O DOTÔ E O MEU CÃO PERDIGUÊRO: UMA HISTÓRIA DE CAÇADÔ

Eu vô contá pra ocêis

A história de um dotô

Qui saiu da sua cidade

E nessas terra chegô,

Pois caçá ele quiria,

Mais do ofício nada sabia,

E purisso mi procurô.

Ele ficô sabeno

Qui na arte de caçá

Aqui por essas banda

Mió qui eu num há...

Inda tem meu cumpanhêro,

O mió cão perdiguêro

Por esses lado de cá!

Totó era o seu nome...

Nome dado pelos minino

Quando chegô, inda fióte

Dismamado e piquinino.

O Totó num demorô

A mostrá o faro de caçadô,

Qui aos pôcos lhi foi surgino.

E como mió cão de caça

Muitos prêmio ele ganhô,

Recebeu medáias de honra

Pelos serviço que prestô

Ao povo dessa cidade

Qui sofreu uma barbaridade

Quando o rio transbordô...

Ao se apresentá,

O dotô já foi falano

Qui trouxe uma antiga

Espingarda de dois cano

Qui seu pai lhe deixô

Como herança do avô,

Falicido há muitos ano.

O dotô também mi disse

Qui aprendeu a atirá

Quando inda era minino,

Quando mal sabia falá...

Bom de mira ele disse sê

E qui gostaria de aprendê

A nobre arte de caçá.

E aprendê esse ofício

Era a sua maió vontade,

Pois na vida fêis de tudo

Sem ninhuma dificudade:

Jogô bola, já pescô,

Foi artista e lutadô.

Fêis inté farcudade!...

Após as apresentação,

Tudo combinado ficô:

Assim que o Sol nascesse

Eu seria seu professô...

E logo que surgiu o dia

Eu lhe disse qui queria

Testá sua mira de atiradô.

Ispaiei por todo lado

Algumas lata vazia,

Butei ele pra atirá

Só pra vê sua pontaria.

E pelo qui pude vê

Tinha ele qui aprendê

Muitas coisa em pôcos dia.

Mais ele se recusô

A suas bala desperdiçá

Naquelas lata vazia

Qui num saía do lugá...

Isquecemo intão as lata

E embreamo pela mata

Qui iscoiêmo prá caçá.

Ao vê meu cão de caça,

Ele ficô disconfiado,

Pois era só côro e osso

Meu perdiguêro afamado

Qui andava com dificudade,

E por causa da sua idade

Mal inxergava o coitado...

Da sua disconfiança

Ele logo se esqueceu

Quando bem à nossa frente

Uma jaguatirica apareceu.

Era a grande oportunidade

Di prová suas qualidade,

Di mostrá o qui aprendeu.

Mais igual uma “vara verde”

Di nervoso ele tremia

E pelo rosto assustado

O suó lhi escorria...

Apesá de tá bem perto

Do bicho era quase certo

Qui ele errasse a pontaria.

E temeno o seu erro,

Pra ele fiz um sinal

Pedino pra mi deixá

Atirá naquele animal.

Primêro eu lhe mostraria

Como se fáis a pontaria

Pra qui ela seja fatal.

E assim que surgisse

Uma ôtra oportunidade,

Ele me provaria

Sê um caçadô de verdade.

A proposta ele aceitô,

Mais ao meu lado ficô

Na maió ansiedade...

O tiro qui eu dei

No bicho foi certêro.

E sem qui eu ordenasse,

O meu cão perdiguêro

Correu na direção

Do animal que, no chão,

Dormia o sono derradêro.

Ao vê a fera indefesa,

Totó num resistiu:

Atracô o bicho por tráis

E, saliente, lhe cubriu.

E após a copulação,

Totó si deitô no chão

E ali mermo ele durmiu...

Veno aquela cena,

O meu aluno dotô

Oiô pru perdiguêro

Cum fama de caçadô

E disse sem pensá:

“Esse cão num sabe caçá,

Mais é um bom reprodutô!...”

Cum a caça na mão,

Resorvemo, intão, vortá

Pru sítio onde eu morava

Pra nóis pudê discansá,

Pois na manhã do ôtro dia

A caçada recomeçaria

Antes mermo do sol raiá...

Peguei meus apetrecho

Assim qui mi acordei

E o meu cão perdiguêro

Da colêra eu sortei.

E quando fui tumá café

O dotô já tava de pé

Com o alforje qui lhi dei.

Após o desjejum,

Fumo caçá novamente:

Eu, meu perdiguêro

E o dotozim sorridente,

Pois ele mi mostraria

Como anda sua pontaria

De caçadô, finalmente.

Pela mata pôco andamo,

Quando de repente surgiu

Um cervo saltitante

Na direção do rio...

E por sê um bicho ligêro,

O meu nobre cumpanhêro

Pra atirá mi pidiu,

Pois mais uma vêis

Ele quiria observá

Como si fáis uma pontaria

Sem pirigo de errá.

Com calma eu mirei

No bicho e atirei...

Num deu pra ele iscapá.

E novamente Totó

Correu na direção

Do cervo já morto,

Estirado ali no chão.

Ele atracó o animal

E numa tara sem igual

Deu início à copulação.

Oiando nos meu zóio,

O dotô - pobre coitado! –

Mais uma vêis ripitiu

O qui mi havia falado:

“Esse seu cão perdiguêro

É um reprodutô verdadêro,

O mió purêsses lado!...”

Prosseguimo mata adentro,

E em pôco tempo de caminhada

Incontramo à nossa frente

Uma grande onça pintada.

O dotô, assim qui a viu,

Imediatamente mi pidiu

Pra atirá naquela danada,

Pois essa seria a maió

Chance qui lhi aparecia

Pra prová qui ele tem

Uma boa pontaria.

E já qui saiu pra caçá,

Ele quiria mi mostrá

Qui chegô seu grande dia.

Ficamo, eu e Totó,

Esperano o moço atirá.

Ele mirô na fera,

Mais bem na hora agá

De dá o tiro fatal

Os nervo fêis ele passá mal

E o seu alvo errá.

Com o barúiu do tiro

A onça, intão, fugiu

E ligêra como um raio

Num pé de pau subiu.

Assustada, oiando ficô

Pra mim e pru dotô,

Qui da minha boca oviu:

“Fique calmo, seu dotô!

Nun si apoquente não!

Em tudo se dá um jeitcho,

Inté nessa situação...

No pé de pau vô subi

E vô tirá a fera dali,

Mais preste bem atenção!

A bicha é muito tinhosa,

Mais eu sô bem pió.

Eu vô jogá ela no chão,

Sem ninhum pingo de dó.

Mais se quem caí fô eu,

Por favô, pelo amor de Deus,

Mete bala no Totó!...”

Joésio Menezes
Enviado por Joésio Menezes em 17/06/2011
Código do texto: T3040216
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