"O MATUTO NA CIDADE"
O CABRA QUANDO É MATUTO,
DESSES CABRA DO MATO
QUE DO MUNDO É ASTUTO
E JAMAIS USOU SAPATO
QUE NUNCA FOI A CIDADE
E NEM O CAMINHO SABE
QUANDO SABE NÃO PARECE
MAS NO MUNDO QUE DEUS FEZ
TEM SEMPRE A PRIMEIRA VEZ
QUE NINGUÉM SE ESQUECE.
JÁ SENDO BEM GRAÚDO
NA CIDADE NÃO TER IDO
COM MEDO DE ASSALTO
DE CARRO E DE BANDIDO
SIRMEI DE SAIR DE CASA
TODO AFOITO, COM ASA
CHEIO, DA ZONA RURAL
PRA CIDADE ME MUDEI
MAS NÃO ME ACOSTUMEI
ACABEI ME DANDO MAL.
TRINTA LÉGUAS DE ESTRADA
TRAÇADA A CADA PASSO
AQUI ALI UMA PARADA
PRA ALIVIAR O CANSAÇO
CHEGANDO NA ENTRADA
VISEI UMA CHUVARADA
DE PRÉDIO E DE AVENIDA
EU FIQUEI ATRAPALHADO
SEM SABER DE QUE LADO
SE ENTRAVA E SE SAÍA.
PERGUNTEI ONDE FICAVA
A PRINCIPAL IGREJA
QUANTO MAIS PERGUNTAVA
MAIOR FICAVA A TRISTEZA
LEMBRANDO MEU CANTINHO
MINHA ROÇA, MEU RANCHINHO
DO QUE FICOU PARA TRÁS
EU TAVA NUMA SITUAÇÃO
DE PARTIR O CORAÇÃO
E DE TIRAR A MINHA PAZ.
PASSEI POR VÁRIOS CANTOS
PROCURANDO UM EMPREGO
PEDIA POR TODOS OS SANTOS
ATÉ QUE ACHEI ARREGO
NUM É QUE UM CIDADÃO
VIU A MINHA SITUAÇÃO
NA QUAL ME ENCONTRAVA
OFERECEU UMA DORMIDA
AINDA ME DEU COMIDA
DE CUSCUZ, FEIJÃO E FAVA.
ERA O DONO DE UM LUGAR
QUE NÃO ENTRAVA MUIÉ
EU COMECEI A ME PENSAR
SEJA LÁ O QUE DEUS QUISÉ
QUANDO EU FUI ESPIANDO
UNS CABRAS SE CHEGANDO
BEM ASSIM DO MEU LADO
FOI QUE EU OLHEI LIGEIRO
E ENXERGUEI UM LETREIRO
ESCRITO: BAR DOS VIADOS.
MÁ RAPAZ, NUM PRESTOU NÃO
EU PULEI DA CADEIRA
LEVANTEI DE SUPETÃO
PARTI NUMA CARREIRA
ERA EU DE LÁ CORRENDO
E OS VIADOS ME DIZENDO:
COM UMA VOZ DE AÇOITE
VENHA CÁ GOSTOZINHO
EU QUERO “CÊ” TODINHO
POR TRÊS DIAS E TRÊS NOITE.
TÁ DOIDO CABRA DA PESTE
O QUE É QUE HÁ SAFADO
EU MORO NO NORDESTE
SOU UM HOMEM AFAMADO
E FICAR MAIS UM MINUTO
NESSA CIDADE E EU MATUTO
QUE DAQUI NÃO ME AGRADO
SOU CAPAZ DE INFARTAR
POIS LUGAR MELHOR NÃO HÁ
QUE MEU RANCHO, MEU ROÇADO.
PEGUEI A MANGA DO MEIO
VOLTEI PARA MEU SERTÃO
DO DINHEIRO QUE LEVEI
NÃO SOBROU NEM UM TUSTÃO
TUDO QUE TROUXE DE LÁ
FOI UMA ROUPA PRA ANDAR
E UM CHINELO DE COURO
SE QUISER SABER ONDE É
EU DIGO PRA QUEM QUISÉ
O SERTÃO É MEU TESOURO.
(ALDO DE ALMEIDA)