CONVERSA DE MATUTO
(Diálogo de dois homens rudes do campo.
personagens fictícias:Cipriano e Zé Loló)
Cipriano para Zé Loló:
- Zé Loló meu véio amigo, tá chegano nosso alivo
Esse ano tem inleição, tempo bom pra nói chegô
Lá in casa inté incostô, um tá de mané filiço,
E me dixe qui seu ofiço, é arrumar inleitô
Me dixe qui seu candidato, é home sero no trato
E nói pode cumfiar, quano a vitora aicançar
Ele armenta nosso quinhão...
Basta só qui eu agaranta, o meu voto,
o da Constança, do Sivirino e Armano,
Qui nói vai tá nos seus prano, adispoi das inleição
Seu candidato falou e filiço assina in baxo,
Qui o pessoá do mato, esse ano lava a égua
Confoime o filiço falou, esse dotô tem valor
Prá todos nói se amostrou, ser um candidato paidégua
Já tô fazeno meus prano, cuma vai ser para o ano
Quando nói a receber e finarmente nói ter
Nossa parte no acordo...
Tiro meu burro do aperreio, vou comprar um novo arreio,
Pago o que devo na praça, compro uma nuvia de vaca
E prá nói um rádio novo
Zé Loló já tô gostano, do dotô meu candidato
Antes mermo do contato, só pelo que dixe o filiço
E nem qui a dispesa eu banque, vou me atrepar no palanque
E prá provar meu arranque, vou discussá no comiço
Te juro qui nessa campanha, vou regassá minhas manga,
A percura de inleitor
Vou fazer força medonha, poi essa é minha missão
Vou sair cum a Constança, visitano a visiança,Parentes e coincidos
E prá mostrar qui sou ativo, viisito inté meu patrão
Já pensei in pidir voto, pro Clove fio do Óto,
Prá Guilermina e Sufia, pro zé ligêro e pro Lôro,
Prá Caimozina e seu noivo...
E prá firmar minha campanha, nos fim de cada sumana
Eu visito tudo de novo
As coisas andano na tria, eu e minha famia
E toda essa friguisia, num vai ter o qui recramar
É só nói cumprir o trato, eleger nosso candidato,
Qui pra esse pessoá do mato, a coisa vai amiorá
Zé Loló, para Cipriano:
- meu amigo Cipriano, uví todos seus prano
Mai salvo aqui meus ingano, já exprementei desse prato
Esse assunto não me interessa, vou é pegá ôto ataio
Morro de fome e num caio, in cunversa de canidato
Muito admiro varmicê, sujeito qui sempre diz ser
Esperto e muito artêro...
Tá cum a memora tapada, cumpade vá se aquetá
Você facim caiu na lábia, desse cabo inleitorá
Meu amigo Cipriano, tome tento, tome prano
Num vê qui esse fulano, encheu suas venta de fôia
Num saboreie esse prato, nói anda irriba do rasto
Inquanto esses canidato, eles num anda, avôa
Num vá inludir sua famia, cum essas farças premessa
Desse dotô qui se isconde, atrás de um nêgo manto
Cumpade mude de tria, pói já falava minha tia,
Minha Vó tumém dizia:
Quem veve de premessa é santo
Varmicê num é cuma eu, sofreu, mai num aprendeu
Tome um conceio de amigo:
Faça a coisa deferente ! Por deus num cumpra esse trato
Se vingue na mão de gato, traia esse canidato,
É isso que eles faz cum a gente!
Há muito num sou mai bêsta, de botá dotô prá riba
Derde qui a dicipção, me abriu uma firida,
Me a provocano o meu pranto
Pói nem qui eu coma só farinha e more sempre im paióça,
Eu posso inté cumê bosta, mai minha famia só vota,
É num tá de dotô branco.
N o t a 1 : No dia em que o nosso povo pensar igual a Zé Loló, mesmo não sendo tão radical quanto ele, nossos candidatos
terão mais coerência com relação ao que falam e que realizam quando eleitos e tratarão com mais respeito a coisa pública
enquanto isso não acontece, poetas como eu, seguem escrevendo utopias presentes, com desejos de que venham a ser uma realidade futura, para a melhoria de vida dos que como eu, hoje sonham! No momento, é só o que nos resta...
Apenas, sonhar!
Nota 2 – Este texto foi inspirado em outro do mesmo estilo, criação do nosso poeta maior: “Patativa do Assaré”, que considero o maior poeta de cordel a escrever versos de cunho social sertanejo. O mundo do cordel, tem uma dívida incalculável com “O Patativa”, por tudo o que Ele produziu em benefício do nosso caboclo nordestino e da própria literatura.
O Autor.