Clara Camarão, a Primeira Guerreira do Brasil
Autor: Marciano Medeiros
Que os anjos da poesia
Me encham de inspiração
Pro passado eu resgatar
Com vigorosa emoção
E descrever os martírios
Sentidos num coração
Dona Clara Camarão
Teve história verdadeira
Essa índia valorosa
Tornou-se nobre guerreira
Sendo igual à Joana d`Arc
Nessa Pátria brasileira
Brincou em linda ribeira
Nos caminhos de Igapó
Desde o tempo de menina
Ela sempre andava só
Quando via alguém sofrendo
De todos sentia dó
Não precisava usar pó
Para ficar perfumada
Tornou-se bela garota
Com face bem desenhada
Na tribo dos potiguares
A mulher foi educada
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Sua vida está contada
Nasceu perto de seiscentos
Numa velha tribo indígena
Embalada pelos ventos
Logo despertou paixões
Confundindo pensamentos
Os índios com mil tormentos
Quiseram lhe desposar
Porque ela era dotada
De bondade singular
E seu rosto inebriante
Dava para enfeitiçar
Seu corpo pôde tomar
Contornos angelicais
Como uma Helena de Tróia
Das florestas tropicais
Ela espargiu seus encantos
No meio dos matagais
Os eflúvios divinais
Deram forças invulgares
Fortalecendo os guerreiros
Da nação dos potiguares
E Clara viveu na tribo
Sem atitudes vulgares
Com traços bem singulares
Sempre chamava atenção
Os seus cabelos compridos
Lhe davam meiga expressão
Quando dormia sonhando
Numa rede de algodão
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Nossa colonização
Produziu capitânia
A tribo dos potiguares
No Rio Grande vivia
E Clara tornou-se logo
Mulher de categoria
O seu jeito parecia
Bastante misterioso
Refletindo um coração
Sincero e bem valoroso
Pra defender o Nordeste
Do invasor pavoroso
Escolheu o seu esposo
Que amava com devoção
A guerreira lhe ofertou
As chamas do coração
Quis dividir seu destino
Com Felipe Camarão
Mas naquela ocasião
Havia muito machismo
As mulheres dos caciques
Viviam com servilismo
Então Clara deu os passos
Primeiros do feminismo
Sem temer o carrancismo
Dos velhos chefes tribais
Que da índia certamente
Logo ficaram rivais
Prosseguiu modificando
Os hábitos patriarcais
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Eram cenas sem iguais
Capazes de revoltar
Diversos chefes das tribos
Conseguiam obrigar
Cada esposa submissa
A refeição mastigar
Deveriam salivar
Sem fazer contestação
Pra que os guerreiros comessem
Com pouca mastigação
Mas a índia acabou logo
Essa horrenda tradição
Depois Clara Camarão
Soube que no litoral
Os navios holandeses
Numa operação brutal
Ameaçavam o Brasil
De Salvador a Natal
Nesse tempo Portugal
Não conseguiu defender
Nosso imenso território
Quase chega a perecer
Até os índios brigaram
Pra nossa terra manter
Dominaram pra valer
No ano mil e seiscentos
Em maio de vinte e quatro
Holandeses corpulentos
Conquistaram Salvador
Com atos sanguinolentos
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De ouro estavam sedentos
Aqui ficaram de vez
Bem no século dezessete
No ano de trinta e três
Dominaram o Rio Grande
Com bastante intrepidez
Achando ter sensatez
Em Ponta Negra chegaram
Quase oitocentos homens
No local desembarcaram
Trazendo quinze navios
Que ali na praia deixaram
Logo em seguida marcharam
Para nossa fortaleza
Que se chamava Reis Magos
Num mar de grande beleza
Tomaram conta de tudo
Num gesto de malvadeza
Maurício com realeza
Criou Nova Amsterdã
Na capital potiguar
O rigoroso titã
Mudou até nosso forte
Naquela antiga manhã
Numa atitude pagã
A fortaleza chamou
Como Castelo de Keulen
O forte denominou
Porém Clara Camarão
Aquilo não aprovou
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Um combate se travou
Com valorosos guerreiros
Felipe e Henrique Dias
Foram logo pioneiros
Juntamente com o bravo
André Vidal de Negreiros
Os distintos cavalheiros
Lideravam muita gente
Nas lutas de Guararapes
Cada qual indo na frente
Viram a índia natalense
Brigar de modo decente
A mulher foi competente
Sem atitude rasteira
Representou muito bem
Nossa terra brasileira
Junto ao senhor de engenho
João Fernandes Vieira
A luta foi verdadeira
Clara virou peregrina
Acompanhando o marido
Essa mulher nordestina
Comandou heroicamente
Uma tropa feminina
Trazia força divina
Dentro de seu coração
Montada num bom cavalo
Despertou muita emoção
Nas lutas de Porto Calvo
Manteve dedicação
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Em Guararapes então
Cada homem se comove
Primeiro em quarenta e oito
Depois em quarenta e nove
Ali na primeira briga
Clara ligeiro se move
Matias se locomove
Juntamente a populares,
Negros, mulatos e índios
Em combates singulares
Expulsaram os holandeses
Conquistadores dos mares
Os soldados exemplares
Naquele mil e seiscentos
No ano cinquenta e quatro
Viram gringos odientos
Abandonarem Recife
Após duelos sangrentos
Clara não teve lamentos
Ficou muito comovida
Seu esposo recebeu
Homenagem merecida
Durante quarenta e oito
Felipe perdeu a vida
A combatente querida
Viu seu marido morrer
Teve muitos ferimentos
Querendo a guerra vencer
Mas Felipe partiu antes
Do inimigo perder
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Clara lutou pra valer
Sendo bastante fiel
Conduzindo sua espada
Protegida por broquel
Este escudo pequenino
Evitou morte cruel
Nunca temeu coronel
Nem praticou impostura
Ficou imortalizada
Por ser marcante figura
Uma índia feminista
Dotada de alma pura
Bebeu fel de amargura
Naquele mundo sangrento
Voltando pra Igapó
Envelheceu sem tormento
Quando morreu bem idosa
Ninguém lhe fez monumento
Nosso Estado teve alento
Depois noutra geração
De fazer refinaria
Do petróleo da nação
E o nome posto na obra
Foi de Clara Camarão
Finalizando o refrão
Existe escola em Natal
Com o nome da mulher
De bravura sem igual
Transformada certamente
Numa lembrança imortal.
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