O canto imaginoso do passarinho avariado para a passarinha mais bonita das veredas do cerrado inté as bandas do sertão
Êta, que agora eu fiquei ariado!
Pássaro perdido, sem rumo
Sem saber onde qui pouso
Toda essa loucura sem prumo
Esse meu juízo avariado!
Vê-se que agora me sucedeu
De ler seus versinho, corado,
Me embriagando i pensando
Que era eu o teu passarinho
O sabiá que te alegra cantando
À sombra do sol avermelhado.
I nessa de ficar sonhando
Feito Quixote zuretado
Me pus como qui fantasiando
Nóis dois se enveredando
Pelas veredas do cerrado!
Empoleirando nas ingazeiras
Vendo um céu todo azulado
Alegrando os pé di goiabeira
Cum nosso canto alumiado!
***
I assim nóis foi avoando
Pelas veredas do cerrado
Matas verdes rios adentro
I o céu foi se avermelhando
Cum a queda do sol sangrado.
I a noite toda si aprumando
De lua estrelas i solidão
I nóis ali, sem fazer nada
No mei daquela iscuridão,
Via os mistério do invisível
I um gemido di assombração.
Não era o Saci-Pererê
Nem era as Caipora não,
Era um bicho mais cabuloso
Essa tá di assombração;
Talvez fosse o Zé Tinhoso,
Assombrador di passarinho,
Bicho-Ruim da iscuridão.
Foi no seio da madrugada
Foi si achegando a assombração
Cada vez vinha mais pra perto
A coisa-ruim, o cramulhão,
I nóis pequeno só rezava
Pedindo a Deus uma salvação!
I quando o medo era tamanho
De botar pra fora o coração
Eis que surge no mei do cerrado
Seu Virgulino, o Lampião
Botando pra fora cum seus homi
Mais Padim Ciço di Romão,
O bicho feio i assombroso,
Tinhoso da Iscuridão.
Num foi fácil pra Virgulino
Botar pra fora a assombração
Careceu fazer cara feia
I sacar a peixeira num puxão
I enfiá-la no bucho do Tinhoso
Gritando: “Arreda daqui Coisa do Cão!
Vá caçar teu rumo, bicho covarde
Cum passarim tu num mexe não!”
I assim sendo foi-se o Tinhoso
Iscafedendo-se no brêuzão
Foi ele sumindo e o sol brotando
Num calor di fazê torrão
I os passarim tudo aclamando
Numa grande festa, cantando:
“Salve - Deus dos Injustiçado -
Seu Virgulino Lampião,
Rei dos sertões i do cerrado,
Aquele que não tem medo di cobra
I muito menos di assombração!”.
I intão o resto foi só festa
Um tremendo São João,
Sabiá, nóis dois cantava
Xote Maracatu i Baião
I a festa si ispalhava -
Nas vereda do cerrado
Inté as banda do sertão.
Lampião ficou tão contente,
Qui ti deixô na percussão
Tu reinava no pandeiro,
E eu reinei no violão –
Foi uma festa no Cangaço,
Istourô a Revolução.
Zumbi juntou-se a festa,
Cabôco-das-Sete-Flecha,
Kamayurá i os Cristão,
Chegou-se até São Jorge
Montado no seu alazão,
Foi a festa mais bonita
Qui avistô minha visão,
Tão bunita, mar tão bunita,
Que acordei di supetão,
Daquele sonho tão bunito
Qui num tem explicação.
Foi teus versim que inspirô
O meu sufrido coração,
Coração atarantado
Si arranjando nus mundão,
Coração di passarinho
Mendigando inspiração
Vendo no teu riso alumiado,
Seu ninho, sua morada,
A mais bunita das canção.
***