O homem que não tinha medo de assombração
Estrofes: sextilhas
Rimas: A B C B D B
Número de estrofes: 29
O homem que não tinha medo de assombração
Vou contar uma história
De um caso curioso
Que se deu há muito tempo
Num lugar misterioso
Envolvendo um rapaz
Sábio, valente e formoso.
Francisco era o seu nome
Veio ao mundo de açoito
Não conhecia o medo,
Pois era bastante afoito
Foi saindo pelo mundo
Na idade quase dezoito.
Antes de sair de casa
Sua mão pediu atenção
“ O mundo é envolvente
A mulher é como o cão
O lobo corta a coleira
A cobra morde a traição.
Não confiar em outro homem
Não temer assombração
Entrar no mato fechado
Derrubar boi no chão
Não recusar o serviço
Em lavoura ou construção”.
Foram os conselhos da mãe
Nem é preciso que diga
Francisco foi na estrada
Andando como formiga
Dizendo que era valente,
Mas não gostava de briga.
Parou diante de uma casa
Escutou um xingação
Pensou em pedir abrigo,
Mas levou um tropeção
Ao levantar a cabeça
Passou uma provação.
A casa era bem velha
Perdera todo o encanto
Não tinha ninguém pra xingar
No chão apenas um santo
Um litro de cachaça
Água benta e quebranto.
Francisco pegou o litro
Passou pela cozinha
Continuou na estrada
Avistou uma galinha,
Mas logo a perdeu de vista
Ao ouvir uma ladainha.
A reza era de agonia
E de um pesar sintomático
Vinha de uma casa vazia
Em um terreno errático
Francisco parou adiante
A fim de ser diplomático.
Quando foi chegando na casa
Prestou bastante atenção
Tinha dois homens fumando
Outro segurando um tição
Francisco sem medo de nada
Foi parado no portão.
– “É melhor que não entre !”
Disse bastante assustado
Um negro velho e manhoso
Com um cachorro ao lado
Estava fumando um cachimbo
Francisco ficou afobado.
Afobado, mas sem medo
Francisco prestou atenção
Pensando por que não podia
Passar por aquele portão
“o que teria na casa?”
Precisava de explicação.
– Nessa casa se encontra
A mais feia assombração
Mandada pelo cão cocho
Nascida da aflição
Quem entra nessa casa
Não encontra salvação.
As palavras do negro
Com um trovão parecia
Daquele que ensurdece
Causando infundada avaria,
Porém Francisco estava
Procurando estadia.
– Me perdoe meu senhor,
Mas fique sem aflição
Nunca encontrei nessa vida
Alguém que me desse lição
Não tenho medo de nada
Ainda mais de assombração.
Assim Francisco passou
Ao lado do negro assombrado
Quando olhou para trás
O negro já tinha invultado
Os outros que ele avistou
Também se tinham migrado.
Francisco ao bater na porta
Escutou uma voz dizer:
– Procure outro caminho
Outra porta pra bater
Essa casa é daqueles
Que cansaram de viver.
– Não tenho medo de nada
Não acredito em assombração
Se está falando está vivo
Não me perturbe a razão
Saia se for homem
Ou derrubo a porta no chão.
A porta logo se abriu
Francisco entrou sem demora
Olhando para os lados
Não se lembrava da hora
Escutou um gemido fatal
Não pode mais ir embora.
Na casa só tinha uma sala
Ao fundo um banco comprido
Francisco olhou para um canto
Viu um homem sofrido
Fumando cachimbo de palha
Que quis saber do atrevido.
– Você é um cabra valente
Não sei se é destemido
Se me trazes o que quero
Ficarei agradecido,
Porém se vier a desgosto
No mesmo momento o liquído.
Francisco olhou para o velho
E disse então: – Admito
Me acho muito valente
E assim também atrevido,
Porém só trago cachaça
Se quiser um gole eu permito.
Sentaram no banco comprido
Beberam com muita atenção
O velho naquele dia
Quis retribuir a questão,
Pois nunca ninguém foi ali
Com uma cachaça na mão.
O velho logo invultou
Francisco caiu no chão
O banco também sumiu
Perdeu-se na escuridão
Francisco ficou de pé
Só avistando um caixão.
Com isso se aproximou
Caminhando um pouco abaixado
Foi logo abrir o caixão
Avistou uma caixa ao lado
Se aproximou e a abriu
Sempre com muito cuidado.
A caixa tinha um tesouro
Francisco ficou assustado
Quando olhou pro caixão
Também se tinha invultado
Saiu com a caixa pesada
Da casa do velho assombrado.
Quando olhou para trás
Só avistou um terreno
Um negro muito ao longe
Lhe respondeu um aceno
Sumindo logo em seguida
Sempre com bastante engenho.
Francisco ficou muito rico
Lá no estado baiano
Logo voltou para casa
Sempre traçando um plano
Ganhara tesouro de um velho
Um espírito africano.
Aqui termina a história
Que não apareceu na imprensa
De uma riqueza encontrada
Que outro enredo dispensa
Pra compreendermos a sorte
Na natureza extensa.