Vizinho ruim é o diabo
I
Eu morei a vida inteira
Sempre na mesma vila
Era uma vida tranquila
A vizinhança ordeira
De segunda à sexta feira
Todo mundo trabalhava
Fim de semana chegava
A gente de divertia
Cada um como queria
Ninguém nos incomodava
II
Mas essa felicidade
Faz um tempo que acabou
Um vizinho se mudou
Pois teve a necessidade
De morar noutra cidade
Por causa do seu emprego
Pra mim foi um desemprego
Mal retirou a mobília
Já chegou outra família
Que tirou o meu sossego
III
Desculpem a comparação
Mas um circo perde feio
No dia em que ela veio
Já foi grande a confusão
Com os bichos de estimação
Que essa família cria
Já criou antipatia
Por causa da bicharada
Pois na hora da chegada
Foi a maior gritaria
IV
Tem um cachorro aluado
Que late que só a porra
Um gato, uma cachorra
Um papagaio depravado
Um galo do cu pelado
Galinha, pato e peru
Quando o bicho faz glu, glu, glu
Ninguém mais fica calado
Cada um grita de um lado
É o maior sururu
V
A família tem menino
Que é um desgosto de ver
Quando começam a correr
É o maior desatino
Tem um gordo e um franzino
Um careca catarrento
Um galego piolhento
Um zambeta e um corcunda
Tem outro quase sem bunda
Cada um mais fedorento
VI
Vai o dia clareando
Já acordo com a zoada
Quando junta a bicharada
Com os moleques gritando
Parece o mundo acabando
Com uma chuva de granizo
O sol nasce é o aviso
Começa a baixaria
Isso ocorre todo dia
Já to perdendo o juízo
VII
Desde a sua chegada
Quase que não tô dormindo
Com os cachorros latindo
Até alta madrugada
É a maior cachorrada
Acordando bicho e gente
A família é indecente
Não tem noção de respeito
Com vizinhos desse jeito
Não há cristão que aguente
VIII
Quando soltam a bicharada
A rua fica um lixo
É tanta merda de bicho
Que fica pela calçada
Que ela ta infectada
Com coliformes fecais
Eu já não consigo mais
Andar com tanta sujeira
Se me der uma doideira
Eu mato esses animais
IX
Quando sai a meninada
Na rua para brincar
É um tropel de lascar
Parece uma vaquejada
Eles vão dando trombada
No que vêem pela frente
Vão provocando acidente
Quebrando luz e vidraça
Destroem o jardim da praça
E mijam no meu batente
X
A mulher é uma tonta
O marido é um desleixo
E quanto mais eu me queixo
Mais a molecada apronta
A família me afronta
Dia e noite sem parar
Não sei se vou aguentar
Pois não consigo ter paz
Parece que o satanás
Se mudou pra esse lugar
XI
Eles têm o mau costume
De ouvir pagode alto
Chega dá um sobressalto
O som a todo volume
E se levo o meu queixume
Só escuto desaforo
É uma falta de decoro
De pudor e educação
Que quase que eu meto a mão
Somente pra ver o choro
XII
Como sou homem de bem
Eu tento evitar briga
Não quero arrumar intriga
Pois isso não me convém
Me mudo no mês que vem
Se não assim eu me acabo
Com tanto arranca-rabo
Com o traste do marmanjo
Vizinho bom é um anjo
Vizinho ruim é o diabo