LIBERDADE EM CARTA ABERTA

LIBERDADE EM CARTA ABERTA

Lucarocas

Moreira, caro poeta

Eu me apartei da comadre

Mudei o rumo e a meta

Pra fugir dos pés do padre

E voltar à liberdade

De viver a mocidade

Sem a clausura da madre.

Dei um trato na viola

Mudei o encordoamento

Me matriculei na escola

Para tocar o instrumento

E com as pontas dos dedos

Fui desvendando os segredos

De um bom afinamento.

Afinei meu violão

Com o ritmar do amor

No embalo do coração

De uma alegria sem dor

E no meu contentamento

Fui vivendo o meu momento

Com todo o seu esplendor.

Apontei minha grafite

Para um desenho fazer

Fiz o que o traço permite

Naquilo que deve ser

Desenhei o meu destino

Corri livre igual menino

Sem medo de me perder.

Peguei uma tela em branco

Coloquei bom colorido

Fiz do sentimento franco

O meu momento atrevido

Pintei com inspiração

Pássaros da imaginação

Vôo livre do meu sentido.

No tempo dei uma rasteira

Esqueci de ter saudade

Fui viver hora primeira

Dessa minha liberdade

Isolei todo passado

Deixei tristeza de lado

E fui viver mocidade.

Arrumei meu coração

Sem medo de sofrimento

Fui viver a emoção

Da vida a cada momento

Esqueci qualquer revolta

E o caminho de volta

Para um aprisionamento.

Eu colhi num fim de tarde

O riso do por do sol

Senti sem fazer alarde

O colorido arrebol

E repousei com carinho

Num colo que se fez ninho

Pro canto do rouxinol.

Eu botei o pé na estrada

Pra seguir um novo rumo

Recomecei a jornada

Da lida fiz um resumo

Pra uma nova diretriz

Que me deixasse feliz

Da vida colhendo o sumo.

Fui saindo em boa hora

Pra bater em recolhida

E livrar-me da espora

Que me maltratava a lida

E em uma nova decisão

Agora tomo na mão

As rédeas da minha vida.

Eu me afastei da cidade

Viajei para o sertão

Pesquisei felicidade

Por toda uma região

Para outro livro escrever

E o num verso defender

Com a força da inspiração.

Colhi uma réstia de sol

No raiar de um novo dia

E por baixo do lençol

Fiz valer minha magia

E na alma da pequena

Escrevi frase serena

De uma bela poesia.

No escalar da montanha

Absorvi puro ar

Senti no corpo uma manha

Na cascata ao me banhar

Deixei correr no riacho

Tristeza de rio abaixo

Para bem longe morar.

No deslizar da cascata

Vi um riso gargalhar

Senti no cheiro da mata

Um gosto bom de se olhar

E por aquele sorriso

Eu fiz o que foi preciso

Pra dele participar.

Encontrei naquele instante

Uma sedução de mulher

Que mostrando no semblante

Uns lábios de rosicler

Ao prazer fez me convite

Com a vontade que permite

Senti-lo como quiser.

Debrucei-me em seu carinho

Num relaxar de prazer

Saboreie um bom vinho

No clima do entardecer

Senti toda a validade

Do gosto da liberdade

Desse meu jeito de ser.

Sem ninguém pra ter ciúme

Encontrei nova amizade

E dela colhi o lume

De uma musicalidade

E dessa amizade bela

Pintei no mundo uma tela

Com as cores da liberdade.

Senti chorar a viola

Nas mãos de um seresteiro

Onde a saudade consola

Em seu canto derradeiro

E me vi nessa saudade

No vôo de uma liberdade

Vagando sem paradeiro.

Colhi da seresta o canto

De quem faz da cantoria

As dores de qualquer pranto

Se transformar em alegria

E em menção ao poeta

Senti minha alma repleta

De paz amor e harmonia.

Ao voltar lá do sertão

Nas águas fiz travessia

Fiz da areia um colchão

Quando da praia vazia

Deitei com uma mulher nua

E no reflexo da lua

Para ela fiz poesia.

Quando era foi madrugada

Nadei na água do mar

Senti uma brisa salgada

Me convidando pra amar

E naquela natureza

Fiz do encontro a pureza

Num jeito bom de gozar.

Foi em um colchão de relva

Que colhi grande viver

Na liberdade de selva

Em brilho de sol nascer

Num banho de sedução

Em cenário de afeição

Senti do gozo o prazer.

Quando o sol me bronzeava

Na praia tive uma visão

E se os olhos esfregava

Mais parecia uma ilusão

Não tinha visto tão bela

Uma sedução de donzela

Pisando naquele chão.

Seus olhos da cor do mar

No sorriso um doce canto

O seu jeito de falar

Tinha pureza de santo

Que me senti tão liberto

De poder estar por perto

Dessa magia de encanto.

Fiquei como um sonhador

Plantado naquela areia

Pasmado qual um pescador

Quando avista uma sereia

Que joguei da simpatia

E lhe fiz poesia

Para malhar-lhe na teia.

Não foi meu esforço em vão

Nessa minha tentativa

Pois naquela ocasião

Ela se fez fugitiva

Deixou escrito em papel

Um recado bem fiel

De uma mensagem afetiva.

E nesse meu seguimento

De liberdade vivida

Arrumei o pensamento

Na trajetória da vida

Parei para meditar

Na paz que estava a busca

Como consolo e guarida.

Uma igreja visitei

Fiz ali grande oração

E bem muito meditei

Para a paz da salvação

E neste instante da vida

Senti a min’alma sofrida

Livrar-se de uma prisão.

Moreira poeta meu amigo

Nessa minha liberdade

Sinto a falta de um abrigo

Que me dava a raridade

Do prazer do sentimento

Que de momento em momento

Eu hoje sinto saudade.

Sei que a comadre ficou

Por pouco no esquecimento

Mas a minha alma sonhou

Fez pouso no pensamento

E recordou com carinho

O corpo dela mansinho

Num bailar de movimento.

Poeta, amigo Moreira

O que eu aqui relatei

Parece que é brincadeira

História que inventei

Mas tudo me foi real

Quando em sono natural

Numa só noite eu sonhei.

Fortaleza, outubro / 1990.

Lucarocas
Enviado por Lucarocas em 05/04/2012
Código do texto: T3596394
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