O CAÇADOR DE VAMPIRO
Odir Milanez
Há muito tempo admiro
o senso do ser humano.
Na mentira é soberano,
a muitas dela adiro.
Mas o que fez Valdomiro,
quando a verdade escondeu,
acho que se arrependeu
por esconder a verdade,
pois dessa história quem há de
saber de tudo, sou eu.
Era Miro o nome seu,
o nome que ele gostava,
apelido que adorava,
pois foi seu pai quem lhe deu.
E quando seu pai morreu,
morte escrita nos jornais,
Valdomiro nunca mais
quis se chamar Valdomiro.
Só atendia por Miro.
Por Valdomiro, jamais!
Depois da morte dos pais,
com a fazenda ficou,
na fazenda se casou
logo após os esponsais.
Filhos de partos normais,
dois meninos e a menina
a quem deu nome de Nina,
morena, meiga e mimosa,
diferente da mãe, Rosa,
vesga, velha e venta fina!
Com tudo o tempo termina.
Cega a vista, cala a prosa.
O amor de Miro e Rosa
já cumprira sua sina.
Vem a raiva, o ódio mina
de dentro do coração,
vem a tal da ingratidão.
Com uma outra ele sai,
a fêmea, com fome, o trai,
dos dois se vai a razão.
Os filhos pra longe vão
em busca de liberdade,
vão trabalhar na cidade,
cansados dos pés no chão.
Miro, Rosa, e a solidão,
o soluço do suspiro.
Na mulher pensando em tiro,
Miro se pôs a cismar
e começou a criar
a figura do vampiro.
Quando Miro concebeu
vida e morte de um vampiro
nunca tinha dado um tiro,
um tiro nunca ele deu.
Mas nesse dia entendeu
que vivia em cativeiro,
dês que seu amor primeiro,
a mulher com quem casara,
sua esposa, tinha a cara
de vampiro brasileiro!
Sua vida de solteiro
voltou a lhe ser saudade!
Mulheres tinha à vontade,
a todas fazia aceiro.
Nenhum amor verdadeiro,
nenhuma prendada dama,
somente amor que se ama
sem contrato permanente,
desse amor que, de repente,
chega, deita e sai da cama!
E Miro tratou da trama
duma caçada maluca:
de todos botou na cuca
o desenrolar do drama.
A si mesmo deu a fama
de caçador destemido,
que jamais tinha tremido
ante a fera mais selvagem.
Para dizer da coragem,
contou caso não havido.
Era menino crescido
quando penetrou na mata
de onça pintada à cata
pois ela tinha comido:
um novilho mal nascido,
dois carneiros e um galo.
Amontado num cavalo,
uma espingarda na mão,
na outra mão um facão,
aventurou-se no embalo.
Ouvidos ouvindo estalo,
os olhos vendo visagem,
Miro, mostrando coragem,
sem ligar para intervalo,
varou vale, vagou valo.
À vida não tendo estima,
de versos buscando a rima,
aos ouvidos não ouviu.
Da toca a onça saiu
e de Miro foi em cima!
Caindo a soca e o facão,
o pangaré empinou-se,
mijou sem mira,cagou-se,
jogando Miro no chão!
Foi-se embora o alazão!
Miro, sentado na bosta,
da onça ainda de costa,
deu um pinote pra traz,
desse pinote, rapaz,
que Satanás goza e gosta!
A onça, como resposta,
ao ver a presa cagada,
mostrou-lhe a presa afiada,
para fora toda posta!
-Você em mim não encosta!
-disse Miro à onça brava.
Enquanto a onça avançava,
Miro, sem dar-lhe atenção,
pegava o facão no chão
e no seu peito cravava!
Essa história ele contava
em todo o lugar que ia.
Tinha cabra que sorria,
tinha moça que chorava.
Mas o Miro amenizava
essa história que inventou:
- Arrependido inda estou.
Daquela onça eu gostava.
Fosse hoje, a perdoava
ou Valdomiro não sou!
Quando lhe veio a ideia
da criação do vampiro,
Miro arranjou um papiro
e fez ver para a plateia
que tratava da odisseia
dum vampiro brasileiro
que morava no estrangeiro:
“Mas agora, gente, creia:
nas noites de luz cheia
ele ronda o meu terreiro!”
“Companheira, companheiro,
preciso de mais alguém!
Quem é que comigo vem
caçar esse carniceiro?
De quem vai ser o primeiro
grito de guerra ao bandido?
Quem me mostra o braço erguido
dando o “sim”! Diga quem quer!”
Respondeu sua mulher:
- Eu digo “sim”, meu marido!
Dia após o sucedido,
Miro foi para o Pará,
comprar um lobo guará,
trazendo o bicho escondido.
De comida bem comido,
o bicho engordou bastante,
parecendo um elefante!
E a cada lua cheia,
Miro inventava na veia:
“Vi o diabo a mim diante!”
Um dia, com voz berrante,
a mulher, de cuca fresca,
rindo a cara vampiresca,
disse que tinha um amante.
Miro,quase ao mesmo instante,
foi ver o lobo. Ao lhe ver,
em carne querendo crer,
o grande lobo sorriu,
mas a comida não viu:
-Vou deixá-lo sem comer!
Dez dias de desprazer,
dez dias desordenados!
Gente, por todos os lados,
o vampiro a maldizer.
Noite de lua! O planger
de gritos na escuridão.
Corre à rua a multidão:
a mulher morta a dentada,
a fera, em frente, estirada,
Miro de faca na mão.
- Como é triste, ó meu irmão!
- dizia Miro em voz langue,
da mulher molhado em sangue:
-Como dói meu coração!
-Viva Miro! - era o refrão
do povo. – Que bem nos fez!
Não fosse ele, talvez
nos mataria o vampiro!
Dessa história eu nada tiro.
Foi assim... Era uma vez....
JPessoa/PB
03.10.2011
oklima