saudade da minha infância

Hoje tenho na lembrança

O tempo de uma criança

Que a muito deixei de ser

Mas que junto dos meus pais

Fui feliz até de mais

Pois me ensinaram viver

II

Passava o dia brincando

Com minha mãe pastorando

Pra ninguém querer brigar

Mas meu sonho era crescer

Outras terras conhecer

E deixar de apanhar

III

Cresci não apanhei mais

Só guardo hoje os sinais

Dentro do meu coração

Por outras terras andei

Mais novamente voltei

Para meu velho torrão

IV

Hoje me sinto a vontade

Só tenho muita saudade

Da minha infância querida

Da mãe do pai que amei

Das lapadas que levei

Como uma lição de vida

V

Era muito aconchegante

Quando chegava o instante

De a gente ir se deitar

Meu pai deitava do lado

E meio desafinado

Começava a cantar

VI

Um canto harmonioso

Ele muito carinhoso

Cantava sem se cansar

Numa linda entoada

Borboleta namorada

Vem ver meu filho chorar

VII

Toda noite eu acordava

Um dos dois se levantava

E na minha rede ia

Que de tanto mijar nela

Já era toda amarela

E até de longe fedia

VII

Choramingava com sede

Mamãe pulava da rede

Trazia água eu bebia

Papai também acordava

Minha rede balançava

Num vai-e-vem eu dormia

IX

Chegava o fim da noite

Num estalo, num açoite

Com a presença do dia

A passarada cantando

Uns com os outros conversando

Na mais completa alegria

X

Com um carrinho de flande

A alegria era grande

Brincando por o terreiro

Sem camisa e de calção

Andando de pé no chão

Pulando sobre lajeiro

XI

Com um bodoque de lado

O cordão bem esticado

De vergasta de perero

Ia pro mato caçar

Atirar pedra em preá

Para servir de tempero

XII

Tomava banho de cuia

Falava molha, era muia

Hoje já não falo mais

Só sinto muita saudade

De tanta felicidade

Que vivi junto aos meus pais

XIII

Andando enfileirado

Num caminho apertado

Brincava-se de patente

Ninguém ficava no meio

E para não fazer feio

Só ia atrás ou na frente

XIV

O último tinha cartaz

Chamado de bom rapaz

Às vezes ia pra frente

Um lugar bem disputado

Pois ali era chamado

Por todos de bom tenente

XV

Já o coitado do meio

Ficava todo alheio

E muito encabulado

Por causa da gozação

E da cor que os outros dão

Pro lugar mais reservado

XVI

Tinha outra brincadeira

Disputada na carreira

Dessa pouco eu gostava

Nada mais que de repente

Um se mandava na frente

E para o outro falava:

XVII

Quem chegar por derradeiro

Come bosta de carneiro

Isso muito aborrecia

Pois chegando atrasado

Num sentido figurado

Quase sempre eu comia

XVIII

Corria dentro do mato

Enchia-me de carrapato

Carrapicho e mucuim

Brincando de cabra-cega,

De toca ou pega-pega

Nas vazantes de capim

XIX

Às vezes tava na moda

Correr atrás duma roda

Com uma tala de coco

Mas quando a roda caía

De raiva eu parecia

Uma galinha no choco

XX

Fosse em casa ou na escola

Bom mesmo era jogar bola

Improvisada de meia

Tomar banho na estrada

Nos dias de enxurrada

Fazendo açude de areia

XXI

Ia pra renovação

Brincar de bila e peão

No terreiro da capela

Onde mais tarde casei

Com a mulher que mais amei

Pra viver ao lado dela

XXII

Tudo me dava prazer

Não vivi só por viver

Nem esquecerei jamais

A saudade é companhia

De toda aquela harmonia

Vivida junto aos meus pais.

Gilvan Ferreira Lima.

Gilvan Ferreira lima
Enviado por PAULO JEZER em 24/02/2012
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