Ô CORDEL DIFÍCIL!
Quando vou escrever cordel
me dispo da vaidade
esqueço qualquer orgulho
vestido de humildade
pois é poesia popular
que o povo gosta de cantar
pelos cantos da cidade
E fico pensando na lua
com miçangas coloridas
nas estrelas brincalhonas
encantando atrevidas
quando a tarde vai embora
o sol se esconde na hora
esquecendo despedidas
Perpassa pela cachola
miríades de borboletas
pássaros esvoaçando
os números das roletas
mulheres achando graça
garotas lindas na praça
músicas com belas letras
Depressa chega a dúvida
- misteriosa cultura! -
fazendo galo na mente
me trazendo amargura
vislumbrand'o horizonte
subo correndo um monte
pequeno, miniatura
Então troco as palavras
rimo pão com armadura
como pipoca sem sal
feijão, arroz, rapadura
arranco sapatos do pé
escrevo ode à mulher
plantando muita verdura
Mas a danada da poesia
sumindo no crepúsculo
deixa de ser cordel, é cordão
num versinho minúsculo
bem soberbo e abusado
tão ínfimo, tão coitado,
um livro? Não, opúsculo!
Essas coisas populares
pensas ser fácil de fazer?
Estás muito enganado
eu misturo tu com você
equívoco gramatical
terminando por me dar mal
obrigado a beber dendê
Lá vou eu de novo tentar
o destrinche cordelístico
embor'eu não seja mago
vou sendo cabalístico
ao terminar a obrigação
com meu maior dedo da mão
coloco meu interstício