AS LENDAS DO RIO SÃO FRANCISCO.(por Zé de Patrício)

Escrito por:

Honorato Ribeiro dos Santos(ZÉ DE PATRÍCIO) (Poesia de cordel).

(escritor,compositor,músico,poeta, jornalista,

historiador, professor e defensor das causas

do Rio São Francisco)

Blog: cidadecarinhanha.blogspot.com

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Quando descobriu o Brasil,

Veio o povo europeu,

Também veio o africano

Como escravo que sofreu,

Mas deixaram na história

Bastante lenda nos deu.

Às margens do Velho Chico,

Existem muitas cidades,

Todas têm as suas lendas

Que contam velhos de idade;

Eles contam e acreditam

Dizendo que são verdades.

Diz que o Rio São Francisco,

Contam os velhos do passado,

Que existe o compadre d`água,

Que pega a pessoa a nado;

Mesmo dentro da canoa

Ele atrai a pessoa, o malvado.

Dizem que ele se transforma

Em tudo que ele quiser:

Transforma numa cabaça

Pra pegar quem ele quer.

Tem dentes brancos e afiados

Come tudo que puder.

A sua cabeça é pelada,

Nariz grande de “taboca”.

As presas qual caititu;

Vive debaixo de loca,

Os pés, mãos como de pato,

Ligeiro tal como foca.

Muita gente ao Velho Chico

São pescadores no Rio

Fala com tal precisão

Que o compadre já o viu;

Há do preto e sarará

Quem o vê dá calafrio.

Esses foram os caracteres

Do bicho d`água o proteu,

No Vale do São Francisco

Muito caso aconteceu.

Agora conto outra estória

Pra quem ler e quem já leu.

A estória do lobisomem

Que aparece na escuridão

Como um cachorro muito grande

Que faz sua assombração;

Aparece às sextas-feiras

À meia noite qual leão.

Dizem que o pai de família

Que tem sete filhos homens

À meia noite o caçula

Tem que virá lobisomem

Como uma metamorfose

Qual antropófago come.

Pra acabar com o mistério

Batizará o caçula

O irmão velho é o padrinho

E o fenômeno se anula.

Não vira mais lobisomem

Quebrando toda a sua jura.

Pra se virar lobisomem

Tem que enrolar no borralho

Depois disso é transformado

Sai em busca de um “galho”.

Pra agarrar com segurança

Como lobo em seu faro.

Nas ruas, becos da cidade,

Nas noites de escuridão

Muitos não saem sozinhos

Com medo do cachorrão,

Pois existem muitas cidades

Quem não há iluminação.

Há também outras estórias

Que agora vou contar:

Da mulher que amiga a padre,

Que nas sextas vem assombrar

É a tal mula-sem-cabeça

Que à noite vem atacar.

Com a cabeça entre as pernas

Ruma coices a quem encontrar

A pessoa quando se encontra

Pra ela não lhe atacar

Tem que esconder as suas unhas

Pra que dela se livrar..

Diz que o padre rezará

Pra fazer excomunhão,

Quando vai rezar a missa,

À sexta-feira da Paixão,

A tal mulher vira mula, (Mula-sem-cabeça)

Sai fazendo assombração.

Também existe o bicho homem,

Não no rio e sim na mata.

É um super-homem gigante

Que muita gente ele ataca

Pra comer quem o encontra

É misteriosa a caça.

É mais alto que qualquer árvore,

Seu urro parece um trovão,

Só tem um olho na testa,

Dedos compridos e mãos;

O cabelo é bem corrido,

Cabeludo qual Sansão.

As pessoas que vão ao mato

De profissão o caçador

De meia légua ouve o ronco

Do bicho assombrador;

Até cachorro de caça

Murcha o cabo, o abanador.

As mulheres que pegam lenha,

Homem meleiro e lenhador,

Todos ficam apavorados,

Ao verem rastros, que horror!

Voltam todos apavorados,

Quando turra dá pavor.

Certa vez um caçador

Com seus cachorros de caça

Foi com seu amigo e compadre

Com cabaça d`água e massa

Chegando a certo lugar,

Cada um saiu com raça.

Despediram-se e partiram.

Cada um para seu lugar,

Depois de tudo combinado

Pra tal hora ali se encontrar,

Mas, quando foi a hora exata,

Faltou o colega a chegar.

Porém chega de cabo murcho

Os cachorros seus amigos,

O bicho homem já havia

Pegado o amigo e comido;

Bem na copa da barriguda

Ele avistou seu inimigo.

Com seu amigo debaixo

Do braço. Calmo a comer

Dando urros que se abalava

Toda mata a estremecer.

O caçador não morreu

Porque Deus o protegeu.

Voltou correndo qual um doido

Nunca mais ele quis caçar;

Contou o que ele tinha visto

Ninguém quis acreditar,

Mas depois, que viram os rastros,

Que o caçador foi mostrar.

Mas ficaram alarmados,

Ao virem rastro no chão,

Sinal de sangue encontraram,

Os companheiros e irmãos,

Mas não viram o tal bicho

Voltaram com armas na mão.

Contarei agora a estória

Que contam da tal serpente,

Que vive no fundo do rio

Metendo medo à muita gente.

Dizem que está criando asas,

Tem que rezar todo crente.

Se não rezar cria asas;

Arrasará sete cidades

De uma vez com seu turro

E voa com velocidade.

Todos têm que rezar o ofício

Da Virgem da Caridade.

