AS PERGUNTAS IDIOTAS E AS RESPOSTAS DE SEU LUNGA - PARTE 1

Conheço um senhor de idade

Que mora no Juazeiro

Na terra de Padim Ciço

Muito alegre e prazenteiro

Mas por não viver sorrindo

Por fim terminou caindo

Na boca do brasileiro

Nosso povo é presepeiro

E gosta de um sangramento

Basta um pequeno sopro

Já faz logo um pé de vento

Quem não tem o que falar

Se contenta em provocar

Um pequeno movimento

O assunto do momento

É esse senhor de idade

Seu Lunga do Juazeiro

Mangaeiro da cidade

Um pacato cidadão

Só um pouco resmungão

Contra qualquer leviandade

Homem de capacidade

Mas tem um curto pavio

Qualquer pergunta idiota

Já lhe faz perder o fio

Da paz e da tolerância

Responde com ignorância

Aceitando o desafio

Poetas que nunca o viu

Se contenta em comentar

As perguntas que lhe fazem

E as respostas que ele dar

Se é disso que o povo gosta

Eu aceitei o proposta

E também vou comentar

Quando eu estive lá

Em sua mercearia

Com minha amiga Camila

Recebeu-nos com alegria

Mas fui logo constatando

Que o povo se aproveitando

De vez em quando um surgia

Acho que naquele dia

Ele foi mais visitado

Quando o povo descobriu

Que ele ia ser entrevistado

Por uma televisão

Foi nessa ocasião

Que deixou mais enfezado

Seu Lunga estava sentado

Camila lhe entrevistando

Microfone à sua frente

Chega alguém lhe perguntando:

- Está sendo entrevistado?

Ele respondeu zangado:

- Tou não, tou me confessando.

Depois ele foi contando

O que o povo lhe fazia

Por que ele tinha raiva

E nervoso respondia

E eu ali tudo gravando

Pra depois, selecionando,

Transformar tudo em poesia.

Nos contou que certo dia

Ele subiu no telhado

Pois uma telha quebrada

Deixava tudo alagado

Quando estava consertando

Ia um sujeito passando

E o deixou irritado.

«Aquele cabra safado

Fez a seguinte besteira

De ainda me perguntar:

- Está tirando goteira?

Respondi: - Não, tou botando!

E saí tudo quebrando,

Não deixei uma telha inteira!»

Com uma velha "ligeira"

Batia num filho seu

Estava com tanta ira

Que o filho se contorceu,

Entre um ai e outro ai

Dizia:-Tá bom, papai

Tá bom, pelo amor de Deus

Seu Lunga lhe respondeu:

-Sei que você está gostando,

Quando tiver ruim eu paro.

E continuou surrando

Só parou o desatino

Quando viu que o menino

Estava quase desmaiando.

Outra vez ele adentrando

Numa loja pra comprar

Veneno pra matar ratos

Porém quando ao perguntar:

-Vocês aqui tem veneno?

O outro respondeu sereno:

-Tem .o senhor vai levar?

Ele não quis mais comprar

E deu logo de sair

Mas quando chegou a porta

Respondeu bem de perci:

-Num vou levar não, seus chatos,

Vou trazer todos os ratos

Pra comer veneno aqui.

Outra vez no Cariri

Seu Lunga estava jantando

Uma suculenta sopa

Estava saboreando

Num pequeno restaurante

Quando chega um estudante

No recinto foi entrando.

Vendo Seu Lunga jantando

Perguntou ao velho zanho:

- Tomando sopa, Seu Lunga?

O velho, de modo estranho,

Derramou no corpo a sopa

E respondeu numa popa:

- Tou não, tou tomando banho!

Seu Lunga é meio tacanho

Esquivo igual urubu

Um dia pesando arroz

Um cabra do Pajeú

Perguntou com outros dois:

- Como é que tá o arroz?

Lunga respondeu: - Tá cru!

Numa loja no Exu

Lunga foi comprar papel

Tinha ferido a cabeça

E coçava pra dedéu

Ele, pra se aliviar,

Coçava, mas sem tirar

Da dita cuja o chapéu.

A moça vendo o incréu

Coçar o seu ponto fraco

Disse-lhe:-Tire o chapéu

Para coçar com um cavaco

Ele disse:- E a mocinha,

Acaso tira a calcinha

Para coçar o tabaco?

Nesse ponto ele foi fraco,

Bruto, sem educação

Noutro episódio seu Lunga

Tava chupando limão

Num vacilo descuidou

No seu olho respingou

E ele coçou com a mão.

De repente um cidadão

Que passava nessa hora

Perguntou: -Ardeu seu Lunga?

E ele sem ter demora

No dito olho espremeu

O limão e respondeu:

-Não, mas vai arder agora.

Seu Lunga em tempos de outrora

Trabalhou em Fortaleza

Foi chofer de coletivo

Trabalhava com firmeza

Até que um certo dia

Uma passageira atingia

O seu ponto de fraqueza

Lhe perguntou a freguesa

Como quem quer e não quer:

- Esse ônibus vai na praia?

Seu Lunga disse: -Mulher,

Se você tiver pra ele

Um biquíni que dê nele

Vai onde você quiser!

Mesmo cheio de mister

Seu Lunga foi militar

Tentou entrar na Marinha

Mas quando ao selecionar

A turma, um superior

A Seu Lunga perguntou:

- O jovem sabe nadar?

Se não sabe não vai dar

Pra servir na área náutica.

Seu Lunga, já enfezado,

Fez a pergunta automática:

- E se eu não souber voar

Com certeza não vai dar

Pra servir na Aeronáutica?

Ranzinza, cheio de prática,

Assim que Seu Lunga é

Certa vez em sua casa

Ele pediu à mulher

Que estava na cozinha

Depenando uma galinha:

- Oh, mulher, traz um café!

De lá de dentro a mulher

Também perguntou gritando:

- É para levar na Xícara?

E Seu Lunga, resmungando,

Disse: - Não, sua besta, não!

Derrame o café no chão

Venha com o rodo empurrando!

Lunga acordou bocejando

Forte sono ainda sentindo

Chegando no armazém

Simpático e até sorrindo

Mas voltou seu mau humor

Quando um freguês perguntou:

- Seu Lunga, tava dormindo?

Pelas paredes subindo

Com um mau humor de doer

E ainda mais com sono

Só limitou-se a dizer

Enquanto esbravejava:

- Gota serena, eu estava

Treinando para morrer!

Ainda pretendo escrever

Tudo que tenho guardado

Por enquanto só tem esta

Prosa em verso transformado.

Tem mais coisa controversa

Daquela nossa conversa

Com Seu Lunga entrevistado.

Zé Lacerda
Enviado por Zé Lacerda em 12/02/2012
Reeditado em 06/12/2016
Código do texto: T3493994
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