A saga de um baiano.
Sou baiano de nascença
De la da região sul
Distrito de apuarema
Denominado juru
Lá da mandioca e banana
Da melancia e dar cana
Feijão de corda e andú
Com meus dezenove anos
Deixei minha região
Vim aqui para o sudeste
Com uma mala na mão
Bem no começo do frio
Depois do mes de abril
Pertinho do são joão
Passei momentos dificeis
Naquele frio de amargar
A orelha congelava
A mão queria travar
Os dedos todos vermelhos
o nariz frio igual gelo
Pensei, meu Deus vou voltar
O frio aqui chega a zero
O calor lá é quarenta
minha pele ressecava
Chega ficava cinzenta
Acredite se equizer
Era igual chaminé
A fumaceira da venta
Quem nasce lá no nordeste
Depois teve que sair
Tem muitas dificuldades
de Quase não resistir
Dificil se adaptar
Dificuldade ao chegar
E pra viver por aqui
Chegando aqui em em São paulo
Acha tudo diferente
Por ser um desconhecido
Em meio a estranha gente
Não tem outra solução
Vai a casa dum irmão
Ou de um outro parente
Então chamei o meu primo
Para passear de trem
No vagão tem cearense
Baiano tem mais de cem
Não tem quem não reconheça
O formato da cabeça
E o sotaque também
Nossa primeira parada
Foi na estação da luz
Passei no largo são bento
Tomei café com cuscuz
Fui na igreja da sé
Fiz uma prece com fé
Agradecendo a Jesus
Já na primeira semana
Fui procurar um emprego
Nunca saia sozinha
Devido ter muito medo
Sentia muito inseguro
Mas pensando no futuro
Acordava muito cedo
Saia de madrugada
Chegava na construção
Eu dizia faço tudo
Não tenho preguiça não
Sou trabalhador da roça
Com a pele da mão grossa
Dispensava explicação
Eu ouvia logo um não
Meu peito dava um repuxo
O que faltava nas pernas
Sobrava em cima no buxo
Ele pra me consolar
Dizia aqui pra entrar
Você tem que ter cartuxo
Ao ouvi essa palavra
Eu quis até dar risada
Se dissese ferramenta
Par picareta ou enxada
Mas cartucho? que ironia
Eu usava na Bahia
Pra carregar espingarda
Eu meio desconfiado
Continuei meu roteiro
Cheguei noutra construção
E perguntei pro porteiro
Não esta pegando gente
O porteiro disse oxente
Pegou ontem o dia inteiro
Então falei eu procuro
uma vaga de pedreiro
Ele falou só tem uma
Mas é para engenheiro
Eu respondi eu aceito
Porque não tem outro jeito
E preciso de dinheiro
O rapaz me perguntou
Você tem esperiencia?
Eu lhe respondi pois não
Tenho muita inteligencia
E já ganhei muita grana
Pois papai tem um engenho
Daqueles de moer cana
O moço disse bem serio
Mas com muita simpatia
Aqui só pega engenheiro
Formado em engenharia
E quase morre de rir
O engenheiro daqui
Não é como o da bahia
Pensei voltar pro nordeste
a minha terra natal
Mas o dinheior que eu tinha
Não dava nem um real
Passei na casa do norte
Tomei um gole bem forte
E comecei passar mal
A cachaça bateu dentro
Chegou ferver na barriga
Porque não tinha alimento
Só umas cinco lombrigas
A barriga deu um ronco
Fiquei amarelo e tonto
Cair com grande fadiga
O vendedor assustado
pensou que eu ia morrer
Pegou um pé de arruda
e começou me benzer
Ele perguntou meu nome
E disse assim ta com fome
Entra pra ca vem comer
Mas era só um desmaio
Causado pela fraqueza
Eu me levantei do chão
E encostei numa mesa
Comi fava com jabá
Um pouco de vatapá
E bateu forte tristeza
Pois com aquela comida
Eu me lembrei da Bahia
Quando mamãe dna Elza
Essas comidas fazia
comia tripa cozida
E passarinha fervida
Meu prato era uma bacia
Lembre-me do meu avô
Com suas historias e lendas
A namorada gorete
Com seu vestido de rendas
Minha cabrita tetela
Era a cabrita mais bela
De toda aquela fazenda
Do tempo que eu caçava
Coragem eu tinha de sobra
Lembei-me do meu cachorro
Que eu criei com abóbora
Comia pintinho novo
Não podia ver um ovo
Pois comia até de cobra
Mas não podia ficar
Só relembrando o passado
Precisava trabalhar
Conseguir algum trocado
Apeguei com padre cicero
Pra arrumar um serviço
E fui dormir sossegado
A noite tive um aviso
Que um serviço ia achar
Era um aviso madado
Por um dos meus orixas
Acordei pela manhã
Dei a bença a iansã
E sair pra procurar
Eu sai as cinco horas
Com o sonho em minha mente
Entrei num vagão do trem
Tava lotado de gente
Eu ouvi alguem falar
Disseram-me que acolá
Esta pegando servente
Eu então astucioso
Como todo bom baiano
Cheguei perto do rapaz
E conversa fui puxando
Ele então me perguntou
De onde é o senhor?
Que depressa fui falando
Sou duma cidadezinha
De la do sul da Bahia
Ando procurando emprego
Saio todo santo dia
Ando a pé o dia inteiro
Bolso vazio sem dinheiro
Mas Jesus sempre me guia
O moço então perguntou
Qual a sua profissão?
