Faltou luz no interior
I
A vida no interior
Deve ser muito estudada
O povo é bem diferente
Do de cidade centralizada
No que come e no que veste
É igual em quase nada
II
Aqui em Serra da Raiz
Como em todo interior
Tem fofoca, bebo, corno
Fazendeiro chamado doutor
Mulé viçando por macho
Pirrai de recado e favor
III
Uma coisa interessante
Que me chamava muita atenção
Era a falta de luz à noite
Também chamado apagão
Um fato misterioso
Que nunca se sabia a razão
IV
Quando era pequeno eu lembro
Quando faltava energia
Era um aperreio danado
Olhe, pense numa agonia
Queria ver desmantelo
Se fosse de noite invés de dia
V
Todo mundo tava reunido
Na sala assistindo a novela
Quando tudo de vez escurece
E a mãe dizia: Pega a vela
Então saia o mais corajoso
De fininho e com cautela
VI
Os menino começava a chorar
Sem saber o que fazer
Com medo de assombração
Começava tudo a tremer
“O bicho vai me pegar
É hoje qu’eu vou morrer”
VII
A mãe segurando a ruma dizia:
Meu fi, deixe de besteira
Levante e vá correndo
Desligar a geladeira.
O menino saia se pelando
Topando pelas cadeiras
VIII
Pega o ‘fosco’, acende a vela
Deixa três pingo pingar
Numa lata, num prato ou no chão
Pra não cair e se apagar
Ou até que Deus’ó livre
Nossa casa incendiar
IX
Quando tudo tava controlado
Ainda tinha o que fazer
Vamos ligar pra SAELPA
Pro problema vir resolver
Se não as comida azeda
E amanhã não tem TV
X
Saía o mói pro orelhão
Chega ia tudo feliz
O mais velho então quem liga
Quando a moça atende ele diz:
"Dona, ta faltando luz
Aqui em Serra da Raiz".
XI
Não faltando nada fazer
Agora era só esperar
Sentar na calçada e ver
Os homi da luz chegar
Enquanto os matuto ia
Com os frachilete a passar
XII
Quando os homi então chegava
Era aquela animação
“Se voltar luz inda hoje
Vou ver mais televisão”
Nóis ficava só reparando
Prestando muita atenção
Enquanto eles procurava
O motivo do apagão
XIII
Juntava aquela ruma de gente
Na calçada de Bidinha
Uma senhora bem simpática
Que era nossa vizinha
Era aquele tumulto danado
Vinha o povo da rua todinha
XIV
Os caba pegava uma escada
Que no poste era arribada
Pegava também um frachilete
Que até o céu clareava
E um moço daqueles subia
Pra ver se a luz ajeitava
XV
Depois de muito muído
O caba descia a escada
Pega uma vara comprida
Mirava na canaleta arriada
E de repente: Trá!
A cidade era alumiada
XVI
O problema então resolvido
A penumbra enfim acabou
A mundiça gritava na praça
Festejando a luz que voltou
Todo mundo ia pra casa
E essa era a vida no interior.