Estou de volta ao passado * Autor: Damião Metamorfose.

*

Tem nordestino que encobre,

Seu passado na terrinha.

Eu conto com muito orgulho,

O que eu tinha ou não tinha.

E até sinto saudades,

Daquela humilde vidinha!

*

Futuro? Eu nem sei se eu tinha,

porque eu vivia o presente.

Tomando banho de açude

Bebendo água fria ou quente.

E só me preocupava

Com minha vida somente.

*

Fui visitar minha gente

E o lugar onde eu morava.

Só vi um monte de barro,

No lugar que a casa estava.

Cortaram até as árvores

Que eu subia e brincava...

*

Em minha mente passava,

Como se fosse uma tela.

Um filme da minha infância,

Que foi a fase mais bela.

Morando naquela casa,

Com minha vida singela.

*

Caminhei por cima dela,

Fui ao canto onde eu dormia.

Parei para contemplar

E senti a nostalgia

Dizendo: seja bem vindo

A quem já foi casa um dia!

*

No coração a sangria

Como se fosse uma faca

Enfiada no meu peito,

Deixando a matéria fraca.

As pernas ficando bambas,

A visão ficando opaca.

*

Vi um ninho de casaca

Encima do juazeiro.

Andei onde no meu tempo,

Era o curral e o chiqueiro.

Procurei, mas na achei

O canto que era o poleiro.

*

Ainda senti o cheiro

Da fumaça do fogão.

E das flores que nasciam

Nas biqueiras do oitão.

O tempo destruiu tudo,

Só tinha uns pés de pinhão...

*

Na minha imaginação,

Escutei mamãe falar.

Damião tome o seu banho...

Que é hora de almoçar.

E o dos que foram pra roça,

É você quem vai levar!

*

Fiquei num canto a olhar,

Mastiguei o meu presente.

Olhei para o meu passado

E o futuro em minha frente.

Dizendo: zele as raízes,

Elas que te fazem gente!

*

Também veio em minha mente,

O que mamãe disse um dia.

Que eu podia ter o mundo,

Dinheiro em alta quantia...

que não pagava a saudade

Da casinha que eu vivia!

*

Sentei na parte mais fria

Da sombra da cajarana.

Bem onde era a moenda

De um moedor de cana.

E a cerca que eu pulava

Coberta de getirana...

*

Ali eu vivi sem grana,

Sem inveja e ambição,

Andando quase desnudo,

Correndo de pé no chão.

Sem a maldade em meu peito,

Sem sonho e sem ilusão...

*

O velho pé de pinhão

Que eu vi ao ser plantado.

Resistiu secas e invernos,

Depois de abandonado,

Morreu deixando as sementes

e hoje está multiplicado.

*

Hoje um mourão foi fincado

No canto que era a sala.

No local que era o paiol,

Só tem entulho na vala.

E eu não encontrei o canto

Que eu guardava a minha mala.

*

Eu quase perdi a fala,

Pois também não encontrei

O torno que eu armava

A rede que me deitei.

O tempo destruiu tudo

Ou fui eu que demorei?

*

A casa que me criei

Sucumbiu no abandono.

Telhas quebradas com lodo

Pretas da cor de um carbono.

Esse é o retrato falado

Do lugar que não tem dono.

*

Ali eu fui rei sem trono

E brincava o dia inteiro.

Com meu cavalo de pau

Correndo pelo terreiro.

Ou subindo em arvoredos

inté mesmo em juazeiro!

*

Não vi mais nem o barreiro,

Só barro e cacos de telhas.

Perguntei: qual o motivo?

Já franzindo as sobrancelhas.

Disseram que era por que,

Moravam cobras e abelhas!

*

Pastavam vacas e ovelhas,

Onde foi a minha lida.

Não aceito explicações,

Por ela ser demolida.

Porque ela é uma página

Do livro da minha vida

*

Fiquei de testa franzida,

Lembrando da criançada.

Que vinham brincar comigo,

Balançando na latada.

Nem a latada escapou...

No seu lugar não tem nada!

*

Essa lembrança malvada

Invadiu a minha mente.

Meu passado foi difícil,

Bem mais que o meu presente.

Mesmo assim sinto saudade

Daquela vida inocente!

*

Tenho que seguir em frente

Com o peito magoado.

Com as imagens que vi

No lugar que fui criado.

Escrevi esse Cordel,

Estou de volta ao passado.

*

Fim.

Damião Metamorfose
Enviado por Damião Metamorfose em 24/03/2011
Código do texto: T2868569
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