vida em ação,

Manifesto multidão...

Na solidão permanente!

*

Lado de traz é a frente,

O dentro fica pra fora.

A frente fica pro lado

Do lado que se ignora.

Vou levantar sem cair,

Chegar sem ter que sair,

Voltar sem ter ido embora!

*

Frio e calor numa hora,

Quatro estações num dia.

Devagar eu chego ao longe

Meu tataravô dizia.

Beba água em pó mato sede,

Saio da cama pra rede

Mais que isso é covardia!

*

Sujo com assepsia,

Perua que é sem chilique.

Brega não é popular,

O popular que é chique.

Coisa boa que não presta,

Calvo com franja na testa

Careca que usa aplique!

*

Cego acessa e dá clique

E assiste televisão...

E diz que vê colorido

E em terceira dimensão.

Meu Deus do céu, nesta idade...

Eu faltar com a verdade?

É mentira, falto não!

*

Casa solta sem oitão,

Baralho que não tem cartas.

Mesas pobres com farturas

E ricas que não são fartas.

Daqui que não é daqui,

Dalí que não é Dalí,

Semanas que não tem quartas!

*

Coisas boas que descartas,

Simples muito complicado.

Macho com eme maiúsculo,

Moderno e com rebolado.

Escutei essa toada,

Não estou contando nada

Que tu não tenhas contado!

*

Cão que ladra com miado,

Nuvens que tocam o chão.

Ateu que é padre e pastor

Padre e pastor que é pagão.

Sol gelado e lua quente,

Careca que usa pente

Pra pentear o franjão!

*

Cigano que é ganjão

E faz trabalhos pesados.

Pobre que conta trilhões,

Rico que conta trocados.

E um poeta que não sabe

Onde comece ou acabe

A oração da toada!

*

Igreja amaldiçoada,

Missa sem padre e sermão,

Política sem mentiras,

Comício e enrolação...

Doido que é ajuizado,

Normal desequilibrado,

Sela em cavalo do cão!

*

Peixe que não dá pirão,

Nordeste sem vaquejadas.

Centro Oeste na divisa

Dos quinto e tabuas lascadas.

Rio de Janeiro sem morro

Lamento sem ter socorro

Enchente sem enxurradas!

*

Bruxas e fadas safadas...

Coisa que mata e que cura.

Círculos em linhas retas,

Ponte aguda que não fura.

Coisa boa que não presta,

Mata que não é floresta

Vá pro cão quem desconjura!

*

Mistura que não mistura,

Que não ata nem desata.

Social meio esportivo,

De short, tênis, gravata...

Casa em morro de areia,

Graciosa que é feia,

Casa feita sem sapata!

*

De origem boa, pirata,

Bom que sempre foi ruim.

A parte que não me cabe,

Mas antes cabia a mim.

Uma semana sem dias,

Rima e versos sem poesias,

Não que não é não nem sim!

*

Taba sem ter curumim,

Praia doce no oceano.

Circo sem pano de roda,

Pano de roda sem pano.

Calmo levado da breca,

Macho virando boneca,

Água que não entra em cano!

*

Gato que não é bichano,

Pé que pisa sem ter planta.

Galo que não tem terreiro

Não tem galinha e nem canta.

Eita que fome danada,

Não como por ser enxada,

Mas dá água na garganta!

*

Casa sem almoço e janta,

Patrão sem ter empregado.

Empregado sem emprego,

Ladrão sem nada roubado.

Seca com chuva seis meses

Ano sem ter doze meses,

Veloz que vive parado!

*

Fim

Damião Metamorfose
Enviado por Damião Metamorfose em 05/11/2012
Código do texto: T3969937
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