O LOBISOMEM

No meu tempo de criança,

Quando um bebê chorava,

Acho que só por vingança

Quem ao pobre acalentava,

Amedrontava o coitado,

Que terminava engasgado

Com os sustos que tomava.

A cantiga de ninar

Era uma coisa maluca

Era o Boi da cara preta

Era o Saci, era a Cuca,

Se o bebê não se calasse,

E bem mais alto gritasse,

Levava um croque na nuca.

Era tanto terrorismo

Que dava pra arrepiar,

Tinha um tal de Papafigo

Que o fígado vinha roubar

E a danada da chupeta,

Mesmo fazendo careta,

O bebê tinha que enfrentar.

Mas eu quero falar aqui

Sobre um bicho esquisito,

Lobisomem, por sinal,

Um lobo meio maldito

Que em noites de lua cheia,

Amedrontava a aldeia

Correndo e soltando grito.

Pelo jeito ele adorava

Causar medo àquele povo,

Era grande a choradeira,

Lobisomem era um estorvo!

Quando a pessoa caía,

Ele esganava e comia

E ia caçar de novo.

Gostava de amedrontar

As mulheres da cidade,

Velha, nova, todo tipo,

Não escolhia a idade

Onde tivesse mulher,

Num escurinho qualquer,

Ele ficava à vontade.

Se era mentira ou verdade,

O destino estava escrito:

Era um duende? Um bruxo?

Um chupa cabra? Um cabrito?

Se alguém o encontrasse

E em sua frente passasse,

Santo Deus! Estava frito!

No entanto, certo dia,

Um lobisomem diferente,

Começou a aparecer

E amedrontar toda a gente,

Mas Mariquinha gostava,

Até os olhos revirava,

Saltitando de contente.

Era um bicho de porte

Não muito avantajado,

O uivo era um sussurro,

E o pelo era penteado,

Dava até para enfrentar,

Era só não se importar,

Em sair meio arranhado.

Começou na redondeza

Uma enorme falação,

O lobisomem exótico

Causava admiração,

Ele arranhava o pescoço,

Fazia um grande alvoroço,

Porém não matava, não!

A notícia se espalhou

Para as cidades vizinhas,

Passava de boca em boca

Para todas as mocinhas,

Se uma delas duvidava,

A outra logo gritava:

- Pergunte a Mariquinha.

O prefeito já com medo

De perder a eleição,

Mandou logo um ofício,

Parecendo intimação,

Para que o destacamento

Da polícia, no momento,

Fizesse a apuração.

E mandou mais um recado:

Amigo, por caridade,

Quero força disponível,

Polícia de qualidade !

Se for insuficiente,

Peça ajuda ao tenente,

Vá buscar noutra cidade.

O tenente ficou doido

E entendeu que o perigo,

Que rondava a sua vida

Era pior que papafigo,

E disse: - Vou resolver

Para não acontecer

Uma coisa dessas comigo.

Correu e foi para casa

Para ver se conseguia,

A sua mulher guardar

Daquela grande agonia,

Mas ela ali não estava

E todo mundo comentava

A sua estranha alegria.

E a moçada foi ficando

Cada vez mais ouriçada,

Em noite de lua cheia

Por toda a madrugada,

Ouvia-se um alarido,

Era o bicho enxerido,

Dentro da mata fechada.

Os soldados procuravam,

Revirando a cidade,

Porém não logravam êxito

Porque, a bem da verdade,

O bicho não aparecia,

Parece que se escondia

E mordia sem piedade.

No sitio de seu José

Havia um belo riacho

O povo tomava banho,

E nadava de rio abaixo,

O danado do animal

Ali fez o seu curral,

Veja só o esculacho:

Quando a noite chegava

Era a mais pura alegria,

A moçada ia pro banho

Danava-se na água fria,

Se o lobisomem pegava,

Aquela ele só soltava

Na manhã do outro dia.

Seu José tinha um pássaro

Que vivia engaiolado

Era belo e cantador

E muito infeliz - coitado!

Já que estava na prisão,

Se alguém pusesse a mão,

Sairia beliscado.

Era o pássaro azulão,

Que não teve muita sorte

E foi preso no Nordeste

Ou lá pras bandas do Norte,

De um bico venenoso,

Deixava o corpo reimoso,

Chegava a provocar morte.

Acontece que Mariquinha

Pra disfarçar a noitada,

Botava a mão na gaiola

E saia bem beliscada,

Depois corria pro rio,

Sentia até calafrio,

Voltava de lá curada.

Se por acaso alguém via

A cara dela riscada,

E perguntava o que foi

Ela dizia animada:

- O azulão de seu José!

Fui lhe fazer cafuné,

Saí assim arranhada.

Passada a lua cheia,

Já na fase da minguante,

O lobisomem arribou

Da cidade e, num instante,

O povo logo entendeu,

Que o que ali sucedeu,

Era um tanto intrigante.

As meninas foram ficando

Parecidas com um balão,

Cheinhas de cima a baixo

E sem maior explicação,

Se os vizinhos perguntavam,

A culpa elas colocavam,

No bico do azulão!

E o tenente, coitado,

Ficou tonto de emoção,

Quando encontrou a mulher

Que nem prestou atenção,

Que a sua bem - amada,

Tinha sido beliscada

Pelo famoso azulão.

E o tempo foi passando

Depressa naquela aldeia...

Ao completar nove meses,

Após nove luas cheias,

Os comentários surgiram,

Então todos descobriram,

Que as coisas estavam feias.

Não sirvo pra testemunha

Pois eu não sou fofoqueira,

Mas sabe a derradeira

Que escutei pelos caminhos?

"Pelos cálculos da parteira,

Nasceram da brincadeira,

Mais de noventa lobinhos!

Maria do Socorro Domingos dos Santos Silva

João Pessoa, 15/12/2012

Mariamaria JPessoa Pb
Enviado por Mariamaria JPessoa Pb em 15/02/2012
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