Zé Salustino Moreira, um Herói Silencioso

Obs: Homenagem do poeta pra seu avô pelo lado materno, a quem todos os netos chamavam afetuosamente de pai.

Autor: Marciano Medeiros

As lembranças do passado

Precisam ser recordadas

Existem pessoas simples

Que permanecem lembradas

Nas emoções das famílias

Quando ficam enlutadas

Com rimas cadenciadas

Agora eu vou relatar

A vida dum nobre homem

Irei homenagear

Para o povo de São Bento

Poder nele se inspirar

Gostava de trabalhar

Desde o período infantil

Lá no Sitio Pedra Lisa

Que tem beleza viril

Na comovente paisagem

Com belo céu cor de anil

Neste lugar do Brasil

Começava o seu destino

De viver para o roçado

Desde o tempo de menino

Seguia digno roteiro

O bom José Salustino

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O simpático peregrino

É da família Pereira

Filho de dona Maria

Uma mulher rezadeira

E de Salustino Bento

Descendente dos Moreira

Batalhou a vida inteira

De modo desassombrado

Viu o mundo do seu tempo

Sendo bastante mudado

Falava que avistou onça

Naquele tempo passado

José estava montado

Num ligeiro jumentinho

Numa tarde pardacenta

Quase que erra o caminho

Quando o jegue viu o bicho

Saltou por pedra e espinho

Não existia vizinho

Vivendo naquele meio

Num deserto solitário

Pra ajudar no aperreio

Mas a onça foi embora

E persegui-lo não veio

Ligeiro sem arrodeio

José em casa chegou

Todo mundo ficou pálido

Quando a cena ele contou

Da carreira do jumento

Que sua vida salvou

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Ele sempre relatou

Que em dezessete nasceu

O episódio da onça

Bem depois aconteceu

E durante sua vida

Do caso não esqueceu

Na agricultura venceu

Com muita solicitude

Este moço tão correto

Procurava ter virtude

Naquele tempo distante

Afetou sua saúde

Desde plena juventude

Contraiu amarelão

Que era o grande terror

Daquela população

A doença maltratava

Provocando inflamação

Teve determinação

Para viver controlado

Só consumia alimento

Que fosse recomendado

Chegando quarenta e quatro

José estava casado

Tão logo foi consumado

Na capela o casamento

Com dona Izabel Viana

O padre deu andamento

Na Igreja de Monte Alegre

Receberam o sacramento

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Vou dar esclarecimento

Com palavras verdadeiras

O solo de Monte Alegre

Passou a ser Gameleiras

José com dona Izabel

Viram lutas pioneiras

Fazendo ações altaneiras

Nossa vida não emperra

Quem vive com realismo

A fantasia desterra

E o casal mencionado

Foi morar no Pé da Serra

Lutando naquela terra

Cheia de ladeira e loca

Perto de sua casinha

Um riacho desemboca

E o primeiro filho deles

O destino desentoca

Foi então que surgiu Doca

Depois nasceu Manoel

Também chegou a Francisca,

Durante seca cruel,

Nego, Jácio, Neide e Deda,

Com seu Arlindo fiel

Nunca temeu coronel

Sempre andava honestamente

José Salustino fez

Trajetória bem decente

Trabalhando com seus filhos

Todos eles diligentes

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Foram dias refulgentes

Lutando com muito amor

Indo cuidar de seu pai

Dele virou bom tutor

Então José Salustino

Demonstrava ter valor

Com jeito batalhador

Enfrentou o sofrimento

Quando o velhinho morreu

José sentiu desalento

Junto com sua família

Veio morar em São Bento

Quando passou o lamento

Prosseguiu grande jornada

Morou no Sítio Jucá

E na Lagoa Salgada

Depois em sessenta e sete

Boa terra comprada

Antes morou na Rajada

Num tempo sem aperreio

Em março pagou a terra

No mês de dezembro veio

Habitar em Cabaceiras

Junto da Serra do Meio

Transformou em seu esteio

A bela propriedade

Que fica perto da rua,

Três quilômetros da cidade

Morando com discrição,

Singeleza e humildade

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Recordo sua bondade

No sorriso natural

Quando eu vinha passar férias

De perto da capital

No decorrer da semana

Tinha conversa legal

Com seu jeito especial

Falava de cangaceiro

Do bravo Antônio Silvino

Um famoso justiceiro

Que percorreu as estradas

Do Nordeste brasileiro

De Lampião bandoleiro

Contava muitas histórias

Com façanhas do valente

Suas derrotas e glórias

Que nas brigas com soldados

Sempre contava vanglórias

Com atitudes inglórias

Lampião não se rendeu

No período do cangaço

Zé Salustino viveu

Nunca encontrou Virgulino

Só a fama conheceu

Relembro dum gesto seu

Parecia um menestrel

Mesmo não tendo estudado

Teve um juízo fiel

Pra decorar as estrofes

Dos livretos de cordel

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Mesmo sem ler no papel

Lembrava com perfeição

De muitos versos cantados

Nas feiras da região

Declamando totalmente

Juvenal e o Dragão

Até cordel de Sansão

Decorava com vontade

Do Pavão Misterioso

Aprendeu mais da metade

Porque viu alguém cantando

Noutra bonita cidade

A sua capacidade

Gerava admiração

Pois escutava uma vez

Lembrando com exatidão

As estrofes dos poetas

Jorradas do coração

O sincero cidadão

Lutou na agricultura

Trabalhava no pesado

Essa pacata figura

Pra manter os descendentes

Com existência segura

Numa trajetória dura

Viu seus irmãos falecendo

O tempo sempre passava

E dele a morte esquecendo

Com noventa e quatro anos

Seu corpo estava sofrendo

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Continuava vivendo

Na mesma localidade

Durante dois mil e onze

Fez mudança de idade

E após dezoito de março

Chegou à dificuldade

Ele ficou a vontade

Na singela residência

Decorridos quatro dias

Foi perdendo a consciência

Aos vinte e dois de março

Seu corpo teve falência

Deixou-nos experiência

Duma longa caminhada

A família Salustino

Ficou emocionada

Pela partida do pai

Para a celeste morada

A casa foi visitada

Por amigos e parentes

Dos lugares mais distantes

Chegaram bem diligentes

Para o enterro do corpo

Foram católicos e crentes

Todos os seus descendentes

Estão com dor verdadeira

Mostrei a vida de “pai”

Desta singela maneira

Do herói silencioso

Zé Salustino Moreira.

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