TENTANDO SER CORDELISTA
Sou um homem que trabalha
Garantindo meu sustento
Eu sou brisa, sou o vento
Da camisa sou a malha
Sou fatal como navalha
Um soldado no combate
Elixir de erva mate
Condutor de maquinário
Sou malandro, sou otário
Forte feito um guindaste
Nunca fui um professor
Vivo sendo estudante
Sou retrato de estante
Instrumento de doutor
Cirurgia para a dor
Sou a água, sou a sede
Sou embolso de parede
Alivio de seu cansaço
Num instante eu me faço
De gancho pra sua rede
Meu instinto é paterno
Sou um toque de veludo
Sou a força do cascudo
Meu carinho é eterno
Sou mais céu que o inferno
A casa de pau-a-pique
Bebida do alambique
Eu lhe conto meu segredo
Quase tudo causa medo
Mas não sou de dar chilique
Sou idoso, sou menino
Seu primeiro namorado
A leveza do seu fardo
Parecendo desatino
Sou viola e violino
Sou o amigo do peito
Travesseiro do seu leito
Eu sou conta de somar
Se não der pra arrumar
Pode crer que dou um jeito
Sou marido, sou amante
A chuva depois do sol
Sou a cama e o lençol
Muito claro e intrigante
Vagaroso e fulminante
Eu sou tudo de uma vez
Sou o peão do seu xadrez
Sou um macho sem pudores
Só não sou de mandar flores
Causa desta timidez
Eu sou sério, sou palhaço
Sou o drama e a comédia
O anuncio da tragédia
Da corda eu sou o laço
Alegria e embaraço
Sou roqueiro, sou sambista
Mas nunca serei artista
Tudo isso Deus que deu
Para este simples plebeu
Tentando ser cordelista