Após dez anos

Benedita Azevedo

O campanário da igreja

Faz bater meu coração,

Após dez anos de ausência

É muito grande a emoção,

Retorno à minha cidade

estou na terceira idade

querendo tudo lembrar.

Na curva daquela estrada,

De piçarra ensolarada

Com mamãe a passear.

Do alto do Mundico Matos,

Antes da linha do trem...

Relembro todos meus atos,

E o som do sino blem... blem...

Olhando à esquerda procuro

Destroços do velho muro

As velhas reminiscências,

A casa da tia cotinha

Aonde a mãe sempre vinha

Pra suprir suas carências.

Mais à frente vejo a casa,

Terras da Chiquita Matos...

As paredes sem telhado

Fazem lembrar desacatos

Sofridos pela sua dona;

Sentada em minha poltrona

Ela contou sua sina,

À visão de tal lembrança

Faz-me sentir a criança

Só que agora peregrina.

E fiz questão de parar

Ali bem perto dos trilhos.

Observando a estrada

E as folhas cheias de brilhos,

Andando sobre dormentes

A visitar os parentes,

Quantas saudades, meu Deus!

Olhando aquela estação,

Senti que meu coração

Permanece ali co’os meus.

II

Saltando meu coração

Ultrapasso a linha férrea

Vou segurando a emoção

E antes que alguém encerre-a

Quero viajar outra vez;

Lembrar o vestido xadrez

Olhar os campos passando

Reviver minha viajem

Quando cheia de coragem

Meu futuro ia buscando.

Voltando ao presente, sigo

E continuo a viagem

Levando sempre comigo

A saudade na bagagem

Chego à casa do Zequinha,

Onde rezei ladainha

Para minha prima morta;

Por ali sempre passava

Quando da escola voltava

E via os primos à porta.

Imaginei minha casa

Com meus pais Eusébio e Rosa

Um calor meu corpo abrasa

E fico até mesmo prosa,

Ao lembrar daquela terra

E a silenciosa guerra

Entre órfãos e parentes,

Ninguém assume a postura

Que nenhuma criatura

Ali é assim tão carente.

Faço força pra seguir

Vencendo o impulso de entrar

Naquela rua a sorrir

E olhar a curva a dobrar...

Na minha pobre lembrança,

as manhãs da minha infância

todas eram de neblina;

e eu não conseguia ver

bem antes do sol nascer

o leito do rio deu menina.

Benedita Azevedo
Enviado por Benedita Azevedo em 06/10/2011
Reeditado em 26/06/2012
Código do texto: T3261774