É O CÃO FUGINDO DA CRUZ E EU DA ÁREA DO DIREITO

Já quase um homem feito,

No tempo de adolescência,

Foi que eu vim tomar tenência

Da nobreza do Direito

Decidi: vou tomar jeito,

Começar a estudar,

Pra prestar vestibular.

Deixo tudo e sigo a pista

Pra na ciência jurídica

Eu conseguir me formar

Nos livros cansando a vista,

Passei um ano vedado.

No dia do resultado

Meu nome saiu na lista.

Olha que boa notícia.

Eu era um afortunado,

Tava entusiasmado.

Ia estudar direito,

O curso pra mim perfeito

Um sonho realizado.

Outra coisa eu não pensava,

Quando comecei o curso,

Queria fazer mais justo

O mundo em que habitava.

E logo já estagiava

Sem ganhar nenhum salário,

Um estágio temporário.

Pra ganhar experiência,

Tive que ter paciência

Num estágio voluntário.

Lá fiquei por um bom tempo,

Fazendo decisão e sentença,

Na minha inocente crença

Em conseguir meu intento

De ser em bem pouco tempo

Nas leis experimentado,

Homem por demais versado

Pra conseguir ser doutor,

Quem sabe até promotor,

Juiz ou advogado.

Mas eu tinha que estudar,

Disso logo me dei conta.

Pra ganhar alguma monta

Vou num concurso passar.

Passei a me dedicar

Bem melhor ao meu estudo.

Larguei estágio com tudo,

Contrariando o meu pai

Que achava o estágio bem mais

Que um simples passo ao canudo.

Conseguindo o que queria,

Ser servidor concursado,

Pelo Estado nomeado,

Para a Procuradoria,

Servir na Promotoria,

Comarca de Mossoró,

Achei trabalho melhor

Que o estágio onde estava,

Pois lá eu nada ganhava,

A não ser labor sem dó.

E logo fui perceber

Já lá na Promotoria

Que pra justiça que eu via,

E isso muitos podem ver,

Dinheiro pode nem ser,

Tudo do que se precisa,

Mas, pra se obter guarida

No direito brasileiro

Sem o cabra ter dinheiro

Até hoje num vi saída.

Mas, digo, não é favor,

Pra não me fazer rogado,

Que tem muito advogado,

Juiz, desembargador,

Até mesmo promotor,

Primando pela razão,

Pela Constituição.

Mas, infelizmente, eu creio,

Que habitando esse meio,

Gente assim é exceção.

Quando o processo é do rico

A máquina se movimenta,

O advogado tenta

Acelerar o seu rito

O juiz dá logo o visto

No pedido formulado,

Depois o advogado,

Apressa o promotor

Pra opinar a favor

Do pleito do abastado.

Quando o pobre é querelado

A estória é inversa.

O advogado sem pressa,

Peticiona ao Magistrado,

Que engaveta o suplicado

Sem nem dar uma olhada

Esquece da papelada,

Diz que vai resolver tudo

Mas se faz de surdo-mudo

Sem ouvir nem falar nada.

O advogado em sua vez

Só pensa em seu honorário

E arranca logo o salário

Do pobre no fim do mês

E se esse vai pro xadrez

Não importando a razão

O advogado filão

Fica logo no intento

De ganhar mais do detento

Que quer sair da prisão.

Honesto não tem valor

Em meio essa safadeza

Você pode ter certeza

Que Juiz e Promotor,

Também tem superior

E muitos são pau-mandado

De Senador, Deputado

E de muita gente suja

Que faz da justiça a puta

Sua e de seus afilhados.

E vamos dando por findo

Esse breve desabafo

E eu só contei por baixo

Porque se eu for contar tudo

Não tem papel nesse mundo

Que dê pra anotar os defeitos

Dessa justiça sem jeito

E enquanto o sol fizer luz

É o cão fugindo da cruz

E eu da área do direito.

Livio Victorius
Enviado por Livio Victorius em 29/01/2012
Reeditado em 29/01/2012
Código do texto: T3468778
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