VIDA E MORTE DOS GUERRILHEIROS DA CAATINGA
Trecho do Cordel:
O cangaço no Nordeste
Vem do tempo do império
Com poucos nomes famosos
Cada um com seu critério
A polícia combatia
E quase sempre vencia
Lhes causando um revertério.
Cangaço levado a sério
Nas quebradas do sertão
Teve seu período áureo
No tempo de Lampião
Por suas grandes pelejas
Dando às zonas sertanejas
Uma triste conflagração.
O reino de Lampião
Começou em vinte e dois
Indo até a vinte e seis
Prolongando-se depois
Por períodos soberanos
Mas foi nesses cinco anos
Que ele mais se impôs.
O poder era dos dois
Cangaceiros e volantes
Que dotaram experiência
Aos oficiais comandantes
Que ganhou dos marginais
Experiências magistrais
Melhor do que era antes.
O que intrigava as volantes
Eram as fugas de Lampião
Que em todos os combates
Sumiam como visão
Mas de seiscentos bandidos
Mortos ou apreendidos
Mas o chefe deles não.
Das estatísticas de então
Até o fim do cangaço
Mas duzentos cangaceiros
Tiveram o mesmo fracasso
Mas por mais que se insistisse
Não houve quem conseguisse
Botar Lampião no laço.
Prender bandido era fácil
Por aqueles arredores
Só Lampião conseguia
Burlar seus perseguidores
Sempre fugia do risco
No Vale do São Francisco
Até Pajeú das Flores.
Na volante os batedores
Dos rastros de Lampião
Desconheciam os segredos
Das caatingas do sertão
E só ele conhecia
Onde água encontraria
Em cacimba ou «caldeirão»
Ainda assim Lampião
Fôra seis vezes ferido
Por forças pernambucanas
Com três irmãos abatidos
De tanto o perseguir
Foi obrigado a fugir
Do seu Estado querido.
Na Bahia escondido
De vez em quando voltava
A polícia o perseguia
Fugindo se retirava
Tendo que deixar de lado
Ferido ou capturado
Bandidos que o acompanhava.
Mas Lampião separava
Seu grupo de desordeiros
Tinha os bandoleiros mansos
Disfarçados de vaqueiros
Ou pacatos moradores
Desviando os perseguidores
Dos coronéis e coiteiros.
Esses falsos bandoleiros
Faziam divertimentos
Para atrair as volantes
Mas sem portar armamentos
E os outros se distanciavam
Num coiteiro descançavam
E curavam os ferimentos.
Era constante os tormentos
Do povo ali habitantes
Sendo obrigado a servir
Ao bando de meliantes
Serviam pra se salvar
E ainda tinham que apanhar
Dos soldados das volantes.
Tudo que se disse antes
A respeito dos coiteiros
Não é a pura verdade
Que acoitavam cangaceiros;
Uns tentavam evitá-los
E pra tentar agradá-los
Enviavam-lhes dinheiro.
Porém havia coiteiro
Que ajudava os meliantes
Pra vingar-se dos suplícios
Que havia sofrido antes
Nas mãos de policiais
E avisava os marginais
A livrar-se das volantes.
Pra combater os displantes
A polícia precisou
Se igualar aos cangaceiros
Por isso os imitou
Assim os policiais
Entravam nos matagais
Vestidos de malfeitor.
Com isso se enganou
Muitos famosos coiteiros
Descobrindo o esconderijo
De diversos bandoleiros
Que às vezes sendo encontrados
Terminavam degolados
Lá mesmo nos tabuleiros.
Pra perseguir cangaceiros
Só com jornadas forçadas
Sem levar equipamento,
Fardamento, armas pesadas
Por ninguém ali saber
Se vai matar ou morrer
Se as ações são limitadas.
Pra enfrentar essas jornadas
Tem que estar bem preparado
Sentir prazer no que faz
Ser um vocacionado
Ter coragem de lutar
Pois do contrário será
Um eterno fracassado.
Cangaceiro embrenhado
Pelo mato a se ocultar
Só aparece na estrada
Quando precisa avançar
Numa grande correria
Viajando noite e dia
Pra polícia não pegar.
Nesse caso onde passar
Arrebatam sem piedade
Todos cavalos que achar
Em qualquer propriedade
Deixando até consternados
Muitas vezes espancados
Os donos com crueldade.
Cangaceiros de verdade
Só guerreavam cantando
Descompunham, relinchavam
Outros bichos imitando
Muitas vezes imitados
Do outro lado por soldados
Que cantava os insultando.
Certa feita duelando
Volante com cangaceiro
Na região de Vila Bela
Num raso desfiladeiro
O sangue formava enchente
Naquela terra fervente
Foi grande o panavueiro.
No bando de cangaceiros
Sessenta e quatro bandidos
Duas volantes conjuntas
Num grupo mais resumido
Quarenta e cindo soldados
Ambos fortemente armados
Cada qual mais destemido.
Lampião estava escondido
Ninguém conseguia ver
Só se ouvia os tiros dele
Fazendo gente morrer
Apesar da maioria
E de onde se escondia
Tiveram que se render.
Trataram então de correr
Abandonando pra trás
Seis mortos, sete feridos
Sofrendo nos matagais
E dos lados das volantes
Ficou dez agonizantes
Do comandante Ferraz.
Lutas sempre desiguais
Assim era no passado
Comunicação escassa
Espaço dificultado
Restou somente a história
Devemos honrar com glória
Ao cangaço fracassado.
Série Cangaceiros - Vol. XLII