Eu sou de um tempo que... Autor: Damião Metamorfose.

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Eu sou do tempo que o tempo

Passava bem devagar.

Do tempo que eu tinha tempo

Pra vê o tempo passar

Hoje eu sinto nostalgia

Do tempo que eu podia

Ter tempo para sonhar!

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O trem pra se viajar

Era a vapora, “água e lenha”

No meu tempo a mulher grávida,

Era embuchada ou prenha...

E um jornal bem editado,

Tinha um nome respeitado

E era chamado: resenha!

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O namoro lá da “brenha”

Tinha o pai e a mãe no meio.

Os pais da moça é claro

E mesmo nesse aperreio.

Eles arrumavam um tempo

E casavam a contratempo,

Com a noiva de tanque cheio!

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O horário do recreio

Era pra descontração.

E pra alumiar a casa

Usa-se um lampião.

A festa era cantoria...

E a missão a gente ia

Pra ouvir frei Damião!

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Quando se falava oitão

Era a lateral da casa.

Tempo que azarar mulher

Era arrastar a asa.

E a calça de tergal,

Terilene, tropical...

Se engomava em ferro a brasa!

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Eira e beira de uma casa,

Era a classificação.

De quem era rico ou nobre

Ou pobre sem um tostão.

Hoje tudo está mudado,

Tudo junto e misturado,

Ninguém usa mais brasão!

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Casal, família, união...

Era uma coisa sagrada.

Ele era respeitado

E ela era respeitada.

Hoje mudou, tanto faz,

Moça,menino, rapaz...

A coisa está liberada!

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Sair para uma caçada

Era pra pegar veados

E outros bichos ruminantes

Que dava pra ser caçados.

Depois da devastação,

Só quem cai nessa armação,

São os tais... Domesticados!

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Os ricos e os abastados

Eram os que tinham dinheiro.

Porém só batava o básico,

Pra ser feliz por inteiro.

Com o mundo globalizado,

Quase tudo está mudado

Feliz é ser o primeiro!

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Casa com um bom banheiro

Não era pra todo mundo.

Tevê era em preto e branco,

Chaplin ilustre vagabundo.

No meu tempo um palavrão

Rendia surra pra não

Ter vocabulário imundo!

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No calabouço mais fundo

Puniam-se os delinquentes.

Porque era olho por olho

E também dentes por dentes.

Hoje está bem melhor

Porém já foi bem pior

Morreu tantos inocentes!

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No meu tempo o pai da gente

Mandava e ia ligeiro.

Hoje quem quiser que faça

E tem que ser por dinheiro.

Ninguém faz nada de graça

E assim o tempo passa

Feito nuvem ou nevoeiro!

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Sou do tempo do cruzeiro,

E do famoso cruzado

Que me acertou em cheio

E eu fui nocauteado.

Eu tinha quase um milhão

E acordei com cinquentão...

Mais não era liberado!

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Quem vivia do roçado

Tinha por obrigação.

Milho, fava e gergelim,

Feijão de corda, algodão...

Sem tempo não se estudava

E a gente só trabalhava

Sem folga e sem diversão!

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Chamar senhor, um ancião,

Hoje quase ninguém chama.

A educação mudou

De tudo o filho reclama.

Sou tempo que a criança

Sonhava com a esperança,

Independente da cama!

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Naquele tempo o IBAMA

Assustava o infrator.

Hoje nem com altas multas

Ou com um torturador...

Incomoda essa cambada

Que mantém ave trancada

Só por ter alto valor

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Sou do tempo que o senhor

Do cacau, é da Bahia.

Política café com leite

No Sudeste se fazia.

E um fio de cabelo

De bigode era um apelo

De honra a cidadania...!

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O jogo com um tapia

Era um golpe preferido

E o político safado.

Ficava sempre escondido.

Hoje existe a trambicagem,

Mas com a moderna sondagem

Vez enquanto um é punido!

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O assaltante ou bandido,

Pena leve ou violento.

Pagava pelo seu crime

Com a morte ou sofrimento.

Coronéis ou cangaceiro

Profissional pistoleiro...

É que dava o julgamento!

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Sou do tempo que o jumento

Como disse o Gonzagão...

Era um meio de transporte

Resistente, herói, irmão...

Hoje o jumento, coitado,

Por carros é esmagado,

Nosso herói virou vilão!

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Ter um médico de plantão

Era uma novidade.

E eles eram mais famosos

Que o prefeito da cidade.

Hoje em toda esquina tem

Um que atende, mal ou bem,

Melhorou muito, é verdade!

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Rico não tinha um milhão

No tempo dos coronéis.

Tinha bois, tinha fazendas...

Tostões, cruzados e réis.

Os ciclos de amizades

Seja nos sitio ou cidades,

Eram muito mais fieis!

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No meu tempo era em tonéis

Que a boa pinga vinha

E era muito mais forte

Que chá de folha de “pinha”

E o mais famoso ditado

Que no meu tempo era usado

Era: ”é pior que a tinha”

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A plebéia ou a rainha

Casava sempre donzela.

Com pobre ou milionário

Os sonhos de Cinderela...

Era um amor de verdade,

A honra e a fidelidade

Pra vida inteira com ela!

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O cobertor era aquela

Pesada tanga de rede.

E o ventilador de pobre...

Bater com o pé na parede.

Na cabaça ou na quartinha,

Pote na sala ou cozinha,

Era onde eu matava a sede!

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Os dizeres: cadê-quede?

Era a pergunta primeira

Quando um ficava surpreso

Com alguma brincadeira.

Naquele tempo era assim,

“Éramos tupiniquim”

Que honrava a nossa bandeira!

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Naquele tempo, algibeira

Era o que hoje é a porchete.

O comprimido de hoje,

Nós chamava de cachete.

E a moto mais potente

Que eu vi antigamente

Era a tal da leonete!

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Sutiã era corpete,

Coisa ruim era o capeta

A arma que pobre tinha

Em casa era a de espoleta.

O boné não existia

E o chapéu que mais se via

Era de massa ou vaqueta!

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Brincar com uma carrapeta

Era coisa pra menino.

Ouvir nossos pais contando

Estórias de Virgulino...

Era comum nas noitadas

Nos alpendres e latadas

Nos casebres nordestino!

*

No meu tempo o Jesuino

Brilhante, era cangaceiro

No Rio Grande do Norte

Em Patu, seu berço herdeiro.

E a fama do garanhão,

“Hobin Hood do Sertão”

Por ser sempre um justiceiro!

*

Sou do tempo que o terreiro

Não era macumba não.

Era a extensão da casa,

Na frente, ao lado o oitão.

Hoje com a modernidade,

Tem “terreiro” da maldade

Que bebe o sangue do irmão!

*

Eu dou do tempo que o pão

Era menos indigesto.

Que a mesa era mais farta

E se tinha menos resto.

Os tempos são desiguais

Se vão e não voltam mais,

Mas registrei meu protesto!

*

Fim.

Damião Metamorfose
Enviado por Damião Metamorfose em 02/10/2012
Código do texto: T3912610
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