Ja trabalhei no cangaço
Do valente lampião
Fui lenhador fui vaqueiro
Mas digo pro companheiro
Não fui ainda ladrão
Trabalhei numa fazenda
De plantação de cacau
Ja trabalhei na caatinga
No cultivo de sisal
Fui encantador de cobra
Na Bahia tem de sobra
De cascavel a coral
Fui pescador afamado
Nas aguas do velho Chico
Num armazém de farinha
Trabalhei fazendo bico
Fui provador de cachaça
Meu nome lembro faz graça
Chamava boca de litro
Montei um grande alambique
Num sítio na caatinga
Por dia eu consumia
Quase dois litros de pinga
Vivia com os pés inchados
Um bafo forte danado
E sem a pele da língua
Trabalhei como vigia
Numa casa de umbanda
Não conseguia dormir
Toda noite tinha samba
Vela acesa em todo canto
O dono era um pai de santo
Do terreiro de arruanda
Trabalhei de porta em porta
Na profissão de mascate
Vendia tudo fiado
E perdia a maior parte
Trabalhei numa bodega
Ja fui porteiro de brega
E gigolô de biscate
Hoje digo pro amigo
Não escolho o que fazer
Pode ser de faxineiro
De vendedor de dendê
O moço me respondeu
Tem um rapaz primo meu
Que pode ajudar você
Essa meu primo trabalha
Numa construção civil
Por ele ser barrigudo
Seu apelido é barril
La perto de Petrolina
Desonrou uma mocinha
E pra não morrer fugiu
Se tu quiser ir comigo
Te apresento á barril
O salário é oitocentos
Pode chegar até mil
Eu então falei que ia
Acertou pro outro dia
E depois se despediu
Fomos la outro dia
Como tinha combinado
Bem no canteiro da obra
Barril estava sentado
Tava ele e o gerente
E mais um monte de gente
Contratando empregado
Então ficou tudo certo
Você começa amanhã
Era um bairro conhecido
Pertinho do jaçana
Olho tudo direitinho
Pra não errar o caminho
Quando voltar de manhã
A noite vem pesadelo
Não durmo fico acordado
Marmita na geladeira
O despertador ligado
Deito com a luz acessa
Um terço em cima da mesa
E uma facão do meu lado
Quatro horas da manhã
Eu ja pego o trem lotado
Chego na firma seis horas
Uma hora adiantado
Como ainda estava escuro
Encostei ali no muro
E fiquei bem sossegado
As sete horas começa
A chegar o pessoal
Eu trazia pendurado
Uma espécie de bornal
Que usava na Bahia
Quando era bóia fria
Na plantação de cacau
Era um bornal decorado
E com a alça comprida
Na decoração trazia
A senhora aparecida
Que usava pra dar sorte
Pra livrar-me da morte
E proteger minha vida
Mas serviu de gozação
Aquele belo bornal
Por la tinha um cearense
Da maior cara de pau
Seu apelido era rato
Ô ceara puxa saco
Descarado sem igual
O ceara era falso
Igual a bosta de vaca
Por cima seca bonita
Por baixo mole igual papa
Na frente ele te ajuda
Por trás ele vira um judas
Xinga te humilha e maltrata
Mas o nome verdadeiro
Dele era escariote
Entregava todo mundo
Foi jurado até de morte
O mané boca de sapo
O empurrou num buraco
Não morreu por muita sorte
Logo de cara eu encontro
Um monte de conterrâneo
Um pergunta tu é de onde
Eu respondi sou baiano
Venho la de jequié
O outro diz sou José
Do sertão paraibano
Outro diz sou la de feira
Outro diz sou de gandú
O outro vim la de ilhéus
Mas outro de piau
Cada um do seu lugar
Muita história pra contar
Vivendo aqui neste sul
Ali tinha um pedreiro
Por nome de Adamastor
Que vendo seu conterrâneo
Do jeito dele gostou
Tu vais trabalhar comigo
Tornou-se seu grande amigo
Ás vezes seu professor
Um certo dia bem cedo
O ceara me falou
Para pegar a girica
Adamastor que mandou
Então peguei um cabresto
E sem arrumar pretexto
Falei pra ele ja vou
Andei ate me cansar
Naquele pasto sem fim
Eram mais de dez alqueires
De plantação de capim
Então fiquei a pensar
Acho que o ceara
Aprontou essa pra mim
Eu voltei desconfiado
E só ouvia coxixos
Com a calça e a camisa
Cheinha de carrapicho
com o cabresto na mão
eu pensei é armação
daquele cara de bicho
Disse cade a jirica?
já meio desconfiado
E falou voce sumiu
Eu já tava preocupado
Eu disse aqui não está
Deve ta no ceará
Com o seu pai abraçado
Nisso chega adamastor
Disse, baiano vem cá
Voce foi obedecer
Justamente o ceará?
Ele é um anjo do mal
Tem o istinto animal
Nem adianta brigar
Disse adamastor jirica
É aquela carriola
Ela só tem duas rodas
E não tem feixe de mola
É pra carregar cimento
Não a mulher do jumento
Fique mais esperto agora
Para todos brasileiros
Que migram atras de vitoria
Seus parentes ficam triste
Não lhes tiram da memoria
Porem o mais importante
É lutar como um gigante
E construir sua historia
João.