Mais um Cordel sobre o Cangaço
Já é coisa de praxe
Um cordelista relatar
A História do Cangaço
Que é tão peculiar
Da cultura nordestina
E do Ideário popular
O mais falado de todos
É o lendário Lampião
Mas o Cangaço é anterior
É patrimônio do Sertão
São bandidos ou heróis?
Eis uma boa questão
O primeiro cangaceiro
Foi um tal de Cabileira
Que atuou pelo Recife
Matava por brincadeira
E sua vileza era temida
Pela cidade inteira
Só que Antônio Silvino
Ficou bem mais conhecido
E entrou pro hall da fama
Como um ladrão bem sucedido
Respeitador e cavalheiro
Apesar de ser bandido
Devido a grande pobreza
E o descaso do Estado
A vida do sertanejo
Era um fardo mui pesado
Uma combinação perfeita
Pro Cangaço ser visado
Como sendo a alternativa
Na busca por melhoria
Jovens se uniam aos bandos
Pra viver da valentia
E andavam bem armados
Flertando a morte todo dia
O Nordeste dominado
Por corruptos coronéis
Controlando a economia
Atuando em seus cartéis
Ficando assim definidas
As classes e os seus papéis
O coronel e sua família
Desfrutavam da riqueza
E o povo trabalhador
Mergulhado na pobreza
Concentração de terra e renda
Pense numa safadeza
Mediante este cenário
De extrema desigualdade
O Cangaço ganhou força
Ganhou notoriedade
Foi movimento social
Tentou mudar a realidade
Não tinha ideologia
Nem possuía coesão
Por isso tem gente que pensa
Que cangaceiro é só ladrão
Mas não é bem por aí
Isso é desinformação
Eles promoviam saques
Seqüestravam fazendeiros
Chegavam a algumas cidades
E lá extorquiam dinheiro
Só que isto não resume
A atuação do cangaceiro
Ele era antes de tudo
Um insubordinado
Que colocava em xeque
O poder estipulado
Por isso em muitos lugares
Era bastante admirado
Representante do povo
Contra anos de opressão
O grande latifundiário
Esse sim era o ladrão
Pois tinha toda a riqueza
Concentrada em sua mão
E nesse ambiente hostil
A lei não era utilizada
Imperava a violência
A lei do tiro e da facada
E a população no meio
Entre a cruz e a espada
De um lado os cangaceiros
Do outro estava a Volante
O confronto entre esses dois
Era algo bem constante
Sendo o que houve em Angicos
De todos o mais marcante
Marcante por um motivo
Eu logo irei revelar
Mas antes de fazer isso
Sobre a volante eu vou falar
Vou procurar ser breve
Prometo não demorar
O Cangaço em ascensão
Deveria ser contido
Afinal para o Estado
O cangaceiro era bandido
E a Volante foi criada
Justo nesse sentido
Ma o povo tinha medo
Da polícia do Sertão
Pois usavam de tortura
Pra obter informação
Surravam e maltratavam
Eis a sua atuação
Também tem nessa peleja
Recurso de espionagem
Polícia entrava pro Cangaço
Isso só de sacanagem
Pra fazer uma coisa dessas
O cabra tem que ter coragem
Pois se fosse descoberto
Que era um policial
O desfecho da história
Terminaria muito mal
Pois o fariam engolir
Um quilo inteiro de sal
Só de imaginar a cena
Bate em mim uma agonia
Me espanto com o homem
E com a sua vilania
Que pra inventar maldade
Supera-se a cada dia
Voltando agora pra Angicos
Território Sergipano
Em vinte sete de Julho
Trinta e oito foi o ano
O Comandante Bezerra
Pôs em prática o seu plano
O bando de Lampião
Cercado por sua Volante
Partiu para o confronto
Uma disputa empolgante
Vinte minutos de tiro
E um fator importante:
O uso da metralhadora
Em posse do policial
Era armas mais potente
E com isso mais letal
Entre os mortos e feridos
O saldo foi desigual
Morreram mais cangaceiros
Uns conseguiram escapar
Mas o cangaço já estava
Prestes a terminar
Pois o Capitão Virgulino
Conseguiram assassinar
Não só ele havia morrido
Como a sua amada Maria
E a Polícia do Sertão
Conseguiu o que queria:
Acabar com Lampião
E com a sua ousadia
E o desfecho da batalha
Ainda fica mais cruel
Pois decapitaram os mortos
E exposto como um troféu
Estava a cabeça de cada
Coisa horrível, Deus do Céu
Corisco até que tentou
Tocar o bando pra frente
Parceiro de Virgulino
Sendo ele o seu Tenente
Podia até ser corajoso
Mas não era inteligente
Dois anos se passaram
E n’outro cerco policial
Corisco também teve
Um idêntico final
Sem missa e nem velório
Muito menos funeral
Só que pra muita gente
O Cangaço não morreu
Lampião e tantos outros
Nossa cultura absorveu
E eu finalizo esse cordel
Mais um pra chamar de meu
FIM