Cada dia rezando o ofício

As penas hão de cair,

Pois é uma devoção

A Nossa Mãe a pedir

Pra serpente não criar asas

E ela não nos destruir.

Ela é moradora eterna

No porto, no paredão,

Cidades do Velho Chico,

No tal barranco, caldeirão,

Só não sai pra ninguém ver,

Porque não criou asas, não.

Havia um casal feliz,

Que morava na fazenda,

Mas, quando foi um belo dia,

Surgiu querendo merenda

Um gato muito bonito

De invejar, fazer arenga.

Disse o marido à mulher:

- O gato vamos criar,

Porque aqui nós precisamos

Há muito rato pra pegar,

Cuide dele como gente,

Quando eu hei de viajar.

Toda vez que viajava

O gato sumia de casa,

Quando o marido chegava

O gato de mansinho entrava;

Magro e fino como uma linha

De tão fraco não miava.

O marido revoltado

Disse logo pra mulher:

-No dia que for viajar

E você assim não fizer,

Cuidar bem do meu gatinho,

Eu juro, lhe mato até.

-Mas marido, toda a vez,

Que esteve daqui ausente

O gato some daqui;

Creio não gostar da gente.

Talvez não acredite em mim,

Porque você não é crente.

-Faça carinho no gato

Tal qual tenho feito sempre;

Senão a promessa eu cumpro...

Cuide bem do gato,...Lembre.

Senão eu vou ter que cumprir.

O marido viajou

E o gato foi esconder

A mulher fez o possível

Pro gato querer comer,

Mas não adiantava nada

Ele fazia se esconder.

Não comia nada que desse

Para depois emagrecer,

Pois o gato assim o queria

Ver a pobre mulher morrer,

Mas isso não aconteceu,

Porque Deus, sim, lhe valeu.

O marida foi viajando

Pousou a uma gameleira,

Onde tinha uma audiência

Dos diabos naquela beira

Como ele estava cansado

Foi deitar na sua esteira.

De sono leve em madorna

Ouvia-se voz que bradava...

-Dizia: diz o que você faz!

Era o chefão da palavra.

-Eu atentei um pra matar outro;

-Eu enlouqueci um que matava...

-Você aí, o que tem feito?

-Eu estou atentando um casal,

Transformei-me num bom gato

Num pequenino arraial;

Finjo que estou morto de fome

Para fazer meu vendaval...

O marido já prometeu

Matar assim sua mulher,

Quando ele voltar da viagem

Me encontrar com fome até

Ela não se escapará,

Pois só irei quando vier.

O marido na sua madorna

Consciente da cilada

Voltou logo pra sua casa

E preparou logo a paulada

A mulher pensando morrer

E ao marido se explicava...

Nisso o gato aproximou:

Magricela e dando fraco miau

O homem fez que não sabia...

E no gato meteu o pau

Que pipocou na mesma hora!

Fedeu enxofre do cão mau!...

Ó mulher, disse o marido,

Esse gato era o diabo,

Queria que eu lhe matasse!

Mas ele mostrou logo o rabo;

Contou-lhe o que ouviu.

Vamos viver com Deus amado.

Vocês já ouviram contar

Do vaqueiro Borges falado,

Que montava numa égua magra

Mais veloz que um jato enviado?

Fazia coisas muito estranhas

Até em onça era transformado.

Ele tinha um companheiro

Que andava sempre com ele

Todo mundo afirmava

Que era discípulo dele;

Só andavam juntos no mato,

Pois ambos eram vaqueiros.

Começou a sumir mui gado

Nas fazendas dos fazendeiros

Aonde o Borges sempre andava

Trabalhando de vaqueiro;

Ele e seu colega saíram

Para descobrir o paradeiro...

Da onça que pegava o gado.

Com três dias em seu pé;

Com fome e fracos como estavam:

-Eu vou dar jeito nisso, Zé.

Vou lhe revelar um segredo,

Precisa ter coragem e fé...

Vou-me transformar em onça

Vou pegar boi pra comer;

Você fica com essa folha

Nada vai lhe acontecer.

Quando eu matar o boi eu venho

Pra bem perto de você.

Coloque a folha em minha boca

Eu viro gente de novo.

Nós vamos comer a carne,

Depois contamos ao povo,

Ninguém vai saber quem foi

E você entra no gozo.

Borges transformou em onça

Agarrou o boi e o sangrou;

Veio correndo para o Zé

Que, quando o viu, apavorou!...

Correu, sumiu louco de medo!

E a todo povo ele contou.

Borges não pode virar gente;

Ficou no mato e se escondeu;

Mas o povo bem armado

Saiu e a caça aconteceu.

Meteram bala e o mataram

A onça suspirou e gemeu.

Diz o povo que assistiu

Que o gemido foi de gente;

Quando olhou pro companheiro

Disse: Você foi descrente!...

O mistério da onça Borges

Até hoje o povo é crente.

No Vale do São Francisco

Há muitas lendas desse tipo.

Muita gente conta e crer;

Outros dizem que são mitos,

Mistérios são revelados

À outros que lenda é rito.

Mas daqui a duzentos anos,

Quando a ciência progredir

Vai explicar tudo o que é certo,

Quando vier a descobrir.

Os fenômenos existentes,

Que aparecem, vão surgir.

Nossa mente é capaz

De criar imagem vista,

Que muitos dizem: Fantasma!...

Coloca até em revista.

Homens que fazem prodígios

Pela força da mente arrisca...!

***

Carinhanha Ba

11-08-79.

hagaribeiro@yahoo.com.br