O Lamento de Jeremias às Enchentes de São José
O Lamento do Jeremias às Enchentes de São José
Depois de quarenta dias
Vendo a labuta de perto
Presenciei o Jeremias
Como Cristo no deserto.
Numa grande agonia
E a miséria decerto.
A terra seca e plantada
A cada semente um pedido
Ali a família sagrada
Era o seu próprio umbigo
A terra era velada
Pelo próprio castigo.
Naquele instante os joelhos
Dobram-se pelo chão
Jeremias,mulher e filhos
Embrenhados em oração
Unidos como a carne e a unha
E nos lábios a oração.
A família sedenta de água
Murmurava contra Jeremias
- O Quê fazer com essa seca?
É castigante o calor!
E como Moisés no Horeb
Clamou a Deus com fervor.
Jeremias em lágrimas
Aos seus princípios obedece
Buscando as dádivas
A tua alma padece
Com os olhos rumo aos céus
Faz a tua nobre prece:
- Meu santin fazedô de chuva
Vem moiá meu turrão
Prantei o trigo e a uva
Pra nossa sustentação
E nem um pingo de chuva
Cai no meu rincão.
Naquele cantin de terra
Prantei tamém fêjão
Adonde tinha um brejo
Prantei arrôis e safrão
Água nem pra remédio
Quem dirá pra prantação.
Terra seca pede água
Nem uma gota o de bebê
Meus fio chora deságua:
- Pai! O que vamos fazê?
Se cuntinuá desse jeitio
Nóis vai é disaparicê.
Terra marcada e sufrida
Com fresta marcada pelo tempo
Um rio que já nossas vida
Hoje o que resta é o lamento
O sole lavano a lida
E as alma no sufrimento.
Lamento de gente carente
Que sofre com o castigo do sole
Há tempo não ouvimo
O canto do rôxinó
Que pra nóis era um hino
Ao lindo arrebó.
Inté o mensagêro vento
Que passava pra mode assoprá
Aquele lindo girassó
E a semente ispaiá
Varreu minha isperança
E tirô o meu cantá.
Sumiu pro lado do norte
Nem um biête jogô
Levô a nossa sorte
E essa angústia dexô
Desenhano a nossa morte
Que os Carcará cantô.
A criação no seco pasto
Se vê a pele e o osso
Num sei o que faço
Só me resta o disgosto
Dessa teia num disimbaraço
Me vejo no fundo do poço.
Meu bondoso santo das roça
A nossa bataia é dura
Aquela piquena paioça
Carece de fartura
Manda chuva da grossa
Que a minha terra sigura.
Um dia desse meu caçula,o Juão
À bêra da morte a dizê:
- Pai me diga cum o coração
Lá no céu tem pão pra mode eu cumê?
Diga meu véio Pai
Num pricisa iscondê.
Naquilo fartô terra
Fartô o fôlugo, fartô tudo!
Falá quem me dera!
Fiquei quase mudo
Ao vê o Juão ino imbora
Dispidino desse mundo.
Abri uma cova rasa
E fiz uma cruz de graveto
Interrei uma alma em brasa
E as nossa no espeto
Eu e a Ambrósia
Cum um grande nó no peitio.
Quero abri a portêra
Pra mode a chuva intrá
Quero vê a corredêra
No meu rio a cantá
Os meu zóio é cachuêra
De tanto eu chorá.
Aquela sabiá
Que cantava na laranjêra
Na primavera vai vortá
Pra alegrá a cumpanhêra
Seu canto vai ficá
Em nóis a vida intêra.
Quero chegá no riacho
E matá a minha sodade
Quero ficá bem de bacho
Das lágrima da filicidade
Pegá os fruto no cacho
E sinti o sabô de verdade.
Óia São José
Num é pecado pidi
Quem vos pede tem fé
Quem tem fé tá aqui
Mais ainda tô de pé
Pra mode arresisti.
Num posso tomá mais vosso tempo
O Sinhô tem outros pidido
Eu só quis nesse momento
Dizer o que nóis sente
Num dêxa esse vento
Levá os sonho da gente.
Vamo agora discansá
Na nossa simpres paioça
É feita de buriti
Mais é cheia de amô!
Aqui acordo cum a Juriti
Foi o que meu pai dexô.
Quero sonhá com as vereda
E a passarada a cantá
A roça verde cum certeza
Pra essa miséra ispantá.
Meu rio cum as corredêra
Vai me dá o de pescá.
Óia meu São José!
Se eu alevantá amanhã cedo
E o meu lençó tivé moiado
E nada disso aconticê
O sinhô pode ficá informado
Do que eu vô dizê.
Pode sabê meu poderoso
Que foi as lágrima que caiu
À nôte dos meu zóio
Sem eu apercebê
Num tem coisa mais triste
Do que vê tudo morrê.
Terra seca pede água
Nem uma gota o de bebê...
Tenho fé em vóis meu santin
Pra mode nóis num perecê
Tô aqui no meu cantin
E aqui quero vivê.
Terra seca pede água
Água eu hei de tê
O grorioso São José
Vai as minha prece atendê
Pois carrego a minha fé
A cada amanhicê.
Este é o lamento
Desse humirde Jeremia
Um grito disisperado
Antes dos fim dos dia
Fica aqui rigistrado
Meu pidido e minha agunia.
Amém!
FIM
Tinga das Gerais