LIÇÃO DE VIDA
MATUTO BEM DE VIDA
Autor: Onildo Barbosa
CERTO DIA EU CAMINHAVA
PELAS RUA DA CIDADE
TAVA PRO LÁ A PASSÊI
MODE VÊ AS NOVIDADE
QUANDO EUENTREI NA RUA,
JÁ FUI VENO MUIÉ NUA
COM AS PEITANÇA DE FORA
E EU OIANO AQUELA GENTE
VÍ QUE TUDO É DEFERENTE
DA TERRA QUEA GENTE MORA.
AÍ EU VI QUANDO UM HOME
NUM CARRÃO INVERNIZADO
PAROU NUM BAR DA ESQUINA
FICOU NUM BANCO SENTADO
EU OIANOO JEIETO DELE
PUDE OBSERVAR QUI ÊLE
TAVA MÊI PREOCUPADO.
AÍ EU PEDI LICENÇA
COM TODA MINHA FRANQUEZA
DEI BOM DIA PRO DOUTOR
ME SENTEI NA MERMA MESA.
E ELE NEM ME OIAVA
NUM SORRIA, NUM FALAVA
TRISTE FEITO MARIPÔSA
EUSOU MÊI CONVERSADOR,
PRIGINTEI PRÁ O DOUTOR:
TÁ SENTINO ARGUMA COISA?
ÊLE ME OIÔ E DIXE
NUM ADIANTA EU DIZER,
SE EU FALÁ O QUI SINTO
VOCÊ NUM VAI RESORVER!
EU DIXE GIDA DOUTOR,
DESABAFE PRO FAVOR
JOGUE ESSA TRISEZA FORA
FAÇA ESSA AGONIA AMENA
SE A COISA FOR PEQUENA,
A GENTE RESORVE AGORA.
ÊLE RESPONDEU CABÔCO!
EU TÔ MERMO APERREADO
MORRO AQUI NESSA CIDADE
MAS VIVO DESEMPREGADO,
TENHO DOIS FÍ ESTUDANO,
UM QUE JÁ TÁ SE FORMANO,
DESPAZA PRÁ TODO LADO
MINHA MUIÉ É DOUTORA,
E EU SÓ VIVO LASCADO.
ELE AINDA DIXE ASSIM
TÁ VENO AQUELECARRÃO?
JÁ FAZ TRÊS MEMSES QUI EU
TÔ DEVENO A PRSTAÇÃO
CADA DIA DESAPRUMA,
TUDO QUI A GENTE ARRUMA
SÓ DÁ MERMO PRÁ COMER,
COM ISSO EU VIVO DOENTE
INTÉA CASA DA GENTE
JÁ TÔ QUERENO VENDER.
TEM CONTA NA PADARIA,
TEM MERCADO PRÁ PAGAR,
A CONTA DA ENERGIA,
A CONTA DA TELEMAR,
PRÁ VÊ SE TIRA A MALIÇA,
MANDEI REZAR UMA MISSA,
O PADRE MANDOU COBRAR.
AÍ EU DIXE DOTOR,
QUER A MINHA OPINUÃO?
ENTREGUE O CARRO DE VORTA
VENDA A CASA PRÁ UM BARÃO,
PAGUE TODAS SUAS CONTAS
VAMOS MAIS EU PRO SERTÃO!
LÁ EU TENHO UMA TERRINHA
DÁ PRÁ NÓS DOIS TRABAIÁ
TEM ACASA DO VAQUEIRO,
EU DÔ PRO SENHOR MORÁ
VAMOS CRIAR VACA, TOURO,
VENDA ESSE ANELÃO DE OURO
COMPRE LOGO UMA INCHADA
VAMOS PEGAR NO BATENTE
JURO QUI DAQUI PRÁ FRENTE
NUM VAI MAIS LHE FARTÁ NADA.
AO INVÉS DESSA AGONIA
DO POVO DA CAPITÁ,
VAMOS VIVERNO SOSSEGO
QUE TEM NAZONA RURÁ,
A CIDADE É PRÁ QUEM PODE,
VAMOS CRIAR CABRA,BODE,
PLANTAR BATATA, FEIJÃO,
LÁ VOÊ, NUM SUJA O NOME
E TUDO QUE A GENTE COME
A GENTE TIRA DO CHÃO.
