"O Miro e a Onça”

Valdemiro Mendonça

Estava eu na vanguarda

Sem jeito para trabalhar.

Peguei minha espingarda,

Fui para a floresta caçar,

Uma onça grande e parda.

A meio da trilha foi deitar.

Subi num pé de sucupira

Fiquei ali bem de butuca,

A tal da onça nem respira

E foi me fundindo a cuca,

Firmei meu rifle na mira

Atirei bem atrás da nuca.

A onça nem se moveu

Desci me sentindo home,

Cutuquei nem se mexeu,

Eu vou fazer meu nome,

Digo queM matou fui eu

Azar se morreu de fome.

Cortei uma boa forquia,

Tirei uma corda de timbó

Amarrei bem como devia,

Eu dei bem uns trinta nó,

Eu sei lá se a onça revivia,

E rebentava o fio de cipó?

Fui andado bem lampeiro

E cantando uma modinha.

Passei no meio do terreiro.

De uma linda fazendinha.

Veio um gordo fazendeiro,

Saber da coragem minha.

Já perguntou bem curioso,

Seu moço ocê é um caçador?

Respondi, eu sou corajoso.

Uai dou trabaio pro senhor,

Pra caçar um onço tinhoso

Que me comeu um tralhador.

Pois sendo assim ta fechado

Trago o bicho morto ou vivo,

Pra mim já ta é combinado,

Mas eu só trabalho no crivo,

Meu pagamento é adiantado.

se não pagar não lhe sirvo,

Jantei e dormi na fazenda,

De manhã fui me despedir.

Vou enfrentar a contenda,

O homem disse se vai partir,

Precisando de ajuda entenda.

Nóis ajuda só o senhor pedir.

Digo, não meu sinhosinho,

Mas nem fique preocupado,

Gosto de trabalhar sozinho

Inté a volta muito obrigado,

Fui pensando pelo caminho

Eu vou é pra outro estado.

Fui pelo mato pra convencer,

Da coragem desse Mendonça,

Mas na picada veio aparecer

A disgramada da bicha sonsa,

O valente desandou a correr,

Morrendo de medo da onça.

Eu corria pelo meio do mato,

Já dando meu último suspiro

Perdi um dos pés de sapato,

E caiu meu trem de dar tiro,

Pensei eu subo naquele pau

E dona onça não pega o Miro.

O medo me deu a destreza

Subi lá no pau me lanhando,

Mas onça só de malvadeza

Subia bem fácil engatinhando,

Minhas pernas deu bambeza.

No oco do pau fui deslizando.

Quando cheguei bem no pé

Já virou uma caverna funda,

Filhos da onça faziam banzé,

Arranhando minha bunda,

A onça descia de marcha ré,

Causando agonia profunda.

Tive de tomar uma decisão

Pra sair daquela enrascada,

Decidido eu estiquei a mão,

Agarrei o rabo da pintada.

Gritei arranca bicho do cão

E ela subiu desembestada.

Cai numa moita de urtiga,

Tive o meu corpo sapecado,

A sorte era minha inimiga,

A onça caiu do meu lado,

Subi desci a serra na fadiga

Correndo meio desesperado.

De longe avistei a fazenda,

Pensei vai ser ali o meu fim,

O povo lá tava na merenda,

Tomando café e bolo de aipim

Eu cheguei sem marcar agenda

A onça correndo atrás de mim.

Entrei naquela porta aberta,

E foi o maior dos desarruma,

Sai na outra porta bem alerta,

Fechei e não deixei verruma,

Gritei tire o couro da esperta

Que vou ali buscar mai uma.

Eu desandei no meio do cerrado,

Correndo mais que um caminhão,

Todo meu rastro ficou apagado,

Pois logo choveu e deu serração

Estou com dinheiro bem folgado,

Terra de onça vê Miro mais não.

Trovador

Trovador das Alterosas
Enviado por Trovador das Alterosas em 21/05/2012
Reeditado em 22/05/2012
Código do texto: T3680289
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