Eu sou... * Autor: Damião Metamorfose.
*
Sou apenas Damião
Batista de Moura Sena.
Metamorfose por que
Sou pior do que gangrena.
Quando enfrento um cantador
Que tem anel de doutor
E canta igual uma hiena.
*
Eu sou meia idade plena,
Se é que eu vou viver cem.
Noventa, oitenta, setenta
Ou sessenta tudo bem.
Com malabarismo e sorte,
Eu dou um drible na morte
E vire um Matusalém.
*
Se eu sou assim... Que é que tem?
Não precisa ser meu fã.
Não gosto de gente falsa,
Com filosofia vã.
Sou cem por cento humildade
E a minha felicidade,
É ver feliz o meu clã.
*
Eu faço o meu amanhã
Com as atitudes de agora.
Sou homem que às vezes grita,
Fala baixo, rir e chora.
Sou amigo do amigo,
Mas pra ser falso comigo
Não quero, pode ir embora!
*
Se a fome que apavora
Como o que vem pela frente.
De carniça a carne fresca,
Passando por bicho e gente.
Nasci assim acredite,
Minha fome é sem limite
e o meu sangue é sempre quente.
*
Sou o fanatismo do “crente”
que não convence o pagão.
Fui batizado com pinga,
Açúcar gelo e limão.
A receita foi completa,
No final deu um poeta
Com a verve do Sertão!
*
Eu sou a falta de pão
E a sede de justiça.
Os erros da lei dos homens
E os desejos da noviça.
Sou coragem no medroso
Compaixão do invejoso
E a ausência da preguiça.
*
A ausência da cobiça,
A mesa farta, sem prato.
Pé que não conhece a meia,
Meia sem pé e sapato.
Sou nu quando estou vestido,
Preto e branco e colorido,
Sou moldura sem retrato.
*
Pra muitos eu sou um chato,
Só por ser organizado.
Outros me chamam de velho,
Moderno e ultrapassado.
aceito elogio e vaia,
Mas não sou da sua laia,
Prefiro ser educado.
*
Sou carro de bois, quebrado
Que ninguém quer usar mais.
Sou a cigarra que canta
No meio dos caatingais.
Sou o menino de rua,
Que adotou o sol e a lua
Como os verdadeiros pais!
*
Sou as minhas digitais
Que nem eu mesmo sei ler.
Sou um filme brasileiro
Que brasileiro não ver.
Sou cordelista aprendiz,
Completamente feliz,
Que faz Cordel sem vender.
*
Sou a medida do ter...
Ter paz, amor e carinho.
Ter um lar para morar,
Ter um leito bem quentinho.
Ter também algum dinheiro,
Ter tinta no meu tinteiro,
Ter inspiração no pinho!
*
Sou o certo em desalinho,
Nas linhas do meu destino.
Sou a mistura de raças
Que cresceu alto e franzino.
Sou calmo se estou dormido,
Verdades não estão mentindo,
Eu falo que menino!
*
Sou sol meio dia a pino,
Sem uma sombra por perto.
A sorte que não ajuda,
O errado que deu acerto.
Se precisar vou embora,
Se marcar eu perco a hora,
Se me prender, sou liberto.
*
Meu verso é um tiro certo,
No hipócrita e covarde.
Sou o sereno da noite,
Sol e chuva em fim de tarde.
Sou um bebum sem malicia
Que grita: chame a policia...
Que hoje eu vou fazer alarde!
*
Sou sertanejo que arde
no sol de seca que esquenta.
Esperando por inverno
Porque a seca atormenta.
Sem chuva molhando o chão
Pergunta ao seu coração,
Mais será outro setenta?
*
Mais ardido que pimenta,
Eu sou se estou com razão.
Mas estando errado eu sou
Humilde e peço perdão.
Peço desculpa e te abraço,
Aceito e estendo o braço,
Pra evitar confusão.
*
Eu sou o sim e o não,
O nunca e o talvez.
Sou nada e coisa nenhuma,
Zero somado por três.
Sou encapetado e santo...
Só uma coisa eu garanto,
Sou amigo e sou cortez.
*
Eu sou a bola da vez,
O final que não se evita.
Sou a copia original
Que o falsário não imita.
Filho de um simples casal
Que me deu nome e moral,
Vestindo trapos de chita.
*
Sou mais um que acredita,
Na verdade absoluta.
E creio que o amor
É conquista não disputa.
E o ódio é amor doente
Que faz mais mal pra quem sente
Pois quem ama sempre luta.
*
Eu sou a reza matuta
De uma velha benzedeira.
Que com um galho de urtiga,
Arruda ou erva cidreira...
Cura febre e mal olhado,
Tosse, gripe e bucho inchado,
Coqueluche e caganeira...
*
Eu sou a dor verdadeira,
Do retirante faminto.
Que pra suportar a fome,
Aperta a calça ou cinto.
E quando a sede atormenta,
Ele bebe água barrenta,
Escura igual vinho tinto.
*
Sou o ferreiro quase extinto,
Que nunca tem um espeto.
A crendice que promove
A fé em um amuleto.
Acho que sou apolítico,
Mas se eu fosse um político
Também dizia: eu prometo.
*
Avião obsoleto
A espera de uma pista
Para decolar um voo
Bem alto, a perder de vista.
Mas sem chances pra voar,
Aceito até me chamar
De aprendiz de artista...
*
Sou poeta e cordelista,
Que não para de criar.
Em todo estilo eu escrevo,
Se não sei vou estudar
Mas cordel é o que mais gosto,
Nele eu confio e aposto,
Que é perfeito e vai brilhar!
*
Eu sou mais um Potiguar
Que tem a veia poética.
E brinca de ser poeta
Sempre de uma forma eclética.
Canto diversificando,
Com oração e rimando,
Metrificado e com ética.
*
Fim.