LÁ PRÁ TUDO TEM UM JEITO
BASTA VOCÊ TER CORAGEM
SECA NUM TEM QUE O PREFEITO
FEZ PRÁ NÓS UMA BARRAGE!
NÓS PRANTA INTÉ NO VERÃO,
MILHO, ALFACE, PIMENTÃO,
TUDO TEM PRÁ SE COMER,
E O QUE SOBRAR DA ROÇA
NÓS BOTA NUMA CARROÇA
VEM PRÁ CIDADEVENDER.
AQUI SE VOCÊ É RICO
SÓ VIVE PREOCUPADO
COM MEDO DOS ASSALTANTES
DE UM FILHO SER SEQUESTRADO
TUDO QUE ARRUMA ESTRAGA
QUANTO MAIS GANHA MAIS PAGA,
CADA VEZ MAIS, CARESTIA,
DR. ME FALE A VERDADE
PRÁQUE MORAR NA CIDADE
E VIVER NESSA AGONIA?
LÁ TEM CÔCO MANDIOCA
LEITE PARA O REQUEIJÃO,
LÁ NÓS FAZ BÔLO, CUSCUZ,
AQUI VOCÊS COMPRAM PÃO,
PRÁ NÓS FAZER A MOMIDA,
AO INVEZ DE BOTIJÃO,
A GENTE NUM GASTA NADA
NÓS USA LENHA E CARVÃO.
LÁ DETRAS DA MINHA CASA
TEM UMA HOTA PATRÃO,
TEM BETERRABA, SENOURA,
CEBOLA, QUENTRO, AGRIÃO,
E O CAFÉ QUE A GENTE TOMA
E PIZADO NO PILÃO.
LÁ VOCÊ TEM TUDO ISSO
SEM HAVER DIFICULDADE
E AQUI TEM TANTO DOUTOR
MAS PRÁ FALAR A VERDADE
É OS MATUTO DA ROÇA
QUE ALIMENTA A CIDADE.
LÁ NA ROÇA A GENTE VEVE
SEM PREOCUPAR COM NADA
TEM DEBUIA DE FEIJÃO,
AS NOITES DE FERINHADA,
NAS NOITES DECSÃO JOÃO,
NÓS TEM CANGICA, QUENTÃO
FORRÓ AO VIVO FOGUEIRA,
TEM O MEU BRURRIM DE CARGA
E UM CAVALO MANGA LARGA
MODE NOS ANDAR PRÁ FEIRA.
LÁ NUM TEM S. P. C.
SUJANDO O NOME DA GENTE
CARTÃO DE CRÉDITO SEM CRÉDITO
NEM COBRADOR NO BATENTE
O TRABAIADÔ RURÁ,
NUM L~E REVISTA, JORNÁ
NUM TEM NOTIÇA DE GUERRA,
NUM DEVE NADA A NINGUEM
TUDO QE A GENTE TEM,
A GENTE TIRA DA TERA.
EU NUM VÔ CRIAR MEU FÍ
ALIMENTANO ESPERANÇA
AS VEZES BUTANO A MÃO
ONDE O BRAÇO NUM ARCANÇA
AS MINHA FIA MENINA
É COMO AS FLOR DE BONINA
OU UNS CASÁ DE INDURINHA
QUE DESCE DE MANHANZINHA
PRÁ BEBER NA FONTE FRIA.
A MINHA MUIÉ DR.!
É SOMPRE NUM TEM RIQUEZA,
FIA DE AGRICULTOR,
TOMEM NUM TEM METIDEZA,
CASEI COM ELA INDA VIRGE,
CARREGANO A MERMA ORIGE
DAS FRÔ DE MARACUJÁ,
OU CUMA A FRUTA SAGRADA
QUE NUNCA LEVOU BICADA
DOS BICO DO SABIÁ.
O POVO AQUI DA CIDADE
SÓ VIVE DE ILISÃO
QUER ACOMPANHAR A MODA
QUE VÊ NA TREVELISÃO,
TROCA CHEQUE PREDATADO,
FAZ RÔLO, COMPRA FIADO,
ENROLA OS OUTROS TAMBEM,
FAZ TUDO SEM CONCIÊNÇA
PRÁ MANTER AS APARENÇA
DUMA VIDA QUI NUM TEM.
FIM.
ABRIL DE 2002
Onildo Barbosa.