A MORTE DO CANGACEIRO ZÉ BAIANO
Já falei de Zé Baiano
Em outro cordel passado
Suas atitudes pregressas
Deixei tudo registrado
Sua vida na Bahia
E em Sergipe onde vivia
No interior do Estado.
Pedreiro conceituado
Exercendo a profissão
Mas não se sabe porque
Deixou a sua função
Talvez por alguma intriga
Uma investida inimiga
Se embrenhou no sertão.
Acusado sem razão
Na prisão era espancado
Quando tinha liberdade
Zé ficava revoltado
Sem ter outra solução
Ao bando de Lampião
Com pouco era integrado.
Corpanzil avantajado
Pernas tortas alongadas
Era uma estranha figura
Cabeleira avantajada
Tinha a pele bem escura
Enorme musculatura
Pés chatos e mãos palmadas.
Tinha as faces encovadas
O nariz arredondado
O corpo todo peludo
Queixo comprido achatado
A dentadura achatada
A boca grande rasgada
O olhar sempre espantado.
Um dos mais endiabrados
Do bando de Lampião
Tanto que o chefe feroz
Lhe tinha admiração
E para incentivà-lo
Chegou a condecorá-lo
Com honras de valentão.
Muitas vidas no sertão
Zé Baiano liquidou
Tinha prazer de sangrar
A isso se acostumou
Sangrava despreocupado
Com um punhal afiado
Que Lampião lhe ofertou.
Depois um trio formou
Com um tal de Demudado
E o bandido Chico Peste
Que estava sempre ao seu lado
E a onda de traições
Tomou novas dimensões
Com esse bando formado.
Num pequeno povoado
Chamado de Alagadiço
Ele montou seu quartel
Mas sem parar seu serviço
Provocando muitas dores
Pois a muitos moradores
Zé Baiano deu sumiço.
Era grande o reboliço
Naquela localidade
Conseguiu vários coiteiros
Pra suas necessidades
Se algum se rebelasse
E as ordens não acatasse
Morria sem piedade.
Muitos senhores de idade
Se envolveram no cangaço
Passando então a ser cúmplices
Metidos no embaraço
Tinham que lhe informar tudo
E permanecerem mudos
Para não cair no aço.
Se um desse um passo em falso
Perdia o viver de paz
Ele o pegava e sangrava
Com o seu gênio voraz
Ainda matava os herdeiros
E dizia aos companheiros:
- Esses não me traem mais.
Com seu instinto voraz
E frieza de um ferino
Um dia encontrou alguém
Que lhe mudasse o destino
Com coragem, inteligência
Habilidade e prudência
Levou Zé ao desatino.
Senhor Antônio Aurelino
Guimarães, bem conhecido
Comerciante local
De todos ali querido
No comércio um soberano,
Pelo monstro Zé Baiano
Foi bastante perseguido.
No lugar Campo Comprido
Antônio era morador
No seu pequeno comércio
Era distribuidor
De bebida e alimento
Munição e outros proventos
Por aquele interior.
Zé Baiano o obrigou
A lhe dar informação
Mostrar quem tinha dinheiro
Lá naquela região
E entre outros displantes
Sobre as forças das volantes
Lhe dar toda direção.
O pacato cidadão
Em um dilema vivia
Se não mostrasse o bandido
A polícia o mataria
Completando o insucesso,
Se entregasse o perverso
Do mesmo jeito morria.
A polícia certo dia
Desconfiou do vendeiro
Quando menos esperava
O fizeram prisioneiro
Ele foi acorrentado
Para Carira levado
De um modo muito grosseiro.
Chegando no cativeiro
Ele foi interrogado
Para não morrer no pau
Antônio foi obrigado
Debaixo de atrocidades
A contar toda verdade
Ou seria executado.
Antônio foi libertado
Pela polícia local
Porém perdeu o sossego
E a confiança total
Não somente do bandido
Pois era sempre seguido
Por algum policial.
De Zé baiano afinal
Perdeu toda confiança
O bandido olhava ele
Sempre com desconfiança
Sabendo que foi traido
Já tinha um plano urdido
Só pensando na vingança.
Antônio na vizinhança
Fez uma reunião
Com mais cinco fazendeiros
Porque tinham precisão
De darem cabo dos três
E acabarem de vez
Aquela situação.
Do pensamento à ação
Procuraram o cangaceiro
Todos fortemente armados
Fingindo levar dinheiro
Mas o grupo de bandido
Já estava fortalecido
De mais outro bandoleiro.
Baiano muito matreiro
Já ficou desconfiado
Não respondeu ao bom dia
Preferiu ficar calado
Os cinco homens cubando
Fazendo sinal pra o bando
Que estavam do seu lado.
O grupo determinado
Com o plano no sentido
Não quiseram mais conversa
E pularam nos bandidos
Pois não iam recuar
Era lutar e esperar
O que Deus fosse servido.
O bando desprevenido
Nenhum conseguiu se armar
Assim era corpo a corpo
Que teriam que lutar
Em um combate de morte
Só venceria o mais forte
Ou quem soubesse brigar.
Quando um bandido a tentar
Pegava no seu punhal
Levava um grande trompaço
Dado com força total
E uma pernada no lombo
Que o cabra saía aos tombos
Fazendo o pelo sinal.
E assim a força do mal
Ficou fraca nesse dia
Um a um os cangaceiros
Caiam na terra fria
Facão nos ares voando
Carne humana se espalhando
Sangue pelo chão corria.
Zé Baiano resistia
Mas Antônio o dominou
Botou-lhe o pé no pescoço
O Cangaceiro afrouxou
Abandonado da sorte
Vendo que chegava a morte
Chorando ainda implorou:
- Não me matem, por favor!
Não sejam tão desumanos!
Mas Antônio decidiu
Executar o seu plano
Livrando sua região
E quase todo sertão
Das garras desse tirano.
Foi assim que Zé Baiano
Que implantou a lei da morte
Roubou, matou, assaltou,
Mostrando ser muito forte
Com seu gênio de serpente
No fim herdou de presente
O golpe fatal da sorte.
Cangaceiros, Vol. XXXIII